A inflação voltou às manchetes. No Brasil, a variação de preços em 12 meses medida pelo IPCA, que baliza as metas de inflação do Banco Central (BC), supera 12%. Nos Estados Unidos, os preços ao consumidor subiram 8,3% nos 12 meses até abril, nível mais elevado em 41 anos. A inflação esteve fora do noticiário por muito tempo. O que mudou agora?

Nos anos 1980, a imprensa brasileira associou a persistente alta de preços à imagem de um dragão. A criatura era uma representação precisa do problema: praticamente indestrutível e capaz de causar uma devastação de grandes proporções. Isso mudou a partir dos anos 1990. O Plano Real estabilizou os preços no Brasil, mas o fenômeno de “desinflação” foi global. A conjunção entre os ganhos de produtividade decorrentes do uso da tecnologia e a redução de barreiras comerciais devido à globalização fez com que os preços de alimentos, bens de consumo e energia permanecessem baixos por décadas. Como resultado, houve um enorme efeito riqueza. Os mercados acionários bateram recordes sucessivos. Porém, essa onda de prosperidade está em vias de acabar.

A justificativa é uma alta estrutural dos preços da energia e um refluxo na globalização econômica. Em parte, isso é por acidente. A pandemia provocada pelo coronavírus desarticulou várias cadeias produtivas. O melhor exemplo foram os problemas das empresas taiwanesas para fornecer chips, que travaram a produção de automóveis mundo afora. Outra parte desse refluxo globalista, porém, foi deliberado. “Há um esforço recente dos governos para internalizar as cadeias produtivas e reduzir a dependência estratégica de outros países”, disse o Chief Investment Officer (CIO) da gestora de recursos Alphatree, Rodrigo Jolig. “Isso reduz as economias de escala e eleva os preços em toda a economia.”

Daniel Teixeira

“As missões dos Bancos Centrais serão mais difíceis, pois será preciso subir os juros para conter a inflação” Rodrigo Jolig, Chief Investment Officer da gestora Alphatree.

Há outros problemas. Nos últimos anos, a valorização dos mercados acionários e dos imóveis gerou um efeito riqueza nos países desenvolvidos. Com isso, mais pessoas sentiram-se financeiramente seguras para deixar de enfrentar o mau humor do chefe e se aposentaram. Isso tornou os trabalhadores mais escassos. O estrategista-chefe da Levante Corp., Gabriel Floriano, diz que “a oferta de mão de obra também se reduziu porque muitas pessoas ou ficaram impedidas de buscar trabalho devido às medidas de restrição, ou não tinham com quem deixar os filhos”. Segundo ele, esse efeito está se dissipando com o retorno das atividades econômicas e com a queda recente das ações. “Mas ainda vai levar algum tempo para a situação voltar a níveis parecidos com os anteriores à pandemia.”

ESTRATÉGIA Nesse cenário, como defender seu dinheiro? Segundo Jolig, da Alphatree, processos inflacionários tendem a corroer o ganho das aplicações de renda fixa no médio e no longo prazos. Assim, ele recomenda orientar os investimentos para a parte real da economia. “Por exemplo, ações de empresas no Brasil e no exterior que produzam materiais básicos”, disse ele. Outra alternativa é escolher aplicações indexadas em países onde os bancos centrais têm sido mais assertivos no combate à inflação. Um bom exemplo é o BC brasileiro, um dos primeiros a elevar os juros. “E quem não quiser ter trabalho deve optar por fundos multimercados cujos estatutos permitam aos gestores ser ativos em assumir posições compradas e vendidas em bolsa e em câmbio”, disse ele. Sem isso, seu dinheiro será incinerado pelo dragão.