A novela em que se transformou a batalha entre a fabricante de refrigerantes Dolly, do empresário Laerte Codonho, e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) acaba de ganhar novo capítulo. O executivo conseguiu virar o jogo na Justiça e a dívida de R$ 1,7 bilhão em impostos que a empresa era acusada de ter com a Receita Federal transformou-se em créditos de R$ 200 milhões. Uma tutela de urgência concedida pelo juiz Eduardo Rocha Penteado, da 14ª Vara Federal em Brasília, e uma sentença do juiz Carlos Loverra, da 1ª Vara Federal em São Bernardo do Campo (SP), reconheceram que a engarrafadora de bebidas tem o direito de usar créditos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

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Os juízes levaram em conta uma decisão de abril do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou às empresas do setor de bebidas o direito ao crédito do IPI na entrada de insumos produzidos na Zona Franca de Manaus. O concentrado usado nos refrigerantes da marca Dolly é comprado de fabricantes dessa região. O empresário comemorou. “Agora é entrar com o procedimento legal para receber os créditos a que temos direito”, diz Codonho. “Não é nada rápido. Costumo dizer que são 24 horas para quebrarem você e 24 meses para conseguir se reerguer.” Segundo Codonho, procuradores interferiram na recuperação judicial para que a União figurase como credora, o que não é permitido pelo Código Tributário Nacional. “E isso sem que houvesse dívida. É um absurdo. Agora tenho decisões reconhecendo que temos créditos a receber. Isso é um alento para quem foi tratado como criminoso e teve o nome enxovalhado publicamente”.

DETENÇÃO A história começou em junho de 2016, quando foram reveladas fraudes contábeis de R$ 100 milhões nas contas da Dolly. Segundo Codonho, o que aconteceu é que sua empresa foi vítima de um golpe do seu então contador, Rogério Raucci, sócio da RD Assessoria Contábil, que teria desviado recursos e deixado de pagar impostos devidos. O sócio minoritário do escritório, Esaú Vespúcio Domingues, fez acordo de delação premiada e confessou os crimes à Polícia Federal e ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco). A confissão, porém, parece não ter convencido os procuradores responsáveis pelo caso. Em maio de 2018 a Justiça ordenou medidas cautelares contra o executivo, que teve bens seqüestrados, sigilos fiscal e bancário quebrados, conta corrente bloqueada, além de ter ficado preso por oito dias. No mês seguinte, a Dolly apresentou pedido de recuperação judicial. O processo resultou no fechamento de uma unidade fabril (havia quatro em operação) e a demissão de 1 mil funcionários.

O que intriga o proprietário da Dolly é que as medidas se basearam em uma investigação que teve dados de uma empresa de tecnologia que, segundo ele, “é ligada à Coca-Cola e à AmBev”. Codonho diz não ter dúvidas de que foi vítima dos concorrentes “que desejam a Dolly fora do mercado”, além do que ele chama de “má-fé dos procuradores”. Por má-fé entenda-se o uso, por parte de servidores federais e estaduais, de documentos como prova da compra de imóveis no Brasil por meio da offshore Lumia Capital Industries LLC, sediada no estado americano de Nevada. Segundo a denúncia, ela pertenceria a Codonho. “Não sou proprietário desta empresa”, diz.

O dono da Dolly lembra que a decisão de transformar a dívida em crédito é apenas uma etapa de todo o processo, que ainda levará tempo para ser concluído. “Isso só vai se definir em Brasília. Mas tenho consciência de que vou ganhar”.