Fundada em 2010, em Pequim, pelo empreendedor chinês Lei Jin, a Xiaomi conseguiu em apenas oito anos alcançar a quarta colocação do mercado global de smartphones, atrás apenas da coreana Samsung, da americana Apple e da conterrânea Huawei. Essa façanha foi alcançada com o apoio de muitos recursos de fundos de private equity, que aportaram US$ 3,4 bilhões na companhia. Entre eles estão a empresa russa de investimento DST Global, o fundo de Cingapura GIC e a chinesa Yunfeng Capital. Agora, a Xiaomi se prepara para dar um novo e ousado passo. A companhia informou, na semana passada, que vai abrir o seu capital na Bolsa de Hong Kong até junho deste ano, no que pode ser o maior IPO de uma empresa de tecnologia desde 2014, quando a chinesa Alibaba fez sua oferta na Bolsa de Nova York (Nyse), captando US$ 25 bilhões. O objetivo é levantar US$ 10 bilhões. Se alcançado, a empresa passaria a valer US$ 100 bilhões.

Não foram apenas os recursos bilionários de fundos de private equity que ajudaram a Xiaomi a se destacar no cenário global de smartphones. A companhia é considerada a Apple da China, por desenvolver produtos com design muito parecido com os da companhia de Steve Jobs (1955-2011). O fundador Lei Jin também imitava o criador do iMac, iPod, iPhone e iPad. Em suas apresentações de produtos, ele usa calça jeans e camiseta preta, figurinos tradicionais de Jobs. Os consumidores da marca, chamados de Mi fãs, em referência ao nome dos smartphones, também eram convocados para participar de lançamentos, assim como acontecia nos principais eventos da empresa de Cupertino, na Califórnia.

Com a abertura de capital, os números financeiros da Xiaomi passaram a ser conhecidos. E eles não são ruins. A companhia faturou US$ 18 bilhões em 2017, uma alta de 67,5%. Apesar de ter reportado um prejuízo de R$ 6,9 bilhões, o resultado não chega a ser decepcionante, pois esteve relacionado com a recompra de participações de outros investidores. O lucro operacional, que está diretamente ligado ao negócio, foi de US$ 1,9 bilhão no ano passado. Para os analistas, esse desempenho é a prova de que a Xiaomi afinal se recupera do baque de 2015, quando caiu do posto de primeira fabricante da China para o quarto lugar, sendo destronada pelas conterrâneas Huawei, Vivo e Oppo – hoje, ela está apenas atrás da Huawei em seu país de origem.

Essa queda deve-se à primeira tentativa de internacionalização da empresa. Em setembro de 2013, o brasileiro Hugo Barra deixou o Google, onde comandava a divisão dos sistemas operacionais Android, para assumir a vice-presidência internacional da Xiaomi. Seu objetivo era abrir mercados fora da China para a companhia de Jin. A empresa chegou a operar em 20 países, entre eles o mercado brasileiro. Mas não conseguiu sucesso em poucos. “Eles eram novos na arena internacional”, afirma Tina Lu, analista da Counterpoint Research.

Aposta: o brasileiro Hugo Barra foi contratado pela Xiaomi para levar a marca para outros países, mas sua estratégia falhou (Crédito:Justin Sullivan/Getty Images/AFP)

Apesar de não ter sido bem-sucedida em sua primeira empreitada internacional, o avanço para outros mercados é essencial para os planos da Xiaomi. “A China trouxe crescimento, mas o plano é ampliar as vendas na Europa e mercados em desenvolvimento como África e América Latina”, diz Tina. Hoje, 70% da receita da companhia vem de vendas em seu país de origem. E, apesar de tímidos, a Xiaomi já coleciona alguns sucessos internacionais. Na Índia, por exemplo, a empresa ultrapassou a Samsung, assumindo a liderança do mercado. Na Rússia e Ucrânia, a companhia figura entre as cinco principais marcas. Na semana passada, ela fechou uma parceria com o conglomerado de Hong Kong CK Hutchinson para distribuir smartphone na Europa, a começar pela Inglaterra.

Mas tudo isso pode ser pouco. “Com algumas exceções, as empresas chinesas não parecem compreender os mercados ocidentais”, diz Rob Enderle, CEO do Enderle Group. E a Xiaomi deverá ter dificuldades principalmente no maior deles, os Estados Unidos. O plano é chegar na terra do Tio Sam até o começo de 2019. Um problema é que as agências de inteligência americanas – como FBI e NSA – já alertaram os consumidores a não comprarem celulares de fabricantes chineses. Sem contar, o crescente protecionismo do governo Trump contra as empresas asiáticas. Por isso, a estratégia de Lei Jun pode precisar excluir os Estados Unidos por enquanto.