Não será um espanto se, no futuro, o nome Odebrecht for encontrado nos dicionários como sinônimo de corrupção, propina e suborno. Desde que seus donos e principais executivos confessaram esses crimes e relataram à Justiça Federal no âmbito da Operação Lava Jato como corromperam políticos e servidores públicos para obter vantagens em obras de infraestrutura no Brasil e no exterior, o nome Odebrecht ficou marcado para sempre. Há um mês, o Brasil assiste aos vídeos dos depoimentos de 77 executivos com assombro. Com extrema naturalidade, eles contaram como distribuíam os recursos de caixa dois para políticos de quase todos os partidos e alteravam até medidas provisórias do governo no Legislativo. Como sobreviver a isso?

Corromper agentes públicos para ganhar mais dinheiro não é novidade no Brasil, nem no mundo. “O que nós temos no Brasil não é um negócio de cinco anos, dez anos. Esse sistema de fazer política acontece há 30 anos”, disse Emilio Odebrecht, que foi presidente executivo do Grupo de 1991 a 2002, quando passou o cargo para o filho Marcelo e assumiu a presidência do Conselho de Administração. “Tudo o que está acontecendo era um negócio institucionalizado.” Marcelo complementou: “Não existe ninguém eleito no Brasil sem caixa dois”.

O que assusta é a intensidade da corrupção entranhada na cultura e nas atividades da Odebrecht, que agora precisa se livrar desse passado sujo para sobreviver à hecatombe da Lava Jato em seus negócios. Para deixar para trás o título de empresa mais corrupta do País, obtido nos governos Lula e Dilma, a Odebrecht tenta se reinventar. Seus sócios sabem que o modus operandi que fez engenheiros trocarem os cálculos civis pelas contas de pagamentos de propina em busca de privilégios em grandes obras, cartas marcadas em licitações, entre outras combinações que se faz nos subterrâneos do poder, precisa ser enterrado.

O vexame do fórum econômico mundial: o ex-presidente Lula marcou presença em Davos
O vexame do Fórum Econômico Mundial: o ex-presidente Lula marcou presença em Davos (Crédito:Alexandre Campbell)

A empresa tenta demonstrar, tanto com a divulgação de comunicados e pedidos de desculpas, como em novas práticas de auditoria e controle, que uma nova Odebrecht está nascendo, sem os métodos impróprios. Não será fácil convencer a sociedade de que os funcionários remanescentes serão capazes de criar e implementar novas práticas de governança corporativa na companhia. Por isso, várias ações estão sendo tomadas. Foi definido, por exemplo, a ampliação de conselheiros independentes para promover a diversidade e reforçar a transparência.

Em 2015, havia apenas seis. A perspectiva é chegar a 24 até o final deste ano. A empresa de headhunting Russell Reynolds está em fase de seleção desses nomes. Cada área do Grupo Odebrecht passou a ter um sistema próprio de conformidade (compliance), que atua de forma independente à direção executiva e se reporta apenas aos Conselhos. “É possível salvar a marca com esse nível de degradação, mas será um trabalho hercúleo”, afirma Francisco Madia, sócio da Madiamundo Marketing. “Mas é preciso saber se, do ponto de vista econômico, o Grupo para de pé e se vai conseguir competir honestamente no mercado. Não é uma simples troca da moldura para a mesma tela.”

Em resposta ao pedido de entrevista solicitado pela DINHEIRO, a Odebrecht respondeu por escrito que “a empresa confessou os crimes cometidos. Pediu desculpas públicas e pagará pesado por isso. Tirou de sua gestão nada menos do que 77 executivos, que por sua vez pagarão multas e cumprirão penas”. Segundo o texto (leia a íntegra ao final da reportagem), “a empresa não sairá impune. Pagará a mais alta multa já aplicada em todo o mundo em Acordos de Leniência.” O que está em jogo no momento e causa impacto nos negócios, prossegue a Odebrecht, “é a indefinição de instituições públicas como TCU, CGU e AGU sobre a legitimidade de um Acordo de Leniência assinado pela empresa com o Ministério Público Federal e já homologado pela Justiça dos Estados Unidos.”

