reinventar-se nunca foi problema para a The Walt Disney Company, mesmo depois de mais de cinco décadas da morte de seu criador. O mais novo avanço da fábrica de sonhos quase centenária tem em seu cerne uma das máximas mais famosas atribuídas ao gênio americano. “Nós não olhamos para trás por muito tempo. Nós continuamos seguindo em frente, abrindo novas portas e fazendo coisas novas. Porque somos curiosos… e a curiosidade continua nos conduzindo por novos caminhos. Siga em frente.” A ofensiva desta vez atinge o Brasil e o território latino-americano, onde a companhia lança, no dia 17 de novembro, a plataforma de streaming Disney+, um ano depois de disponibilizar o serviço nos Estados Unidos. No mercado brasileiro, concorrerá com as gigantes Amazon Prime, Globoplay e Netflix. E para enfrentar esse concorrido filão, a empresa traz portfólio de peso, com filmes e séries de Marvel, National Geographic, Pixar e Star Wars. “A Disney vem com dois diferenciais: poder de comunicação e divulgação de seus produtos e seu acervo, com produções que fazem sucesso há décadas”, afirmou Tayara Simões, diretora de marketing e sales da NZN Intelligence, consultoria de mídia on-line que realizou pesquisa sobre o mercado brasileiro.

No levantamento, feito junto a sua base de usuários do hub de pesquisa, a variedade do catálogo é o fator preponderante para contratar o serviço para 49,6% dos entrevistados. Ponto positivo para a Disney. Nesse aspecto, as produções próprias, chamadas no segmento de Originals, é mais um diferencial da companhia da Califórnia.

E o público brasileiro pode esperar produções tupiniquins. “A expectativa é grande, pois os estúdios da Fox Brasil devem ser usados para produções locais”, disse Ivan Martinho, professor de marketing da pós-graduação da ESPM. O investimento da Disney nesse campo é para enfrentar concorrentes calejados. A Netflix anunciou ano passado a produção de 30 filmes, documentários e séries originais feitas no Brasil, e o Globoplay também traz no DNA as produções de teledramaturgia e cinema.

DIFERENCIAL Líder global no mercado de streaming, com 186,5 milhões de assinantes, Netflix é seguida por Amazon Prime Vídeo, com mais de 100 milhões, e Disney+, acima de 46 milhões. (Crédito:Istock)

Na pesquisa NZN, o principal critério revelado na sondagem foi o preço. Para 54,5% das pessoas, esse fator será decisivo para a adoção do serviço. O Disney+ deve custar R$ 28,99 ao mês, mais do que os rivais. O plano básico do Globoplay custa R$ 22,90 mensais; da Netflix, R$ 21,90; e da Amazon Prime, R$ 9,90. Ponto negativo para a Disney. O levantamento ainda revelou o share entre as plataformas de streaming mais procuradas durante a pandemia: 30% assinaram a Amazon, 24,8% a Netflix, 11,1% o Spotify (áudio) e 7,1% o Globoplay.

DISPUTA Segundo estudo feito pelo professor Murillo Dias, da Fundação Getulio Vargas (FGV), referente ao primeiro semestre deste ano, o Globoplay lidera o mercado de streaming no Brasil, com usuários pagantes e não pagantes (há uma versão gratuita, com acesso limitado), seguido por Netflix e Amazon Prime. O mercado nacional de streaming de vídeo teria movimentado R$ 17,8 bilhões no período de 12 meses, entre meados de 2019 e 2020. Já dados do site de estatísticas e pesquisas Statista, motram que, globalmente, o Netflix lidera com 186,5 milhões de assinantes, seguido por Amazon Prime (100,4 milhões), tendo Disney+ em terceiro (46,7 milhões). A projeção é que daqui cinco anos a liderança continue com a Netflix (258 milhões), tendo Disney em segundo (202 milhões).

TRADIÇÃO Amazon Prime Video é a plataforma mais assinada no Brasil durante a pandemia e tem o preço mais atrativo no plano básico entre os líderes de streaming. (Crédito:Divulgação)

Apesar da disputa acirrada, haveria espaço para todo mundo. Nos Estados Unidos, a tendência é a de que cada família contrate em média três plataformas de streaming. O mesmo aconteceria no Brasil. “Para o usuário é excelente ter esse leque de opções. E para players e mercado também, já que ninguém vai querer ficar para trás”, afirmou Guilherme Coelho, agente de distribuição da Bromelia Produções, que trabalha com exclusividade na distribuição da Galinha Pintadinha e de fenômenos como Patati Patatá e Marsha e o Urso. Cintia Medvedovsky, fundadora da Ziggle Licencing, que licencia nomes como Maria Clara & JP e Gato Galáctico, corrobora. “Disney é um importante player que vem somar. É uma marca que lida com emoção. Tem espaço para todos.”

Bromelia e Ziggle atuam também no ramo de streaming advertising, em que a visualização é gratuita, mas o pagamento do usuário é feito com o consumo de publicidade que passa entre um vídeo e outro, ou até mesmo no meio do conteúdo. O canal da Maria Clara & JP, por exemplo, tem 23 milhões de inscritos. Mais que os assinantes de Globoplay.

Esse formato de consumo de vídeo pela internet tem preocupado as empresas de canal a cabo. Nos Estados Unidos, já há um movimento classificado como ‘cord cutters’, ou cortadores de cabo. O termo foi criado para designar os assinantes de TV a cabo que cancelaram pacotes para assinar serviços de streaming. Neste ano, as 12 maiores operadoras americanas de canais a cabo somam 77,5 milhões de contratantes. Já a Netflix registra 69,9 milhões de assinantes no país. Lilian Prado, diretora de operações no Brasil da Smartclip, líder global em publicidade digital, especializada em vídeo, rich media display, canais de conteúdos exclusivos e performance, diz que o ponto central do streaming é a convergência de mídias. A pessoa pode consumir em qualquer lugar, quando quiser, a partir de desktop, notebook, smartphone, tablet… “É consumo por demanda, ao contrário do que a TV aberta oferece. É mudança de consumo e comportamento, principalmente das novas gerações.” A Disney chega ao streaming brasileiro com o sonho de liderar o mercado. Seguindo os preceitos de Walt Disney. “Os sonhos existem para virar realidade.”