Da segunda-feira 23 à sexta-feira 27, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, viveu uma maratona de eventos e viagens poucas vezes vista desde que assumiu o cargo, em maio do ano passado. Na noite da segunda-feira, esteve num jantar com políticos e empresários no tradicional restaurante Piantella, a poucos metros da sede do Banco Central. Na manhã seguinte, foi à capital paulista para participar de três eventos com associações e empresários estrangeiros.

Retornou a Brasília, na quarta-feira, para proferir uma palestra em fórum organizado por entidade do varejo e, no dia seguinte, embarcou novamente a São Paulo, onde falou para uma plateia de executivos de empresas alemãs. Na sexta-feira, ainda participaria do 12º Encontro de Lideranças Empresariais, no Espírito Santo. Na semana em que o presidente Michel Temer conseguiu apoio para barrar, na Câmara dos Deputados, a 2ª denúncia da Procuradoria Geral de República, o ministro Meirelles não mediu esforços para defender publicamente a imediata tramitação da agenda econômica, que tem como prioridade a Reforma da Previdência Social.

As palestras do ministro da Fazenda são compactas, com duração de 30 a 40 minutos. Os primeiros slides sempre destacam indicadores que comprovam a recuperação econômica. Por um lado, juros, inflação e desemprego em baixa. Por outro, confiança, consumo e crédito em alta. Na sequência, Meirelles explica que a retomada é fruto de uma série de ajustes já feitos, como a aprovação da Reforma Trabalhista e da Proposta de Emenda à Constituição que limita o orçamento federal, conhecida como PEC dos Gastos Públicos. Na lista de reformas estruturais, no entanto, ainda faltam dois temas tão importantes quando polêmicos: as reformas da Previdência e a tributária. “Agora é a hora da Previdência”, afirmou o ministro, na terça-feira 24, aos associados da Câmara de Comércio França-Brasil (CCFB), em São Paulo. “Reconheço que é um debate difícil, complicado.”

Dois dias depois, em evento da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha (AHK), Meirelles fez questão de enfatizar um slide que trata da importância da reforma da Previdência para o cumprimento da regra do teto dos gastos, que prevê reajuste real zero (apenas a inflação) no orçamento anual, ao longo dos próximos 10 anos. Em 2017, quase 55% de todos os gastos federais já foram relacionados ao pagamento de aposentadorias e de benefícios previdenciários. Sem a reforma, essa fatia chegará a quase 80% em 2026, restando apenas 20% para todas as demais despesas, como saúde e educação (atualmente, esses gastos representam 45% do orçamento). “Praticamente o governo vai existir para pagar previdência”, afirmou o ministro. “Evidentemente que isso torna o País inadministrável.”

Aliado?: o Presidente Temer, entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (à esq.) e o Ministro Eliseu Padilha., participa de evento em Brasília. Embora seja favorável à reforma da previdência, Maia não demonstra estar empenhado na sua aprovação (Crédito:Beto Barata/PR)

A reação positiva dos empresários vai muito além dos aplausos protocolares. Cientes de que a sustentabilidade da recuperação econômica depende diretamente do equilíbrio fiscal, os representantes do setor produtivo passaram a elogiar publicamente a agenda do governo Michel Temer. “Continuamos defendendo a aprovação das reformas estruturais”, Luiz Carlos de Moraes, executivo da Mercedes-Benz e vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). “A direção da equipe econômica está boa.” Quando o assunto é a crise política, os empresários lamentam as turbulências em Brasília, mas, comemoram a permanência de Temer até o fim de 2018. “Acabando com as flechadas [contra Temer], tudo melhora”, diz Romeu Chap Chap, que atua há décadas no setor imobiliário. O empresário se refere ao ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que usou o termo “flecha” para descrever as denúncias que faria contra o presidente da República.

Na manhã da quarta-feira 25, Temer sentiu dores e foi submetido a um procedimento de desobstrução urológica, no hospital do Exército. Na saída, pouco depois das 20h, fez um sinal positivo e disse estar “inteiro”. Naquela mesma noite, o peemedebista acompanhou do Palácio do Jaburu a votação da Câmara dos Deputados, que barrou a 2ª denúncia da PGR contra ele, por 251 votos favoráveis. Embora o placar tenha sido inferior aos 263 votos na 1ª denúncia, Temer comemorou com sua equipe política, que já deu prosseguimento às conversas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerado peça fundamental na elaboração da agenda de projetos no Congresso Nacional. “O Brasil não parou”, afirmou Temer, na quinta-feira 26. “Foram precisamente nesses cinco meses [entre a divulgação das gravações da JBS, em 17 de maio, e a 2ª votação na Câmara] que a inflação caiu a níveis suportáveis, que os juros caíram de igual maneira. Foi precisamente nesse período que o desemprego começou a cair.”

