Desde os tempos dos gregos, quando os livros eram escritos em pele animal, o mercado editorial não deparava com tamanha agitação. No epicentro desta revolução está o e-book ou livro virtual, um computador portátil de leitura que tomou conta do mundo, ameaçando o reinado do papel e tinta. Na indústria de tecnologia, ele é sinônimo de lucros ? está entre as novidades mais vendidas do ano. Para editoras, um aliado na tentativa de aumentar o faturamento. E para os leitores significa economia de tempo e dinheiro. O e-book parece livro, tem formato de livro, mas não é livro. Trata-se de um leitor digital que armazena até 4 mil páginas, algo em torno de 10 obras, em sua memória. Uma vez terminada a leitura das obras completas de William Shakespeare, basta devolver o arquivo (para uma biblioteca no computador) e comprar, pela Internet, o último livro de Paulo Coelho. Baixar um livro inteiro da rede não costuma durar mais de cinco minutos.

O furacão digital já criou no Brasil uma rede de pequenas editoras on line. A iEditora foi pioneira. Lançada no mês passado, ela edita, distribui e vende livros digitalizados via Internet. São 1.400 títulos de 30 editoras, entre elas Nobel e Melhoramentos. Em poucas semanas, vendeu 1,2 mil livros. A estratégia da iEditora é preparar o mercado nacional para a explosão do e-book. Como num balão de ensaio, começou vendendo livros em formato PDF, um programa de leitura disponível em qualquer computador. O internauta pode baixar os livros e ler no computador ou em equipamentos como o Palm Pilot. ?Em poucos meses, nossa tecnologia será convertida para atender todas as marcas de e-books?, lembra o criador do site, Victor Kupfer. ?Livro não é formato, é conteúdo.? Nos Estados Unidos, o e-book virou febre. Lançado em julho de 1998, e custando entre US$ 200 e US$ 600, o aparelho vende muito. Por aqui, quem tem comprou em viagens ou em lojas virtuais. Os principais fabricantes, NuvoMedia e SoftPress, não divulgam números, mas se dizem ?surpresos com as vendas?. Eufemismo para dizer que, sim, venderam acima da expectativa.

Se o sucesso dos aparelhos ainda não tem números, pode-se ter uma idéia do tamanho do mercado que o circunda: o das e-editoras que fornecem conteúdo digital. Só as americanas jogarão na Internet, este ano, 150 mil novos títulos ? batendo os lançamentos em papel. Hoje, o mercado editorial é o maior interessado em popularizar o e-book. Grandes editoras como Penguin, RandomHouse, Simon & Schuster e HarperCollins, descobriram um novo, e barato, canal de distribuição de literatura. Basta transformar palavras impressas em pixels (a linguagem digital). Para o mercado editorial brasileiro, cujo faturamento despencou 21% em 99, não poderia existir notícia melhor. Levantamento da Câmara Brasileira de Livros mostra que as vendas caíram de R$ 369 milhões para R$ 295 milhões. O diagnóstico? ?O livro concorre com a Internet, uma forma de informação a custos mais baixos?, afirma o relatório. Só por aqui, acreditam alguns editores, o livro digital poderá alavancar em 30% o faturamento da indústria. ?Se esta for a evolução do livro, seguiremos a tendência?, pondera Pedro Herz, da Editora e Livraria Cultura.

Parte do sucesso do e-book são os custos envolvidos. Bem menores, é claro. Tome-se como exemplo um editor tradicional. Para lançar 3 mil exemplares gasta-se R$ 10 mil. No sistema eletrônico, cada livro é digitalizado uma única vez, ao custo de R$ 100. E acabaram-se os gastos! Se ele vender dez livros ou 10 mil livros, seus custos físicos são iguais. ?Na edição tradicional, tenho de vender 50% do total apenas para cobrir meus gastos?, compara Sergio Benclowicz, diretor de marketing da Nobel, a terceira maior editora brasileira, com faturamento anual de R$ 40 milhões. Rompendo a tradição familiar, de 58 anos de mercado, a Nobel começa a vender literatura digital nos sites de editoras virtuais. ?Meus custos vão cair muito?, diz Breno Lerner, diretor-geral da Editora Melhoramentos, que também apostou no segmento. ?Não é competição. É um novo canal de distribuição.? Apesar disso, ninguém é louco de dizer que os e-books substituirão o livro de verdade. As telas dos equipamentos ainda não têm boa definição. Falta cor e há problemas gravíssimos de bateria ? o livro ?funciona? entre 4 e 9 horas por dia. Imagine-se a cinco páginas do final do último thriller de P.D. James e sem bateria para seguir a leitura… E há o principal dos problemas: alterar o hábito ancestral da leitura em papel. ?Existe uma ligação emocional entre o leitor e os livros físicos que não vai acabar tão cedo?, lembra Luiz Schwarz, da Companhia das Letras. É uma mudança que certamente não pegará entre os mais velhos. Mas as crianças de hoje poderão crescer com um único livro ? e ainda ter uma biblioteca maior que a de seus avós.