Veículos aéreos não tripulados podem espionar e bombardear alvos inimigos sem qualquer risco direto para os combatentes. Ucrânia investe pesado neles para defender-se da invasão russa. Mas drones trazem desafios éticos.

Os Estados Unidos desenvolveram um novo tipo de drone que corresponde às exigências das Forças Armadas da Ucrânia e que será otimizado para se adequar ainda mais. “Em conversas com os ucranianos sobre suas necessidades, nossa opinião foi que esse sistema especial seria muito apropriado, sobretudo para o leste do país”, informou o porta-voz do Pentágono John Kirby.

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O desenvolvimento da Phoenix Ghost já começara antes da guerra russa na Ucrânia, a intenção agora é impulsioná-lo para que se adapte ainda melhor à situação real. Mais de 120 unidades serão fornecidas no âmbito de um novo pacote de ajuda militar de Washington de 800 milhões de dólares.

Segundo Kirby, a operação dos veículos aéreos não tripulados exigirá treinamento mínimo. Eles foram desenvolvidos pela empresa americana de armamentos Aevex Aerospace, em cooperação com a Força Aérea do país.

Poder dos drones suicidas

Ainda não se sabe muito sobre as especificações da Phoenix Ghost, nem há imagens dela. Sabe-se, porém, que se assemelha às drones Switchblade da AeroVironment, empregadas por unidades especiais americanas no Afeganistão a partir de 2012. Estas são bem conhecidas: pequenas o suficiente para caber numa mochila, pertencem à categoria de loitering munition (munição vagante).

Também denominadas “drones kamikazes” ou “drones suicidas”, por se destruírem ao atingir o alvo, trata-se de armas de controle remoto. Inicialmente lançadas sem destino específico, sobrevoam durante um bom tempo a área em questão (“vagam”), até o operador em terra definir o alvo e atacá-lo com elas. Certos modelos possuem ainda sensores para detectar, classificar e atingir o objeto inimigo de modo autônomo.

“É uma combinação de míssil e drone, explica Arthur Holland Michel, autor e membro associado do Conselho de Ética em Assuntos Internacionais, sediado em Barcelona. A categoria, também denominada loitering weapon, é relativamente nova, só ficando conhecida na guerra de Nagorno-Karabakh, no Cáucaso, em 2020, quando o Azerbaijão a mobilizou em grande quantidade.

Há diversas variantes de drones Switchblade (“canivete” em inglês): o modelo menor, pesando 2,5 quilos, tem alcance de dez quilômetros e autonomia para 15 minutos no ar. O maior pesa 15 quilos, alcança 40 quilômetros e pode pairar durante 40 minutos.

Michel aponta suas vantagens: diferente das drones maiores, não é necessário pista de voo nem infraestrutura para lançá-las. “E, ao contrário de um míssil, tem-se tempo para identificar o alvo, formar uma ideia da situação e então disparar o projétil da drone de modo literalmente manual ou através de detecção de alvo. Desse modo, combinam-se as funcionalidades de ambos os sistemas de armas.”

As drones destinadas à Ucrânia têm especificações um tanto diferentes, como explicou Kirby. O tenente-general reformado David Deptula, decano do Instituto Mitchell de Estados Aeroespaciais e membro da presidência da companhia Aevex Aerospace, forneceu mais algumas informações ao portal Politico, embora até o momento não confirmadas.

Segundo ele, a Phoenix Ghost também seria uma drone descartável, mas com uma autonomia consideravelmente maior, de seis horas. Além disso, seu lançamento vertical economiza espaço, e sensores infravermelhos permitem operações noturnas. A arma seria eficaz contra “alvos terrestres blindados de médio porte”, afirmou Deptula.

Frota internacional de drones da Ucrânia

Entre os drones maiores mencionadas por Michel, também está sendo empregada na Ucrânia a turca Bayraktar TB2, de combate e reconhecimento, com 6,5 metros de comprimento, envergadura de 12 metros e 420 quilos. Desenvolvida pela empresa Baykar em 2014, seu nome significa “porta-estandarte” em turco.