Aliados!: a base governista conseguiu barrar, na Câmara dos Deputados, a 2ª denúncia da procuradoria geral da República contra o presidente Temer (Crédito:Lula Marques/AGPT)

No dia seguinte, o ministro Meirelles e o ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira, se reuniram com Maia na sua residência oficial. “Eu sou o maior defensor da Reforma da Previdência”, afirmou Maia, na quinta-feira 26. “Mas temos uma base hoje muito sofrida. Tem de se reorganizar a base. Não adianta ficar falando mal daqueles deputados de partidos da base que votaram contra.” Enquanto o governo tenta reaglutinar a sua base parlamentar, as empresas tocam seus projetos num processo de “descolamento” da economia em relação à política. “As pessoas começaram a entender que o País não pode ficar esperando os políticos decidirem tudo”, diz Gilberto Peralta, presidente da GE Capital para a América Latina. “A economia dá sinais de avançar a despeito da situação política, que não melhorou.” A multinacional americana, segundo Peralta, não alterou seus investimentos no Brasil nem mesmo durante o auge da recessão (leia entrevista “As reformas estão no caminho correto” abaixo). As perspectivas para o ano que vem estão melhorando, apesar das incertezas eleitorais. “O Brasil vai crescer 3% em 2018”, diz Sandrine Ferdane, presidente do BNP Paribas (leia entrevista “O Brasil vai crescer 3% em 2018” abaixo).

Para o setor privado, o governo Temer ainda pode colher frutos que vão além das reformas. “Os pontos mais críticos do Brasil são a infraestrutura e o sistema tributário”, diz Wolfram Anders, vice-presidente da Bosch para a América Latina. O executivo, que também preside a AHK, faz um comparativo entre as operações da Bosch na Espanha e no Brasil, que têm faturamento parecido. “Na filial espanhola, há apenas um especialista em tributação. No Brasil, são 35 pessoas”, diz Anders. “Isso é o custo Brasil.” Esses temas fazem parte da agenda do ministro Meirelles, que aposta na simplificação tributária para melhorar o ambiente de negócios no País. Quanto à infraestrutura, os recentes leilões de petróleo e de energia foram bem sucedidos. Na sexta-feira 27, uma liminar atrasou, mas não impediu os leilões da 2ª e da 3ª rodadas do Pré-Sal. Gigantes como Shell, Total, Petrobras, Repsol, Statoil, Petrogal, ExxonMobil, BP e CNOOC arremataram blocos, oferecendo percentuais de óleo maiores do que o mínimo estabelecido nos editais.


“As reformas estão no caminho correto”

O presidente da GE Capital para a América Latina, Gilberto Peralta, aposta nas mudanças das regras da Previdência Social

A agenda econômica vai avançar?
As reformas estão no caminho correto. Esse processo poderia ser mais rápido, mas entendemos como funciona o País. Estamos aqui há 90 anos.

A reforma da Previdência será aprovada?
Será. Acho que os políticos já entenderam isso.

Há um descolamento da economia em relação à política?
Sim. As pessoas começaram a entender que o País não pode ficar esperando os políticos decidirem tudo. A economia dá sinais de avançar a despeito da situação política, que não melhorou.

A GE manteve os investimentos no Brasil?
O que nós tínhamos previstos há cinco anos está sendo executado, mas não estamos prevendo novos investimentos. Vamos inaugurar daqui um ano a nossa maior operação de turbinas, em Petrópolis (RJ).

Os juros baixos vão impulsionar a economia?
Sim, pois melhoram o ambiente de investimentos no País. A inflação baixa é uma surpresa agradável e há espaço para os juros caírem ainda mais.

Olhando mais à frente, em 2019, a eleição será fundamental?
Sem dúvida. Uma surpresa desagradável, com algum candidato radical, será um problema. Por outro lado, se for uma surpresa agradável, nós teremos um boom de investimentos.


“O Brasil vai crescer 3% em 2018”

A presidente do BNP Paribas, Sandrine Ferdane, diz que os juros baixos aumentam os investimentos

Qual parte da agenda econômica ainda pode avançar?
O tempo é curto, mas o importante é sentir que estamos caminhando para uma segunda rodada de reformas.

Dá tempo de aprovar a reforma da Previdência Social?
A cada semana que passa fica mais difícil. Para o nosso negócio, o mais importante é uma visão positiva de longo prazo.

O resultado da eleição será determinante para o desempenho econômico a partir de 2019 ou a economia está se descolando da política?
Eu não tenho essa visão de descolamento. Acredito no papel político, ainda mais num país como o Brasil com tantas coisas a serem feitas na área social. A solução não é aposta no descolamento entre a economia e a política. Temos de torcer por um caminho político que apoie as reformas.

Os juros ficarão baixos por muito tempo?
Sim, é a nossa visão. É um fator de competitividade para a economia e de desalavancagem das empresas. O custo de crédito menor e a inflação mais baixa criam melhores resultados para as companhias e aumentam o apetite para investir.

A economia pode crescer mais num ano eleitoral?
Sim, o Brasil vai crescer 3% em 2018.