“João, você vai renunciar com um ano de mandato?” Foi com essa pergunta que Geraldo Alckmin tentou convencer o então prefeito de São Paulo, João Doria, a desistir da ideia de disputar o governo paulista. A conversa ocorreu no fim de 2017, após o ex-governador sustar os planos presidenciais do afilhado político e começar a trabalhar para construir um palanque único no Estado em torno de Márcio França (PSB), seu vice à época, e fortalecer a sua candidatura à Presidência. “Vou ser candidato a governador”, teria dito Doria.

Tônica da eleição ao Palácio dos Bandeirantes, a renúncia precoce de Doria à Prefeitura, com 15 meses de gestão, rachou o PSDB paulista e sua ampla base de apoio. França se lançou à reeleição alegando que era o único cargo que poderia disputar no exercício do mandato e carregou consigo outros 14 partidos. Doria, por sua vez, arrastou mais cinco siglas e adotou como antídoto à rejeição o discurso de que como governador poderia fazer mais pela cidade e que só um tucano poderia defender o “legado” do PSDB, retórica semelhante à que foi usada por José Serra quando fez o mesmo caminho, em 2006.

Além de desagradar Alckmin, a divisão consumou um fato que não ocorria havia 16 anos na eleição estadual: o segundo turno. Depois de 2002, quando Alckmin precisou de dois turnos para derrotar o petista José Genoino, foram três vitórias tucanas consecutivas em primeiro turno, com Serra (2006) e o próprio Alckmin (2010 e 2014). Agora, segundo pesquisa Ibope/Estado/TV Globo divulgada ontem, Doria tem 32% dos votos válidos, pior desempenho de um tucano desde 1998, e deve enfrentar Paulo Skaf (MDB), com 30%, no turno final. Após crescer nas últimas sondagens, França estacionou nos 18%.

Não foi à toa que a equipe de Doria elegeu França como seu principal alvo. Os ataques começaram ainda na pré-campanha, sempre tentando colar no atual governador o selo de “esquerdista enrustido” e vinculá-lo ao PT, que sofre forte rejeição no Estado. O intuito era impedir que o chefe da máquina estadual, então com 5% nas pesquisas, crescesse – e ainda tentar uma vitória tucana no primeiro turno, como aconteceu em 2016 na Prefeitura. De cara, a candidatura de França custou a engrenar, mas o amplo tempo de TV obtido pelo pessebista na propaganda eleitoral permitiu torná-lo mais conhecido e contra-atacar Doria, acusando o tucano de “abandonar a Prefeitura” e “trair os paulistanos”.

Recall

Mas o ex-prefeito não era o único candidato competitivo a encarnar o sentimento antipetista. Após duas candidaturas frustradas ao governo (2010 e 2014), o presidente licenciado da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, ganhou mais projeção política em 2015 ao patrocinar uma campanha contra o aumento de impostos cujo ícone, um pato inflável gigante, virou símbolo do movimento que culminou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016.

Apesar do amplo conhecimento do eleitorado paulista, fruto também do recall das duas eleições, Skaf esbarrou na rejeição do presidente Michel Temer, correligionário que tentou esconder durante toda a campanha. Sem formar coligação com outro partido, o empresário tentou usar o isolamento político a seu favor, vendendo a ideia de que “não tem rabo preso com ninguém” e, por isso, fará um governo melhor.

Com uma campanha mais tímida que a dos rivais, com eventos mais reservados, Skaf focou seu discurso nas realizações à frente do Sesi e do Senai na área da Educação e no endurecimento das leis penais, como “o fim das saidinhas temporárias de presos”, concedidas a detentos do regime semiaberto.

Segurança

Apesar de ter sido vendida como um case nacional pela campanha presidencial de Alckmin, a segurança pública em São Paulo foi o tema mais explorado pelos candidatos, incluindo os dois aliados do ex-governador. França e Skaf escolherem duas policiais militares como vices. Já Doria prometeu levar batalhões da Rota, tropa de elite da PM paulista, para todas as regiões do Estado e abusou do discurso malufista de “polícia na rua e bandido na cadeia”.

Alvo preferencial dos adversários, que exploraram o descumprimento da promessa de ficar quatro anos na Prefeitura da capital, Doria só conseguiu reduzir sua rejeição após endurecer o tom no combate à criminalidade – chegou a dizer que no seu governo a polícia vai atirar para matar – e aproximando seu discurso ao do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), líder nas pesquisas em São Paulo.

Estagnado nas pesquisas, com 8%, o candidato do PT, Luiz Marinho, apostou todas as fichas na sua relação com o ex-presidente Lula, mas pode ter o pior desempenho petista desde 1994, quando José Dirceu ficou em quarto, com 9%.

Alesp

Racha na eleição ao governo estadual, fraco desempenho na corrida presidencial também em São Paulo, crise ética desencadeada pela Lava Jato, ausência de “puxadores de votos”. Políticos e analistas consideram que a conjuntura que circunda o PSDB paulista deve afetar o desempenho tucano nas urnas e pode fazer com que o partido eleja hoje a menor bancada na Assembleia Legislativa (Alesp) desde que a sigla assumiu o comando do Estado, há 24 anos.

Em 1994, quando Mário Covas venceu a eleição pela primeira vez, o PSDB conseguiu 17 das 94 cadeiras do Legislativo paulista, a segunda maior bancada – o então PMDB elegeu 23. Com exceção de 2002, quando foram 18 deputados tucanos eleitos em uma eleição marcada pela chegada do PT ao poder no País, o partido conseguiu eleger mais de 20 parlamentares em todas os pleitos.

Na eleição anterior, foram 22 vagas conquistadas, número que caiu para 19 após a disputa municipal de 2016 e a saída de quadros históricos do partido. “Uma série de escândalos atingiu os tucanos, como o caso da merenda e dos desvios no metrô. Aécio Neves, que era um símbolo, caiu em desgraça. Além disso, abraçaram o governo (Michel) Temer permanecendo nele até o limite”, diz o cientista político e professor do Insper Carlos Melo.

A ausência de “puxadores” de voto também preocupa alguns tucanos. Dos dez tucanos mais votados para a Alesp em 2014, sete não tentarão a reeleição pelo partido, um grupo que teve, juntos, 1,5 milhão de votos naquele pleito, o equivalente a 30% dos 5,1 milhões de votos obtidos por todos os candidatos tucanos e pela legenda.

“Será uma eleição difícil. Acredito que pode diminuir, mas não radicalmente. A conjuntura já foi mais favorável, mas apesar dessa onda Bolsonaro ter atrapalhado o Alckmin, o 45 continua forte nas eleições proporcionais”, avalia o tucano Fernando Capez, deputado estadual mais votado do Estado em 2014, mas que tentará, desta vez, uma vaga na Câmara dos Deputados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.