A Defensoria Pública de São Paulo ajuizou hoje (28) um conjunto de habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do estado (TJ-SP) em favor de 30 mulheres acusadas criminalmente de terem praticado aborto, sob o argumento da inconstitucionalidade dessa criminalização.

A Defensoria pede o arquivamento das ações penais em curso pelo crime tipificado no artigo 124 do Código Penal – provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque –, além de abarcar todos os processos identificados no estado entre os anos de 2011 e 2016.

De acordo com a defensora pública Ana Rita Prata, como a pena máxima para o crime é de três anos de detenção, os casos, em regra, culminam com a suspensão do processo, sob condições como comparecimento periódico à Justiça, o que as mulheres acusadas, em geral, aceitam. No entanto, alertou a defensora, a consequência disso é que os processos acabam sem discussão sobre a constitucionalidade da criminalização ou a ilegalidade das provas obtidas.

Além disso, em cerca de metade dos casos, há a nulidade dos processos criminais, devido à violação do sigilo profissional por agentes de saúde, que denunciam as mulheres depois de as atenderem por complicações decorrentes do aborto.

Inconstitucionalidade

A argumentação se baseia em um habeas corpus julgado em novembro de 2016 no qual a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por maioria de votos, que a criminalização do aborto até o terceiro mês de gestação é inconstitucional. De acordo com a decisão, a criminalização nesse período fere direitos sexuais e reprodutivos, o direito à autonomia, a integridade física e psíquica, bem como o direito à igualdade.

A decisão do STF, usada como precedente neste caso, aponta que: “A tudo isto se acrescenta o impacto da criminalização sobre as mulheres pobres. É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbito”.

A Defensoria acrescentou que a criminalização do aborto é incompatível com a Constituição de 1988, especialmente no princípio da dignidade da pessoa humana, do qual deriva o direito à autodeterminação sobre o próprio corpo.

“Também aponta que a criminalização viola diversas outras previsões constitucionais, como os direitos à inviolabilidade da intimidade e da vida privada e ao livre planejamento familiar, bem como a natureza laica do Estado brasileiro e o princípio da intervenção penal mínima”, destacou o órgão em nota.