Uma melhora do apetite ao risco no exterior, na esteira da divulgação da ata do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), tirou um pouco de pressão do mercado doméstico de câmbio. Com aceleração das Bolsas em Nova York e diminuição dos ganhos da moeda norte-americana no exterior, o dólar à vista – que mostrou avanço firme ao longo da tarde, na faixa entre R$ 4,83 e R$ 4,84 – perdeu parte do seu ímpeto e fechou com leve alta, no limiar de R$ 4,82.

A ata do encontro mais recente de política monetária do Fed foi recebida sem grandes sobressaltos pelos investidores. O BC americano acenou com altas consecutivas da taxa básica em 50 pontos-base nas próximas duas reuniões e ratificou a intenção de levar o juro para o nível neutro rapidamente. Não houve menção, contudo, a debates em torno de uma aceleração do ritmo de ajuste da política monetária, com eventual elevação da taxa básica em 75 pontos-base.

Dirigentes do Fed também ressaltaram que esperam crescimento sólido da economia norte-americana no segundo trimestre e descartaram a possibilidade de um surto recessivo a partir do aperto das condições financeiras. Foi o que bastou para o mercado operar a tese de diminuição dos riscos de “estagflação” e impulsionar os ativos de risco.

“A ata do Fed não trouxe novidades. Houve a confirmação de que o Fed pretende manter o nível de elevação da taxa básica em 50 pontos-base, o que abriu espaço para uma recuperação em Nova York e ajudou por aqui”, afirma a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack.

No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes – perdeu parte do seu ímpeto, embora ainda tenha se mantido em alta e subisse cerca de 0,25%, na faixa de 102,100 pontos, quando o mercado doméstico fechou. A moeda americana também reduziu os ganhos frente a divisas emergentes e de países exportadores de commodities.

Por aqui, o dólar chegou a operar em leve baixa e desceu até a mínima de R$ 4,8088 (-0,14%). Na reta final da sessão, a moeda recuperou parte do fôlego altista e fechou cotada a R$ 4,8209, avanço de 0,18%. Apesar de emendar o segundo dia seguido de alta, a divisa ainda acumula queda de 1,09% na semana. Em maio, as perdas são de 2,46%.

A economista Bruna Centeno, especialista em renda fixa da Blue3, observa que havia temores de que o Fed pudesse adotar um tom ainda mais duro, após falas recentes de dirigentes do BC americano sobre a possibilidade de um ajuste mais rápido e intenso da política monetária.

“Havia um temor de que pudesse se falar em alta de 75 pontos-base. Mas o Fed mostrou que não precisa ser tão agressivo ao confirmar novas altas da taxa básica em 50 pontos-base. Isso trouxe um alívio para o mercado.”, diz Centeno. “O cenário de estagflação ainda não está de todo descartado. Mas a economia americana está aquecida e com mercado de trabalho forte. Isso dá certo conforto para o Fed subir os juros.”

Economistas do Bradesco notam, em relatório, que a apreciação recente do real tem como um de seus indutores justamente a diminuição dos temores de uma alta mais agressiva dos juros americanos. Outro ponto favorável ao real foi a reabertura da China após medidas restritivas para combater a covid-19, o que vai afetar positivamente a demanda local e, por tabela, manter os preços das commodities elevados no curto prazo.

Dois modelos desenvolvidos pelo time do Bradesco sugerem que o “valor justo” do dólar seria de R$ 4,40 ou R$ 4,50. Embora os modelos apontem espaço para uma apreciação do real, os economistas do banco afirmam que “existem vetores para ambas as direções e que há uma incerteza acima do usual”. Fundamentos das contas externas, fluxo de recursos em razão de realocação de portfólios globais e diferencial de juros apontam para um real mais forte. Entre os fatores que podem jogar o dólar para cima estão: alta “mais tempestiva” dos juros nos EUA, desaceleração da economia global, com consequente queda de preços das commodities, e o cenário doméstico fiscal de médio prazo.