O pior, o banimento do mercado, foi evitado: “Hoje, por conta desse acordo, a Odebrecht já está habilitada a participar de qualquer licitação do governo americano ou de qualquer negócio dentro dos Estados Unidos. No Brasil, a disputa de protagonismo e mesmo a imprecisão ou contradição de leis atrasam a volta das empresas lenientes às suas atividades normais e à geração de emprego e renda”. A corrupção da Odebrecht não se restringiu apenas ao território nacional, como demonstrou o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, no final do ano passado. A propina aconteceu em mais de 100 projetos no País e se espalhou por mais de 11 países, como México, Cuba, Venezuela, Colômbia, África do Sul e Angola, onde também a empresa está sendo investigada.

No Panamá, no Peru e no Equador, por exemplo, foi proibida de operar. A prática de crimes elevou o faturamento da empresa de R$ 24 bilhões em 2006 para R$ 132 bilhões em 2015. Agora é hora de devolver parte dos lucros e seguir em frente. Num acordo assinado em conjunto entre autoridades brasileiras, americanas e suíças, a Odebrecht foi obrigada a pagar US$ 2,6 bilhões em multas. A empresa estima que esse custo possa alcançar US$ 4 bilhões assim que o valor dos impostos sobre o dinheiro depositado no exterior for calculado. O maior desafio, após a Lava Jato, é continuar entre as maiores empresas do País.

O vexame do fórum econômico mundial 2: Marcelo Odebrecht foi apontado como jovem líder global pela organização
O vexame do Fórum Econômico Mundial 2: Marcelo Odebrecht foi apontado como jovem líder global pela organização (Crédito:Cicero Rodrigues)

DESAFIO FINANCEIRO Antes de qualquer estratégia de mercado, a Odebrecht precisa olhar para o seu caixa para assegurar sua sobrevivência. A Construtora Norberto Odebrecht, maior geradora de liquidez do grupo, não consegue financiamento para suas obras há mais de dois anos. A companhia está no mais baixo nível de classificação de risco da agência Moody’s. Ela está em perspectiva negativa e é considerada de alto risco de inadimplência e de baixo interesse para investimento.

A dívida bruta do Grupo Odebrecht chegou a R$ 93 bilhões no final do ano passado, para um caixa de apenas R$ 17 bilhões, segundo estimativas de especialistas que acompanham a companhia. Há um ano, o plano da Odebrecht era arrecadar R$ 12 bilhões com a venda de ativos e reduzir o endividamento em R$ 17 bilhões. Até agora, o Grupo conseguiu atingir apenas R$ 4 bilhões, após a venda da Odebrecht Ambiental, em abril deste ano, para o fundo canadense Brookfield, por R$ 2,4 bilhões. A negociação entre as empresas demorou cerca de seis meses para se concretizar em razão do impacto das delações.

Nas eleições de 2012, por exemplo, a Odebrecht Ambiental afirma ter realizado 54 doações ilegais, sendo 34 no interior de São Paulo. Criada em 2008 para atuar no setor de saneamento básico, a companhia está presente em 179 cidades em 12 estados. Confirmar a venda foi fundamental para aliviar as finanças do Grupo Odebrecht, que também obteve sucesso nas negociações com os bancos credores e ficou com os novos recursos em caixa. O plano é investir em negócios que possam trazer resultados mais robustos no futuro.

“O risco de recuperação judicial deixou de existir”, afirmou Newton de Souza, diretor-executivo do Grupo, ao jornal Valor Econômico. Souza está há quase 30 anos na Odebrecht e é o homem de confiança de Emilio. “Estamos pagando um preço alto. Num primeiro momento, as pessoas ficam negando o nosso direito de existir.” Nos últimos três anos, o quadro de funcionários da Odebrecht diminuiu de 168 mil para 75 mil pessoas. A mancha sobre a empresa ainda provoca o questionamento do mercado sobre a viabilidade de sua contratação como prestadora de serviços.