Inteiramente autônoma, ela pode permanecer no ar por 24 horas ininterruptas, a uma altitude máxima de 7.300 metros, velocidade de 220 Km/h e alcance de 150 quilômetros. No modo automático, ela é capaz de decolar sem auxílio de um coordenador em terra, voar até o alvo programado, espioná-lo, retornar e pousar.

Em missões de espionagem, o exército ucraniano já utiliza a drone Vector, da firma Quantum Systems, sediada no estado alemão da Baviera. Segundo a rede jornalística Redaktions-Netzwerk Deutschland (RND), o cônsul da Ucrânia em Munique estabeleceu o contato, e até o fechamento do contrato de fornecimento passaram-se apenas cinco dias. Pouco depois, três combatentes ucranianos já enviavam sua selfie ao lado do veículo.

A Vector custa por volta de 180 mil euros, pagos pessoalmente por multimilionários ucranianos, como “doação ao Comando Territorial para a Defesa de Dnipro”, prossegue o artigo da RND. Ela não é uma arma propriamente dita, não sendo capaz de lançar bombas, embora uma conexão digital permita acoplá-la a um sistema armamentista.

Ainda assim, ela é muito cobiçada por suas capacidades avançadas de voo (duas horas) e transferência de vídeo (alta definição em tempo real, a distâncias de até 15 quilômetros). Os ucranianos a empregariam para otimizar a mobilização de sua artilharia, por exemplo, contra tanques russos que se aproximem. Além de poder ser montada sem ferramentas, a Vector não necessita pista de voo pois, apesar de ter três metros de envergadura, decola verticalmente.

Segundo o Ministério da Defesa do Japão, também o país forneceu drones a pedido da Ucrânia, assim como máscaras e vestes protetoras. Contudo os soldados do país invadido pela Rússia também operam drones nacionais, sendo a mais difundida a Leleka-100 (“cegonha” em ucraniano). Pesando cinco quilos, ela é fabricada pela Deviro, sediada em Dnipro, no centro do país.

Por sua vez, a Rússia aparentemente aposta menos em drones. A mais utilizada é a Orlan-10 (“águia” em russo), para reconhecimento e vigilância, fabricada pelo Centro de Tecnologia Especial de São Petersburgo. Com apenas 3,10 metros de envergadura, ela alcança até 100 quilômetros e serve também para precisar melhor disparos de artilharia, sendo dotada de câmeras para fotos aéreas, de vídeo e térmicas.

Terra de ninguém ética?

Paralelamente aos avanços tecnológicos, o emprego de drones abre uma série de desafios éticos e riscos, em decorrência da autonomia crescente dos sistemas armamentistas, ressalta Arthur Holland Michel em seu canal no Twitter.

Por exemplo: os usuários possuem suficiente visão da situação para decidir sobre o emprego de violência? As armas fornecem possibilidades de controle para garantir que as ofensivas sejam efetuadas com cautela? Elas são suscetíveis a ataques e manipulações por hackers, capazes de resultar em acidentes e danos não intencionais?

Se o sistema provocar danos não intencionais, há canais definidos através dos quais indivíduos específicos possam ser responsabilizados? Como eliminar riscos e manter padrões de segurança? Como proteger os civis?

“A cada função autônoma adicional integrada nessas armas, considerações como estas se multiplicam. Assim, eu incentivo os envolvidos a se concentrarem nas funções automatizadas individuais dos sistemas e nos riscos passíveis de ocorrer, caso elas falhem”, adverte o especialista em ética internacional.

O desenvolvimento de sistemas armamentistas por controle remoto ou automáticos progride vertiginosamente, mas as apreensões permanecem. Guerra autônomas de drones são um cenário de horror ético.