Na quarta-feira 29, Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central (BC), convocou os jornalistas para informar que o século XXI tinha começado no mercado de câmbio. Campos Neto anunciou uma nova fase do programa de modernização do sistema financeiro. A nova etapa, modernosamente chamada BC# (pronuncia-se “BC hashtag”), trouxe promessas de mudança em algo que começou a ser instituído há quase um século, e cujo corpo principal datava dos anos 1970: a legislação cambial. Em dois ou três anos o real brasileiro pode tornar-se uma moeda conversível. Ou seja, os cidadãos poderão trocá-lo por dólares, euros ou qualquer outra moeda sem ter de enfrentar uma montanha de entraves burocráticos.

A complicação tinha motivo. No século passado, dólar no Brasil era como penicilina em trincheira de guerra. Artigo escasso, difícil de obter, e que só poderia ser usado para pagar importações muito necessárias. Assim, cada dólar que entrava por meio de suadas exportações ou sofridos investimentos tinha de ser rigorosamente protegido e controlado.

Atualmente, com câmbio flutuante, liquidez internacional elevada e US$ 384 bilhões em reservas internacionais na posição de 31 de março, todo esse controle passou a ser desnecessário. Mesmo assim, até a compra de uns poucos dólares em espécie pelo turista que quer tirar fotos com o Pato Donald na Disney requer o preenchimento de formulários que serão enviados ao BC, que registra e classifica cada um dos dólares que entra e que sai do País.

Agora, segundo Campos Neto, isso vai mudar. A miríade de cerca de 450 regras que normatizam as transações com moeda estrangeira será consolidada em um só lei, mais simples e concisa, cujo projeto será enviado pelo BC ao Congresso em breve. Nele, constarão os passos necessários para permitir que a moeda seja efetivamente conversível. A maior parte das mudanças na legislação cambial será burocrática e imperceptível para as pessoas físicas. Porém, quando tudo estiver concluído, será possível ao cidadão brasileiro abrir contas-correntes em dólares no Brasil, embora essa possibilidade ainda demore dois ou três anos para ser colocada em prática.

As mudanças trarão várias vantagens para a economia, como reduzir custos para as empresas com negócios no Exterior e facilitar a atuação de fintechs internacionais no País, elevando a concorrência no sistema. A conversibilidade não será uma via de mão única. O BC também vai facilitar a atuação de bancos internacionais que queiram oferecer contas-correntes em reais em seus países de origem. Algumas instituições financeiras latino-americanas já demonstraram estar interessadas. Com isso, o real poderá servir como reserva de valor para os países vizinhos com economias menos sólidas.