Sua qualidade técnica é inquestionável: ela domina várias tecnologias e tem competência operacional reconhecida. Apesar disso, é sempre um risco associar-se à marca e à empresa envolvida na Lava Jato. Além dela, outros gigantes do mercado estão encalacrados, como OAS, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, etc. Mas o caso da Odebrecht, até agora, é o mais grave. O presidente de uma concessionária de infraestrutura, que conversou com a DINHEIRO sob condição de anonimato, explicou que este não é o momento de contratar a empresa de Emilio (que está afastado) e Marcelo Odebrecht (que está preso).

“Eles estão concentrados em resolver seus problemas com a Justiça e não vão se dedicar 100% ao projeto”, diz o executivo. “Esse é um risco que não quero mais correr.” Sua empresa passou por um problema com uma fornecedora envolvida na Lava Jato, que ficou sem crédito no mercado financeiro e paralisou a obra. “Tive prejuízo e não vou repetir essa experiência”, afirma a fonte. O Grupo Odebrecht vai, necessariamente, diminuir de tamanho com a venda de ativos que não são considerados prioritários.

Depois da Odebrecht Ambiental, a companhia quer por fim aos negócios ligados ao setor de energia, como a hidrelétrica de Santo Antônio. O parque eólico de Corredor do Senandes, no Rio Grande do Sul, foi vendido para o Grupo NC. As participações em várias concessões de infraestrutura pelo País, como o Rio Galeão, a Embraport e a Via Quatro, também estão à venda. No mercado internacional, a situação é mais complexa. A empresa portuguesa de energia EDP demonstrou interesse em fazer uma oferta pela hidrelétrica Chaglla, no Peru. A ideia não foi adiante pelo temor de uma nacionalização da operação pelos peruanos.

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Tão importante quanto a venda de ativos é a busca por sócios nas nove unidades de negócio da Odebrecht. Até a construtora pode receber um parceiro. Esse movimento acabará com um dilema interno: como apagar marcas manchadas pela corrupção sem demonstrar desespero em razão da crise? Até pouco tempo atrás, esse era considerado um assunto proibido. Agora, na redefinição dos negócios, é provável que a holding mantenha o sobrenome da família Odebrecht e, à medida que novos sócios cheguem a cada uma das unidades, uma nova marca seja criada. “É muito difícil a Odebrecht se recuperar”, diz Herbert Steinberg, sócio da Mesa Corporate Governance. “Uma saída é ser dividida, mudar de nome e vender o controle.”

Dentro do Grupo, a Braskem parece ser um caso à parte. É o ativo mais importante e valioso, que se transformou numa das grandes empresas globais de petroquímica, com centros de tecnologia e inovação no Brasil, Estados Unidos e México. Seu capital total está dividido entre a Odebrecht, com 38,3%, e a Petrobras, que detém 36,1%. Essa sociedade, porém, será desfeita em breve. A Petrobras já anunciou que a Braskem faz parte do seu plano de desinvestimentos.

Embora a Odebrecht negue o interesse em se desfazer desse negócio, o mercado acredita que, no curto prazo, a empresa terá o capital totalmente pulverizado. “Os novos modelos de gestão e governança vão levar a Braskem a ser a Lojas Renner do setor petroquímico”, diz uma fonte, que pediu para não ser identificada, ao compará-la com a rede varejista que não tem mais dono. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o presidente da Braskem, Fernando Musa, afirmou que esse não é o caminho. “A Odebrecht tem dito que não pretende vender as suas ações na Braskem. Se isso mudar, a empresa toda estará à venda”, disse ele. “Uma coisa é vender 36%, outra é vender 75%.”

Para seguir em frente, a Odebrecht precisa, ainda, provar que deixou um componente cultural que se transformou num valor para a empresa. Após 2006, Marcelo Odebrecht transformou a prática de suborno em algo, de fato, profissional. Ele intensificou, multiplicou e aperfeiçoou a roubalheira. O executivo Hilberto Mascarenhas Filho foi escolhido a dedo por ele para montar o chamado Departamento de Operações Estruturadas (veja infográfico acima).

