Uma empresa saltou aos olhos na semana passada. Sem produto algum no mercado, sem um dólar de receita. Com um CEO de 38 anos e um site lindo com o lema “preservar o mundo natural, para sempre”. De parceiros, ela tem a Amazon e rodadas semestrais de US$ 2,5 bilhões de investimentos. Seu valor de mercado? Chegou a US$ 151 bilhões de dólares, acima da Volkswagen, General Motors e Ford, no mesmo setor, em poucos dias na Nasdaq. Rivian é o nome da estrela, uma mistura das palavras rio e índio, em inglês. A montadora de carros elétricos de aventura fundada em 2009, com base na Califórnia, planta em Illinois e cerca de 9,5 mil funcionários, causou furor no mercado automobilístico. Mas bastou alguns dias para apertarem o freio da novata: a Ford, que investiu US$ 500 milhões em 2019 para que a marca produzisse baterias para seus carros, desacelerou e disse que não mais comprará o item para seus modelos. Ajudou a derrubar o valor da rival para US$ 98,73 bilhões na quarta-feira (23), deixando a Rivian atrás de Volkswagen, BYD e Daimler. Talvez a Ford, avaliada em US$ 81,08 bilhões e com um século e 18 anos de história sobre quatro rodas, não tenha gostado de ver a empresa ter maior valor de mercado do que ela. Mas a luz de alerta acendeu: os carros elétricos vão tomar um grande espaço no futuro próximo e mudar a cadeia de fornecedores da indústria automobilística até 2030.

São poucos protótipos já construídos pela Rivian. O suficiente para rodarem e serem fotografados por estradas sinuosas e terrenos difíceis, já que seus veículos são uma pickup (R1T) e uma SUV (R1S). Não, eles não competem de frente com a líder em valor de mercado no mundo, a Tesla — que logo mais lança sua SUV e a brincadeira fica mais séria. A Rivian finalmente juntou sua pequena e colorida frota e permitiu em setembro que jornalistas especializados do setor testassem as máquinas, que terão preço entre US$ 67 mil e US$ 75 mil, provavelmente em 2022, quando começarem a entregar as encomendas já feitas por clientes nos EUA. A ideia é bonita: toda a cadeia de fabricação da Rivian terá neutralidade de produção de carbono; 1% de seu capital vai para um setor batizado de Forever, que desenvolverá projetos ecológicos; escolha de funcionários que beneficia a diversidade; baterias recicláveis; estofamento sem nada animal; esteiras na fábrica feitas de plástico recuperados do oceano.

Elliot Ross

“A escala do desafio é enorme, mas temos sorte de fazer parte disso: sermos capazes de ajudar a resolver como mudamos nossos sistemas de energia e transporte no planeta totalmente afastados do combustível fóssil”, afirmou o fundador e CEO, RJ Scaringe. Mas o carro anda? Anda, segundo o jornalista americano Tom Moloughney, especializado em elétricos e que dirigiu o R1T, primeira pickup truck elétrica produzida em massa, pelas trilhas incômodas do Colorado. “Entrei no carro entusiasmado e isso geralmente leva ao desapontamento. Mas ele é extraordinário. Um Clark Kent na estrada e um Supertruck no off-road.” Ele acrescentou que em vias tranquilas o Rivian mais parece um sedan, com sofisticada arquitetura de suspensão, quad motor setup com torque vetorial e velocidade assustadora graças a seus 800 cavalos de potência, o mesmo que um Mustang Shelby GT500SE. Claro, são carros ainda em fase de pré-produção, portanto com algumas falhas como o sistema de navegação autônoma que não reconhecia a estrada.

Dito isso, a Rivian está mirando um alvo de desejo dos americanos, o das pickups e SUVs — não tem país que compre mais esse tipo de veículo do que os EUA. A concorrente com carros menos pesados, a Tesla, abriu o caminho para a Rivian, pois seus modelos de ponta mostraram aos motoristas que um elétrico podia ser rápido, ter longa autonomia e aura de objeto de desejo. O modelo de lançamento do R1S está com reservas encerradas. Só as configurações Adventure e Explore estão disponíveis, na faixa de US$ 70 mil. O elétrico vem chegando disruptivo e muitos nem vão perceber. Segundo relatório da McKinsey, até 2035 os maiores mercados automotivos serão elétricos, alterando a cadeia de produção. Só na Europa, há uma previsão de construção de 24 gigantescas fábricas de bateria, componente principal desse novo mundo.