Acrônimo em inglês para Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática, o termo STEM cobre todo o universo de onde nasce quase tudo que entendemos como disruptivo, transformador e gerador de riqueza em larga escala. Plantar soja dá dinheiro? Sim. Com bom maquinário dá mais. Simples assim. Para aqueles que são de outras áreas de formação, como eu, ou os economistas, não há ofensa nessa distinção. A questão não é o que cada um de nós faz, mas o que a classe política faz com cada um de nós. Quer um exemplo? Jair Bolsonaro disse há duas semanas que se a economia do país caiu 4% no ano passado e deve avançar 5% agora, “isso significa que cresceremos 9%, um milagre, uma coisa inacreditável”. Inacreditável é a formação que ele teve nas escolas militares por onde passou — e o que fez com ela depois disso. Milagre é seu nascimento. E nem sou eu quem diz isso, porque aparentemente vem daí o Messias de seu nome.

O modelo matemático bolsonariano, apesar de ter multiplicado sua riqueza familiar, ainda não tem comprovação de uso legal e legítimo no mundo real. Por isso a necessidade de usar dados. Números. Fatos. Ciência. E falar do tal PIB de 5%. Numa compilação feita pelo Visual Capitalist com base em informações do FMI é possível construir leituras suficientes para colocar a discussão em bases civilizadas. Antes, vale a ressalva de Darrell Huff (1913-2001), autor do imperdível How to Lie with Statistics (Como Mentir com Estatísticas): “Não seja um romancista. Seja um estatístico. Há muito mais espaço para a criatividade”.

Recado de Huff assimilado, o FMI estima que o PIB per capita nominal este ano vai variar entre US$ 125.923 de Luxemburgo e US$ 267 de Burundi. Só por aí já dá para sacar que algo anda muito errado. Um cara de Luxemburgo precisa de um ano para ter o que um cara de Burundi levaria 471 anos. OK, PIB per capita não significa grana na conta corrente, mas ainda assim falamos de quase meio milênio de um lado e 12 meses do outro. Próximo exemplo: apenas a fortuna de US$ 198,4 bilhões de Bernard Arnault & Família (o cara mais rico do mundo até as 13h da quarta-feira, 4) transformaria o PIB per capita do país africano em US$ 17.252,17. Inacreditável é isso. Milagre é isso. A fortuna do francês dono do grupo LVMH faria a renda média por cabeça dos 11,5 milhões de habitantes de Burundi (mais que Portugal) multiplicar por 64 vezes. Para quem pensa a política e a economia isso é ponto de alerta.

Entre os dez países de maior PIB per capita, nenhum está no hemisfério sul. Entre os dez menores, apenas um não é africano – o Afeganistão. No Brasil, sob a dupla esteticamente sofrível Paulo & Jair, somos medíocres. Na América do Sul, com US$ 6,7 mil, perdemos de Uruguai (US$ 16,3 mil), Chile (US$ 14,2 mil) e Argentina (US$ 9,1 mil). Na América Central, ficamos atrás de Costa Rica, México, Panamá e República Dominicana. Pelo mundo, apanhamos geral. De Turquia, Irã , Casaquistão… De China e Rússia não ficamos nem perto. Estamos ali pela posição número 90.

Nem vamos falar aqui de estressamentos internos. PIB de Distrito Federal, São Paulo e Rio de Janeiro à frente e os estados do Nordeste no fim da fila. Parte relevante da resposta está no nosso Estado Mórbido e na elite do funcionalismo público. Para ficar nos que são eleitos, de acordo com o site da Câmara, cada deputado federal tem R$ 111.675,59 por mês para salários de até 25 assessores. Média de R$ 4.467. Coisa de US$ 10,3 mil por ano (fora férias e 13º). Em outras palavras, 55% acima do PIB per capita do brasileiro comum. Se não houver rachadinhas, claro.

Quando a gente começa a conversar com números a probabilidade é de que cresça o nojo pra cima de parte de nossa elite do funcionalismo público. De todos os matizes. Políticos, mas também desembargadores partidários, juízes suspeitos, procuradores atrofiados, militares discursando sobre a pátria no público e embolsando no privado… Num país assim, ajudaria muito, além de buscar dados, sanar outra anomalia: ser o único lugar do planeta em que a direita e a esquerda defendem um Estado maior e irresponsável. Ainda mais a esquerda, que transformou “liberalismo” num palavrão, numa relação de Alho & Vampiro. Nada mais tolo. Porque nossa direita adotou o liberalismo como mantra, coloca em prática o Estado mais inchado possível, e ainda culpa a esquerda.

Olhar todos esses números pode ser reduzido a uma conjectura: “Por que cresceremos 5% e continuaremos pobres e desempregados?” Afinal, há 15 milhões de pessoas atrás de trabalho, se lixando para essa numeralha toda. A resposta novamente parece estar em Darrell Huff. “Uma diferença é uma diferença apenas se fizer diferença.” Não tem sido nosso caso. Aqui, -4 +5 = 9.

Edson Rossi é redator-chefe da DINHEIRO.