Ali ficaria concentrado todo o fluxo financeiro desse crime, além de uma organizada lista com os beneficiários e mais de uma centena de apelidos criativos. Além disso, foram estabelecidas hierarquias de pagamento conforme o cargo que o político ocupava. Em seu depoimento, Mascarenhas Filho disse que foi “obrigado” a fazer parte do esquema, mas “aceitou” pela remuneração e benefícios que conquistaria.

No mesmo ano em que tornou a propina uma unidade de negócios da Odebrecht, Marcelo foi escolhido como um dos Jovens Líderes Globais pelo Fórum Econômico Mundial, em Davos, a reunião anual da elite mundial dos negócios. Ele chegou a ocupar o cargo de co-presidente da América Latina do Fórum e a produzir um relatório intitulado “Criando modelos inovadores de parcerias público-privadas”. Entre 2006 e 2014, o Grupo estima o pagamento de US$ 3,4 bilhões (quase
R$ 11 bilhões) via caixa dois. Não deixa de ser irônica que a inovação feita por ele na relação público-privado foi às avessas.

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Leia a íntegra das respostas enviadas à DINHEIRO pelo Grupo Odebrecht:

Como o departamento de compliance tem trabalhado para minimizar os danos à imagem e evitar que eles se repitam? Ele trabalha de forma independente e tem liberdade de ação?
Sim, trabalha de forma independente e tem total liberdade de ação. Primeiro, o grupo Odebrecht recriou a sua governança. Implantou Conselhos de Administração em cada Negócio, com governança definida e independente. Ampliação do número de conselheiros independentes, garantindo ao menos 20% dos seus membros como independentes (e não menos que dois participantes com essa característica) para promover a diversidade e reforçar a transparência. Em 2015, havia 6 posições de conselheiros independentes, e hoje já são 13 vagas. A perspectiva é chegar a 24 conselheiros independentes até o final do ano (não são integrantes, não tem vínculo empregatício e nenhuma relação comercial com a empresa – são experts no negócio e ajudam com sua experiência). Ao mesmo tempo, a Odebrecht aprofundou o seu Sistema de Conformidade. Talvez não haja hoje no Brasil uma corporação empresarial com tantos CCOs (Chief Compliance Officers) como a Odebrecht. São 9, um em cada área de Negócio do grupo. A área de conformidade contava com 30 profissionais em 2015, aumentou esse número para 49 em janeiro de 2017 e até o final do ano deve chegar a 60 pessoas. Essa equipe é responsável pela criação e melhoria de processos e controles, projetos de educação e treinamento e investigação de eventuais denúncias. Essas atividades são realizadas pelas equipes internas, com apoio de consultores e empresas externas. O investimento também aumentou. Saltou de R$ 11,4 milhões em 2015 para R$ 64 milhões em 2017. Além disso, desde março deste ano toda e qualquer atividade do grupo Odebrecht, inclusive financeira e contábil, vem sendo acompanhada com lupa por dois monitores externos independentes, um designado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) e o outro indicado pelo Ministério Público Federal do Brasil. Eles verificam, principalmente, se estão sendo cumpridas as exigências estabelecidas no Acordo de Leniência assinado pela empresa com o MPF, o DoJ e o Ministério Público da Suíça, em decorrência das delações de 77 executivos e ex-executivos do grupo.

Como ficará a participação dos acionistas, Emilio e Marcelo, na nova Odebrecht?
A participação como acionistas não muda. A composição acionária da Odebrecht parte de núcleos formados pelos filhos do fundador Norberto Odebrecht, entre eles Emílio Odebrecht. Eles e seus descendentes são sócios de uma empresa familiar chamada Kieppe, que por sua vez é sócia da ODBinv, na qual também há acionistas minoritários, como os Gradin e executivos da Odebrecht. A ODBinv é a controladora da Odebrecht S.A., por sua vez subdividida em 9 negócios. Debaixo deles há dezenas de empresas, algumas com acionistas estrangeiros.

