“O Brasil não é para principiantes”. A citação de Tom Jobim chega a assustar de tão atual. Afinal, só uma frase de efeito como essa pode explicar o fato de o Congresso Nacional ser o palco de uma campanha contra a insegurança alimentar global na mesma semana da divulgação de que 19,1 milhões de brasileiros estão passando fome. Logo aqui, no País que é um dos maiores produtores de alimentos do mundo.

Pelo estudo feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssam), menos da metade dos domicílios brasileiros (44,8%) tinha os moradores em segurança alimentar. Os demais 55,2% se encontravam em insegurança alimentar (IA) sendo 9% deles em situação de fome. A pior condição está nos domicílios de área rural, onde a fome chega a 12%. Em outras palavras, do total de 212 milhões de brasileiros, 116,8 milhões convivem com algum grau de insegurança alimentar. Destes, 43,4 milhões não têm alimentos suficientes para suprir necessidades nutricionais e 19 milhões passam dias sem ter o que comer.

Pesquisa indica que 19,1 milhões de pessoas passam fome no Brasil

Tudo isso acontece em um país que carrega o título de ser um dos maiores produtores de alimentos do mundo. Somente no ano passado, a produção de grãos bateu 255,4 milhões de toneladas, 5% a mais do que no ano passado. Isso significa 255.400.000.000 quilos de grãos. Some-se a isso 4,3 milhões de toneladas de suínos e mais de 13 milhões de toneladas de frango produzidos e um rebanho bovino de 218,2 milhões de cabeças. Boa parte dessa produção acaba nos portos vendida a países que pagam bem por produtos de qualidade.

Enquanto os números mostram dois brasis — um que enriquece com alimentos e outro que não tem comida no prato — um terceiro senta-se à mesa: o Congresso Nacional que mostra uma alienação sem tamanho ao permitir que, na mesma semana da divulgação das estatísticas, suas cúpulas sejam feitas de telas para projeção de uma campanha da  Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em comemoração do Dia Mundial da Alimentação, no próximo sábado (16). O objetivo é conscientizar a sociedade sobre a necessidade de investimentos para tornar os sistemas agroalimentares mais eficientes, inclusivos e sustentáveis.

Resta-nos torcer para que os frequentadores da casa legislativa sejam impactados pela mensagem. Quem sabe assim, além de pensar em ser a solução da segurança alimentar do mundo — o que é nobre, possível e muito bem vindo —, pense em solucionar o mesmo problema dentro das fronteiras. Afinal, se não contam para as estatísticas do governo, o número de pessoas alimentadas no Brasil entra na contagem global e ajudam o Brasil a conseguir o tão desejado papel de herói alimentar mundial.