Impedidos de ir ao médico durante a pandemia de Covid-19, pacientes de todo o mundo descobriram uma nova forma de obter orientação de especialistas. No Brasil, estima-se que 30 milhões de consultas on-line foram realizadas em 2022. Para muitos, foi a primeira vez, embora a a telessaúde já estivesse presente no País desde a década de 1990. A modalidade foi regulamentada em dezembro do ano passado com a Lei 14.510, que substituiu três dispositivos anteriores. As condições criadas pela Covid-19 abriram um mercado para que empresas de fora da área de saúde se interessassem pelo setor. Os números explicam o interesse. Em 2019, as teleconsultas movimentaram US$ 40 bilhões. A cifra dobrou no ano seguinte e poderá chegar a US$ 300 bilhões até 2026. Entre os maiores interessados em lucrar com esse filão está o setor de telecom.

Um exemplo é a Vivo, que anunciou em março a compra da Vale Saúde Sempre, startup que oferece descontos em consultas e exames por assinatura. A operadora já era cliente da empresa desde meados do ano passado, oferecendo um serviço desenvolvido especialmente para ela, voltado para consumidores finais e disponível para contratação por qualquer pessoa através da sua marca própria, a Vida V, que utiliza a rede credenciada e os sistemas da Vale Saúde. A empresa tem 250 mil usuários e, ao longo dos últimos três anos, sua receita líquida cresceu a uma taxa superior a 60% ao ano.

Segundo o diretor de Inovação e Novos Negócios da Vivo, Rodrigo Gruner, uma parte relevante dos 60 milhões de clientes da operadora tem o perfil de usuário da startup. Por isso, a expectativa é que a compra turbine o ecossistema digital da operadora. “Temos um aquário gigantesco para pescar entre pessoas físicas, bem como oferecer a assinatura para PMEs que não têm condições de oferecer um plano de saúde tradicional para os empregados,” disse Gruner.

Também em março, a operadora Unifique selou parceria com a plataforma Topmed, que nos últimos três anos realizou cerca de 5 milhões de teleatendimentos. Para a CEO da Topmed, Valda Stange, “a saúde digital tem mudado a maneira como obtemos atendimento clínico”. Por meio dela, o especialista pode participar da consulta on-line com o médico generalista. A modalidade é chamada de teleinterconsulta.“Com isso tivemos redução de 56% nos encaminhamentos”, afirmou.

SUS digital Apesar de a iniciativa privada ser a maior investidora em telemedicina, essa é uma das principais soluções apontadas para reduzir as filas do SUS. Mesmo antes da pandemia ela já era apresentada como a saída para ampliar rapidamente a oferta de consultas, garantir atendimento de alta complexidade em regiões remotas e reduzir custos com deslocamentos para os pacientes. Professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Phd em Saúde Coletiva, o médico Heider Pinto foi o responsável pelo Programa Telessaúde Brasil entre 2014 e 2016. Para ele, uma das vantagens do sistema é superar a falta de especialistas fisicamente distribuídos em todo o País. “Este ano, o Ministério da Saúde criou a Secretaria de Saúde Digital. É uma sinalização consistente da construção de uma política de investimento em ferramentas de atenção remota”, afirmou. “A prioridade será um serviço de que o usuário goste mais e que seja mais barato”.

Segundo especialistas, a telemedicina jamais substituirá o serviço médico tradicional. Diretor de Inovação e Transformação Digital da Unifique, Gabriel Amâncio entende que os serviço são complementares e não concorrentes. “Empresas tradicionais levam tempo maior para aderir às práticas de transformação digital.” Ainda assim, a tendência é que o serviço chegue a mais pacientes, reduzindo em até dois terços as filas atuais.

Apesar da falta de formação específica dos profissionais de saúde, dos desafios de proteger os dados digitais e da resistência corporativa a mudanças, o futuro da medicina irá combinar o melhor dos mundos físico e digital.

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