A empresa estuda trocar de nome?
A Odebrecht não vai trocar de nome nem mudar de marca apenas por mudar. Nenhuma grande empresa faz isso em momento de crise. O que está ocorrendo é uma redefinição do papel da Holding e de seus Negócios, como são denominadas as nove áreas de atuação do grupo. A intenção do grupo é admitir sócios em todos os seus Negócios. Como decorrência natural dessa evolução, inclusive da chegada de novos sócios, é possível, nesse contexto, que haja um processo de rebranding em algumas empresas ou Negócios.

Quais são as ações que a companhia tem feito para aumentar a transparência para o mercado?
O relatório elaborado pela ONG Transparência Internacional, divulgado no final do ano passado, aponta alguns dos avanços do grupo Odebrecht em transparência para o mercado. A Odebrecht subiu 47 posições no ranking de melhores práticas em transparência das informações divulgadas, passando da 97ª posição, em 2013, para 50ª em 2016. O estudo, que teve por base dados do ano de 2015, avaliou a divulgação de informações das cem maiores multinacionais de 15 países emergentes. Mais recentemente, algumas medidas adotadas comprovam a determinação da Odebrecht na ampliação da divulgação de suas informações. A ampliação do número de membros independentes nos Conselhos de Administração da Odebrecht S.A e seus Negócios é um exemplo, promovendo a transparência e a diversidade. Adicionalmente, a criação dos Comitês de Conformidade em todos os Negócios (no mercado são conhecidos como comitês de auditoria) também reforça a transparência na condução dos negócios. A elaboração e implantação de uma Política sobre Conformidade, que traz regras claras sobre o relacionamento da empresa com fornecedores, clientes, agentes públicos, patrocínios e contribuições políticas é também uma medida concreta para tornar transparente sua atuação empresarial. (Link do estudo – http://www.transparency.org/whatwedo/publication/transparency_in_corporate_reporting_assessing_emerging_market_multinat )

Apesar da reconhecida competência tecnológica, ainda há receio de contratação dos serviços da empresa por medo de ligação com a investigação?
A Odebrecht considera natural o impacto das investigações sobre os negócios. Mas está consciente de que cumpriu o seu dever ao fazer a colaboração definitiva com a Justiça, apresentando relatos e provas de como se processam as relações entre empresas privadas e agentes públicos. A empresa confessou os crimes cometidos. Pediu desculpas públicas e pagará pesado por isso. Tirou de sua gestão nada menos do que 77 executivos, que por sua vez pagarão multas e cumprirão penas. A empresa não sairá impune. Pagará a mais alta multa já aplicada em todo o mundo em Acordos de Leniência. O que está em jogo no momento e causa impacto nos negócios é a indefinição de instituições públicas como TCU, CGU e AGU sobre a legitimidade de um Acordo de Leniência assinado pela empresa com o Ministério Público Federal e já homologado pela Justiça dos Estados Unidos. Hoje, por conta desse acordo, a Odebrecht já está habilitada a participar de qualquer licitação do governo americano ou de qualquer negócio dentro dos Estados Unidos. No Brasil, a disputa de protagonismo e mesmo a imprecisão ou contradição de leis atrasam a volta das empresas lenientes às suas atividades normais e à geração de emprego e renda.

No início, os funcionários demonstraram um grande apoio à empresa. Como está essa situação agora?
O ambiente interno na Odebrecht é positivo: as pessoas estão engajadas, motivadas e convictas da necessidade do processo de transformação e patrocinam plenamente as medidas que estão sendo adotadas. Essa percepção é comprovada por pesquisa conduzida pelo Reputation Institute. Em outubro de 2016, foi realizada a primeira pesquisa com o público interno, que contou com a participação de 7.912 integrantes. O questionário reuniu 27 indicadores alinhados à cultura e ao propósito do Grupo Odebrecht. O índice ponderado da reputação entre os integrantes foi de 63 pontos, considerado mediano e positivo em relação ao contexto daquele momento.

