O esforço do empresário Laerte Codonho para provar dentro e fora dos tribunais a inocência da fabricante de refrigerantes Dolly tem se mostrado compensador. O Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a anulação de um suposto débito fiscal de quase R$ 211 milhões da Ragi Refrigerantes (Ecoserv), engarrafadora dos refrigerantes Dolly, com a Secretaria da Fazenda do Estado. Em decisão unânime, a 8ª Câmara de Direito Público da corte manteve a sentença da juíza Graciella Lorenzo Salzman, da Vara da Fazenda Pública de Barueri, anulando a cobrança. A suposta dívida foi o que levou à prisão o executivo em 2018. “O tiro saiu pela culatra. Quiseram acabar conosco, mas no final ficou positivo para a empresa”, disse Codonho à DINHEIRO.

Segundo os desembargadores Leonel Costa, Bandeira Lins e Antonio Celso Faria, o laudo pericial determinado pela juíza comprovou que a empresa já havia negociado com o Fisco a entrega de declarações fiscais em atraso e o respectivo pagamento residual, de apenas R$ 50 mil, quando foi surpreendida por uma segunda autuação pelos mesmos fatos: a falta de entrega de declarações entre janeiro de 2012 e dezembro de 2016. Foi essa segunda autuação que levou à abertura de ação criminal contra Codonho.

De acordo com o desembargador Costa, o auto de infração foi lavrado contemplando o mesmo período das obrigações acessórias cuja entrega havia sido devidamente autorizada pelo Fisco, como consta em ata de reunião na qual estavam autoridades da Secretaria da Fazenda do Estado, da Procuradoria-Geral do Estado e da Delegacia Regional Tributária de São Bernardo do Campo (DRT-12). “Após a entrega de toda a escrituração fiscal, ela foi avaliada e consolidada pelo DRT, resultando na apuração do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a pagar. No mesmo momento em que foi notificada pela DRT-14 (Osasco) para pagar o saldo restante, a empresa foi surpreendida pelo auto de infração da DRT-12, como se as mesmas não tivessem sido entregues”, afirmou o desembargador.

Costa, com a concordância de Lins e Faria, usou a Operação Lava Jato como exemplo ao rejeitar recurso da Procuradoria-Geral do Estado, que protestou contra a conveniência do laudo pericial com o argumento de que a Dolly era alvo de processos criminais. “Isso não pode ser pressuposto para o solapamento dos direitos básicos e fundamentais da parte. O juiz deve analisar os autos com imparcialidade”, disse. A operação deflagrada em 2014 pela Justiça Federal foi a maior investigação de desvio e lavagem de dinheiro no Brasil, mas teve algumas decisões anuladas sob a justificativa de irregularidades nos julgamentos.

CONTUNDÊNCIA A empresa comandada por Codonho teve outro motivo para comemorar. O tribunal, sob justificativa de falta de critério do Fisco e da PGE, acatou recurso da defesa e aumentou os honorários advocatícios de R$ 50 mil para 1% do valor da causa. Na visão do desembargador Faria, “já passou da hora de a Secretaria da Fazenda ter grandes cautelas sobre os procedimentos que adota, especialmente sobre grandes autuações como essa, de R$ 200 milhões, porque isso se reflete nos honorários advocatícios”, disse.

Para a defesa, a decisão evidencia a preocupação da Justiça com a má-fé do Fisco estadual, que consumiu três anos de recursos públicos e de trabalho do Judiciário. “Os procuradores omitiram deliberadamente a informação de que o Fisco já havia negociado o débito com a empresa”, afirmou o advogado Carlos Vinícius de Araújo. Codonho chama atenção para a contundência dos desembargadores no julgamento. Na opinião dele, os votos evidenciam a atitude da PGE. “A procuradoria fez a denúncia contra mim, me levou a ficar preso por oito dias. Uma irresponsabilidade. Sabe-se lá quais são os interesses que movem a procuradoria. Todos viram o que passamos. Um absurdo.”

UNANIMIDADE Decisão da 8ª Câmara de Direito Público do TJ-SP (ao lado)manteve a sentença da juíza Graciella Lorenzo Salzman, que anula a cobrança.