Era mais uma menina entre sete filhos de uma família em que faltavam recursos e sobrava a esperança de uma vida melhor. Deu certo. Ana Fontes, 54 anos, é hoje empresária, publicitária — e um exemplo de vida. Criou o Instituto Rede Mulher Empreendedora (RME), por meio do qual dá voz ao ativismo feminino e negro no mercado de trabalho. Aprendeu que colorir a própria rotina é a melhor forma de transformar o mundo.

Da margem do Rio São Francisco, no sertão de Alagoas, ela partiu com os pais e sete irmãos rumo à sonhada cidade grande. A seca extrema do ano de 1970 levou a família a Diadema (SP) com a crença de que ali não faltaria comida nem conforto. “Minha mãe, forte e, muitas vezes, dura, dizia que tínhamos de estudar e não depender dos outros”, afirmou à DINHEIRO. Levando à risca os mandamentos de sua mãe, ela conciliou os estudos e o trabalho, iniciado aos 10 anos de idade. Não por sorte, aos 25 se formava no ensino superior.

“Diversidade é igual a justiça social, que é igual a economia, que é igual a inovação. Falar de inclusão é falar de economia”

Até aí, mesmo em circunstâncias adversas, ela seguia o caminho das pedras na direção de seu ideal de sucesso profissional. Contratada pela multinacional Autolatina (a extinta joint-venture formada anos 1990 pelas montadoras Ford e Volkswagen), galgava posições mais altas. E foi nesse lugar que enfrentou seus maiores desafios. “Tinha que provar o tempo todo que eu era boa, o que me trazia muito esgotamento emocional.” Para crescer num ambiente hostil, Ana foi se adaptando e criando uma personagem que poderia se enquadrar naquele modelo de empresa. “Numa companhia alemã e americana, de ambiente masculino e branco, fui me moldando. Vivi processos discriminatórios, situações que, hoje, se caracterizariam como assédio moral e sexual.” A gota d’água se deu em 2007, após 18 anos de empresa, quando já era executiva e ocupava um cargo gerencial. Cansada daquele clima, Ana pediu demissão e desconstruiu a persona que vinha interpretando. “Foi um processo duro de autoconhecimento. Quando percebi como aquela trilha estava me corroendo, comecei a desmontar a personagem. Doei roupas e sapatos, assumi o meu cabelo enrolado.”

NOVA ERA Já casada e com duas filhas, estruturando a sua nova vida, ela entrou de cabeça no mundo do empreendedorismo. Com mais dois sócios, abriu uma plataforma de recomendações positivas, a Elogie Aqui. O grande despertar para a causa social das mulheres aconteceu nessa fase, quando foi selecionadapara o curso 10.000 Mulheres, da Fundação Getulio Vargas (FGV). Eram apenas 35 vagas e 1 mil candidatas. “Fiquei muito feliz por ter passado. Mas, ao mesmo tempo, incomodada com as 965 que não foram escolhidas.” Foi dessa inquietação que nasceu a Rede Mulher Empreendedora, instituição que auxiliou mais de 1 milhão de mulheres e deve dobrar a cifra em cinco anos.

Em 2020, quando a economia conheceu a maior recessão de sua história e a taxa de desemprego oficial ultrapassou 14%, segundo o IBGE, o trabalho de Ana Fontes se mostrou ainda mais essencial. Um empenho que desperta respeito e admiração pelos principais nomes desse movimento. Segundo Jandaraci Araújo, ex-subsecretária de Empreendedorismo de São Paulo e ex-presidente do Banco do Povo paulista, o trabalho de Ana é digno de profunda admiração em função de seu caráter transformador. “Trata-se de uma mulher inspiradora, que tenho a honra de estar ao lado em vários projetos.”

Para Alcione Albanesi, fundadora do FLC Lâmpadas e presidente da ONG Amigos do Bem, o papel de Ana se faz ainda mais relevante agora.“Ela tem transformado a vida de milhares de mulheres com amor e competência, colaborando com a transformação social do nosso País”, disse. Nesse sentido, Ana Fontes ressalta que embora a conscientização sobre a importância da igualdade ainda engatinhe no Brasil, o mundo tem mudado. “Diversidade é igual a justiça social, que é igual a economia, que é igual a inovação. Falar de inclusão é falar de economia.” Com cores e empatia,ela vive a máxima de que precisamos ser a transformação que queremos ver no mundo.

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