Além da Odebrecht Ambiental, quais são os outros ativos que a Odebrecht decidiu colocar à venda? O Grupo pretende ficar mais enxuto?
A Odebrecht S.A avança em seu plano de alienação de ativos, reestruturação de dívidas e fortalecimento da estrutura de capital de alguns de seus Negócios. O objetivo é garantir liquidez financeira diante da prolongada crise econômica brasileira e da instabilidade de alguns setores onde atua, como o sucroalcooleiro e óleo e gás. Uma das ações deste plano é a venda de ativos avaliados em aproximadamente R$12 bilhões. A conclusão da venda da Ambiental, juntamente com o contrato assinado com alguns dos maiores bancos brasileiros, permitindo o uso do valor da venda (R$ 2,5 bilhões) em capitalização de empresas do grupo, afastou fantasmas e deu um alivio de pelo menos dois anos no caixa da Odebrecht. Por sua vez, a Odebrecht Latinvest, empresa que consolida concessões no Peru e na Colômbia, firmou acordo de venda de 57% da concessão rodoviária Rutas de Lima, no Peru, para a gestora global de ativos Brookfield. Com a conclusão da venda, a Brookfield assumiu a posição de sócia majoritária com 57%, enquanto a Odebrecht Latinvest passou a ter 25% das ações e a Sigma permaneceu com 18%. Em novembro do ano passado, a Odebrecht Latinvest fechou acordo de venda de 100% da Concessionaria Trasvase Olmos S.A. (CTO) e H2Olmos S.A., concessões do Projeto Olmos de irrigação no Peru, à Brookfield Infrastructure e à Suez. Além disso, no Peru estão à venda também participações no Gasoducto Sur Peruano e na hidrelétrica de Chaglla. Em outra ponta, foi concluída a negociação para fortalecimento da estrutura de capital da Odebrecht Agroindustrial, braço sucroalcooleiro do grupo. A dívida da empresa era uma das maiores dentre os Negócios do Grupo, causada pelo longo período em que o preço da gasolina esteve represado, resultando em danos competitivos ao etanol. A reestruturação contemplou a capitalização da empresa, pela Odebrecht S.A., de aproximadamente R$ 6 bilhões: R$ 2 bilhões por meio da integralização dos ativos de energia renovável e R$ 4 bilhões em aporte financeiro, sendo R$ 2,5 bilhões destinados exclusivamente à redução imediata do endividamento da Odebrecht Agroindustrial, adequando a alavancagem à geração de caixa da própria empresa. A iniciativa reforça a clara confiança da Odebrecht no setor e no papel primordial do etanol como fonte renovável para a matriz energética brasileira. Odebrecht Energia, por sua vez, anunciou também a venda da Odebrecht Energias Alternativas, que detém o Complexo Eólico Corredor do Senandes, localizado no município de Rio Grande (RS), para o Grupo NC. A venda ocorreu após a construção e implantação do Complexo, possibilitando capturar os ganhos de um ativo já em fase 100% operacional, após investimento da ordem de R$ 400 milhões. A Odebrecht Energia segue em negociação com alguns grupos empresariais dentro de processo competitivo para a venda de participação de 28,6% – sendo 18,6% diretos e 10% por meio do fundo FIP Amazônia – na empresa Santo Antônio Energia. O Grupo Odebrecht ainda busca compradores para uma usina hidrelétrica e negocia a venda de participação em um bloco de petróleo em Angola, entre outras operações em andamento. A Odebrecht ficará sim, mais enxuta, mas com maior higidez financeira, inclusive para enfrentar turbulências no cenário macroeconômico brasileiro.

Quais foram as consequências da Operação Lava Jato para os negócios? Quanto o Grupo perdeu em receitas? Quanto aumentou o endividamento?
A Operação Lava Jato permitiu à empresa passar a limpo a sua história e recomeçar a sua trajetória em novo patamar, em que repudia qualquer forma de corrupção. Se ao participar de futuras licitações públicas perceber vícios ou tentativas de corrupção, não hesitará em fazer denúncia. Uma das medidas do impacto da Lava Jato e também da crise econômica é a redução do número de empregados no grupo, em todos os países em que atua. Caiu de 180 mil empregados em 2014 para 75 mil este ano. O endividamento, por sua vez, não aumentou. Ao contrário, diminuiu. A dívida líquida consolidada do grupo caiu para R$ 76,3 bilhões em junho de 2016, sendo que 65% já estava equacionada na época.