Alvo de ações do Supremo Tribunal Federal (STF), a Lei de Abuso de Autoridade continua suscitando divergências, inclusive dentro do próprio ambiente forense. No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o desembargador Andrade Neto, ao reformar decisão, em novembro, indicou que um magistrado de primeiro grau, ao utilizar o argumento de “perigo real de imputação de crime” da Lei 13.869/2019, utilizou processo para promover “uma ação revoltosa totalmente infantil” e transformou o exercício da jurisdição em “paspalhice política”.

Na ocasião, o desembargador determinou ainda que fossem tiradas cópias da decisão de primeira instância para instrução de expediente junto à Corregedoria Geral de Justiça, para que fossem tomadas “providências cabíveis”.

A decisão de Andrade Neto foi dada no dia 13 de novembro, em recurso apresentado pelo Condomínio Edifício Cecília Steinberg contra despacho do juiz Maurício Simões de Almeida Botelho Silva. O magistrado negou pedido de bloqueio de ativos no âmbito de uma ação decorrente de inadimplemento de despesas condominiais.

Em trecho da decisão de primeiro grau, Botelho Silva apontou que o artigo 36 da Lei do Abuso tipifica como crime não só a decretação de indisponibilidade de ativos financeiros “em quantia que extrapole exacerbadamente” o valor da dívida, mas também a conduta de deixar de corrigir a decisão, ante demonstração da excessividade da medida.

O magistrado argumentou que o sistema de bloqueio torna indisponível o valor do débito em todas as contas do devedor, gerando “frequentemente a constrição de quantias muito superiores ao valor executado”.

“Observo que apesar da lei nº 13.869/2019 ainda não estar em vigor, considerando o tempo operacional para a realização do bloqueio e de eventual desbloqueio, em uma vara com números de feitos tão elevado, no momento da demonstração da excessividade da medida pela parte, pode já ter decorrido o período da vacatio legis. Portanto, diante do perigo real de imputação de crime previsto na lei de abuso de autoridade, indefiro o pedido de bloqueio”, decidiu o juiz.

No entanto, para Andrade Neto não seria possível aplicar a lei de abuso ao caso em questão. O desembargador destacou que a colocação de Silva, de “perigo real de imputação de crime” seria não só “desarrazoada” mas também “insensata e irresponsável”.