Após três pregões consecutivos de ganhos firmes, em que experimentou uma valorização de 2,88% e ameaçou romper o patamar R$ 4,75, o dólar voltou a cair no mercado doméstico de câmbio na sessão desta sexta-feira, 8, esboçando se situar novamente abaixo de R$ 4,70. O principal indutor do tombo da moeda americana por aqui foi uma onda de redução de posições defensivas no mercado futuro, insuflada pela expectativa de que a taxa Selic ultrapasse 13% e, quiçá, atinja 14% nos próximos meses.

A aposta é que a leitura de 1,62% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em março, acima do teto de Projeções Broadcast (1,44%), impedirá o Banco Central de encerrar o aperto monetário em maio, com alta final da Selic em 1 ponto porcentual, para 12,75% ao ano. Uma taxa Selic ainda mais elevada encarece o custo de manutenção de proteções cambais (hedge), desestimula apostas mais contundentes contra o real e estimula o carry trade (operações que exploram diferencial de juros entre países).

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A trajetória de queda do dólar, contudo, não foi linear. A taxa de câmbio experimentou algumas trocas de sinal durante o pregão, sobretudo pela manhã. Após cair sob o impacto do IPCA de março, o dólar ganhou força com a aceleração da alta do índice DXY (termômetro do desempenho do dólar frente a seis divisas fortes), que chegou a atingir os 100 pontos, maior patamar desde maio de 2020. A taxas dos Treasuries subiram em bloco, com mercado incorporando aos preços a expectativa de uma ação mais enérgica do Federal Reserve, diante da percepção de aumento dos riscos inflacionários com o prolongamento da guerra na Ucrânia, novas sanções ocidentais à Rússia e lockdown em Xangai, na China, para combater a covid-19.

Ao longo da tarde, com certa moderação da alta do DXY, que passou a trabalhar na casa dos 99,800 pontos, e aumento da pressão vendedora no mercado futuro, o dólar se firmou em terreno negativo. Note-se que moedas emergentes pares do real, com o peso mexicano e o rand sul-africano, também ganharam força nesta sexta.

Com oscilação de cerca de nove centavos entre a máxima (R$ 4,7939) e a mínima (R$ 4,7010), o dólar à vista encerrou a sessão a R$ 4,7089, em baixa de 0,67%. Apesar do recuo desta sexta, o divisa encerra a semana com valorização de 0,89%. No mês, ainda perde 1,10%. Em 2022, a desvalorização acumulada é de 15,55%

O gerente da mesa de derivativos financeiros da H.Commcor, Cleber Alessie, ressalta que o dólar, após a forte desvalorização no primeiro trimestre, havia apresentado uma recuperação significativa nos últimos dias com a postura mais dura do Federal Reserve, explicitada tanto na ata quando em declarações de dirigentes do BC americano. Além da piora dos ativos de risco lá fora, houve uma moderação do fluxo de recurso para o Brasil.

“O real já teve uma correção importante. Hoje, parece que volta a ensaiar uma melhora com o IPCA desfiando o posicionamento do BC de encerrar o ajuste de alta da Selic em maio, com alta de 100 pontos-base”, diz Alessie, ressaltando a possibilidade de manutenção de diferencial de juros elevado, mesmo que o Fed acelere o passo e aumento a taxa básica americana em 0,50 ponto. “Isso traz uma dinâmica baixista para o dólar no curto prazo. Mas a volatilidade deve continuar alta com essa mudança da política monetária nos países desenvolvidos.”

Após o IPCA de março, casas como Itaú, JP Morgan e Bank of America, revisaram para cima a projeção de inflação neste ano e em 2023. O Itaú manteve projeção de taxa Selic em 13,75%, com alta de 1 ponto porcentual em maio e elevações de 0,50 ponto em junho e agosto.

O economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, vê necessidade de taxa Selic superior a 13,5% para garantir a continuidade do movimento de queda do dólar, que pode se situar abaixo de R$ 4,50, contribuindo para mitigar as pressões inflacionárias. “Nossa previsão do IPCA foi reestimada de 7,3% para 7,84%. Teremos mais inércia para 2023”, afirma Velho, em relatório. “Isso reforça nosso cenário de Selic mais elevada, na faixa de 13,5% a 13,75%.”