Para quem busca investidores, nomes como Mubadala ou Salic são mais sedutores do que uma caprichada dança do ventre. Eles são dois dos fundos soberanos do Oriente Médio. Destinados a administrar as polpudas sobras de caixa que seus países ganham com a exportação de petróleo, esses investidores institucionais têm um patrimônio conjunto estimado em US$ 2,2 trilhões (equivalente a R$ 8,6 trilhões). A cifra é quase o dobro do patrimônio total da indústria brasileira de fundos. Além de ter muito dinheiro, os gestores dos soberanos gostam de investir no longo prazo. Por isso, seus movimentos, invariavelmente discretos, são seguidos com lupa por quem administra dinheiro. E apesar de toda a turbulência dos últimos tempos, esses gigantes estão mapeando novas oportunidades no Brasil.

Os setores mais cobiçados por eles são o de infraestrutura e o de proteínas animais. Os fundos soberanos são grandes compradores de portos, estradas, aeroportos e ferrovias ao redor do mundo. São investimentos que demoram para amadurecer, mas grandes o suficiente para saciar um apetite gigantesco. Não por acaso, os fundos soberanos começaram a chegar ao Brasil há dez anos, quando os primeiros grandes projetos foram lançados. Nem todas as apostas deram certo. Em alguns casos, os investidores se associaram ao empresário Eike Batista, com os resultados conhecidos.

Ainda assim, eles não desistiram da região. “Temos notado muita vontade dos estrangeiros em vir ao Brasil, que ainda está barato para eles”, diz Maximo Lima, CEO da gestora de recursos Hemisfério Sul Investimentos (HSI). Com US$ 2,7 bilhões em ativos imobiliários e de crédito sob gestão, a HSI estrutura fundos de longo prazo. Um deles, de US$ 700 milhões, é dedicado a ativos imobiliários. O outro, de US$ 450 milhões, focado em ativos de crédito. Em ambos, a participação dos investidores do Oriente Médio foi de 15%. Segundo Lima, o interesse permanece. “A questão é que todo mundo está esperando o atual governo se provar.”

RENTABILIDADE Apesar de a Selic estar na mínima histórica de 6,5% ao ano, a rentabilidade dos investimentos brasileiros tem sido muito superior à de países desenvolvidos, em que os juros estão perto (ou mesmo abaixo) de zero. Por isso, além de comprar ativos, nos últimos tempos os grandes investidores vêm buscando parceiros, diz Rubens Hannun, presidente da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira. Há dois anos, a Câmara estuda, com o BNDES, como criar mecanismos que facilitem e estimulem investimentos por aqui. “Ampliar a infraestrutura brasileira vai facilitar o escoamento da produção agrícola e de proteínas”, diz Hannun.

Rubens Hannun, presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira: “Ampliar a infraestrutura brasileira vai facilitar o escoamento da produção agrícola e de proteínas” (Crédito:Claudio Gatti)

No Oriente Médio, o acesso aos alimentos produzidos no Brasil é mais do que uma questão de gosto. Com populações crescentes e muitas terras desérticas, muitos dos países árabes são importadores líquidos de grãos e de proteínas animais. O trânsito de recursos foi facilitado no fim de 2018 quando um acordo entre Brasil e Emirados Árabes Unidos eliminou a bitributação sobre empresas que operam nos dois países. “Isso impedia muitos investimentos árabes no Brasil”, afirma o presidente da Câmara.

Segundo Bernardo Parnes, sócio- fundador da empresa de assessoria financeira independente Investment One Partners, esses são investimentos não apenas financeiros, mas também estratégicos. Parnes mantém relações com investidores globais como os árabes há décadas, à frente de instituições como Deutsche Bank e Merrill Lynch na América latina, além da JSI Investimentos, family office de Joseph Safra. “Havendo boas oportunidades de investimento no país, são bolsos que podemos acessar”, diz Parnes.

Segundo o executivo da HSI, os fundos soberanos geralmente testam um mercado novo comprando alguns ativos. Depois, buscam gestores para administrar seus recursos. Na fase seguinte, montam equipes locais. “Neste momento os fundos árabes ainda estão na segunda fase do processo”, afirma Lima. Atrair esse dinheiro não é fácil. As conversas com investidores do Oriente Médio em geral envolvem representantes ou membros das famílias reais que comandam as nações da região. “O processo decisório não é tão claro”, diz Lima. “É muito diferente de fazer negócios com investidores americanos ou europeus.” No entanto, apesar das diferenças culturais, todos se entendem usando a linguagem universal do dinheiro. “Entregando um bom retorno, eles sempre voltam”, afirma Lima.