O dólar emendou o terceiro pregão seguido de queda na sessão desta quarta-feira, 16, marcada por recuperação dos preços das commodities e enfraquecimento global da moeda americana. Operadores voltaram a relatar forte apetite de estrangeiros por ativos domésticos (bolsa e renda fixa) e fechamento de câmbio por parte de exportadores.

Em baixa desde a abertura dos negócios, o dólar à vista tocou mínimas na última hora do pregão em sintonia com o ambiente externo, em meio à divulgação da ata do mais recente encontro de política monetária do Federal Reserve. O documento não trouxe novidades e, dado que já saíram indicadores de inflação relevantes da economia americana desde a reunião do BC americano, em 26 de janeiro, é visto como já envelhecido.

A divisa, que havia fechado ontem abaixo de R$ 5,20 pela primeira vez desde seis de setembro, rompeu o piso de R$ 5,15 ainda pela manhã e passou a maior parte da tarde orbitando R$ 5,14. Na reta final da sessão, escorregou até o patamar de R$ 5,12 e acabou encerrando em queda de 1,02%, a R$ 5,1279 – mínima do dia e menor valor de fechamento desde 29 de julho de 2021.

Lá fora, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes – também registrou mínima após a ata do Fed, passando a ser negociado abaixo da linha de 95,800 pontos. A moeda americana apanhou frente a divisas emergentes e de exportadores de commodities. Até o rublo experimentou leve fortalecimento, a despeito de ainda haver certo receio em torno de uma eventual invasão russa à Ucrânia.

Em sua ata, o BC americano confirmou que deve dar início a um ciclo de alta de juro em breve (a primeira alta é esperada para março) e que será apropriado, em seguida, começar a redução seu balanço patrimonial – ou seja, retirar dinheiro do sistema. A ata traz a informação, contudo, de que ainda não há nenhuma decisão sobre o tema, algo que deve ocorrer nas próximas reuniões. E que, quando ocorrer, a redução do balanço será em ritmo mais acelerado que na ocasião anterior, entre 2017 e 2019.

Para o gestor de juros e moedas da RPS Capital, Joaquim Sampaio, a ata não trouxe trechos que pudessem sugerir uma postura do Fed que ainda não estivesse refletida nos preços dos ativos, como uma eventual menção a uma alta inicial mais forte dos juros já em março. Daí a reação mais amena do mercado. Sampaio vê a alta de juros nos EUA como um dos propulsores da rotação global de portfólio, que leva investidores a migrar para ativos emergentes, movimento de que o real tem se beneficiado, tanto por estar em níveis depreciados como pelo fato de o Brasil exibir taxa de juros de dois dígitos – e ainda em ascensão. O Citi, por exemplo elevou hoje sua projeção de taxa Selic no fim deste ano de 12,25% para 12,75%.

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“A performance do Ibovespa está bem superior as bolsas lá fora, com essa troca de ações de crescimento por ações de valor. Esse fluxo pode continuar, porque os estrangeiros estão voltando a alocar no Brasil após alguns anos fora”, diz Sampaio, ressaltando que esse movimento não representa, contudo, uma tendência estrutural de valorização dos ativos domésticos. “Os fundamentos não são bons, não temos crescimento. Mas existe essa janela favorável de volta de alocação em Brasil”.

A forte demanda por moeda à vista acabou provocando uma distorção, com a taxa no spot ficando abaixo do nível do dólar futuro de vencimento mais curto, para março. Segundo o Ricardo Gomes da Silva, diretor da Correparti, as vendas de exportadores aumentaram muito desde ontem, com diversas transferências de recursos do exterior para fechando de câmbio.

“A percepção é que o dólar poderá romper a casa dos R$ 5,00 no curto prazo”, diz Gomes Silva, acrescentando que a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) a favor do processo de privatização da Eletrobrás foi muito bem recebida. “O mercado está começando a ficar ’empossado’ e distorcido”, diz o diretor da estratégia da Inversa Publicações, em referência a forte oferta de dólares no mercado à vista.

Dados do fluxo cambial divulgados hoje à tarde pelo Banco Central mostraram continuidade de conversão de dólares em reais para aporte para ativos locais, embora já em ritmo menor. Houve entrada líquida de US$ US$ 693 milhões pelo canal financeiro na semana passada (de 7 a 11 de fevereiro). Na semana anterior (de 31 de janeiro a 4 de fevereiro), esse fluxo havia sido positivo em US$ 4,569 bilhões.

“Os dados do BC e da Bolsa mostram que o fluxo de investimento estrangeiro continua bastante intenso em fevereiro. Uma parte vai também para a renda fixa local, já que a expectativa de alta de juros continua no radar. Isso está trazendo o dólar para baixo”, afirma Bruno Mori, economista e planejador financeiro CFP pela Planejar, acrescentando que a alta das commodities também beneficia o real. “É difícil dizer até onde vai o dólar. Esse é um movimento de fluxo aparentemente de curto prazo, que pode mudar de uma hora para a outra. Temos muitas incertezas na economia brasileira, com inflação alta e eleições”.