O banqueiro Daniel Dantas tem um plano. Ele quer, nos próximos anos, comandar um império de telecomunicações ? o único grupo nacional que sobreviverá à briga de foice pela telefonia no continente. Conhecido como um sujeito que tem idéias por atacado, faz amizades nos lugares certos com logística de franqueador e ganha dinheiro em escala industrial, ele vem preparando os movimentos do seu grupo, o Opportunity, como num jogo de xadrez. Na semana passada ele revelou a um amigo que está comprando duas empresas de telefonia em países vizinhos. As negociações já estão avançadas, em fase de discussão de preço, e Brasília, já informada sobre suas intenções, deu o sinal verde ? o que pode significar até uma mãozinha oficial. Sua idéia é ganhar escala e mostrar ao mercado (onde circulam boatos sobre sua saída da Brasil Telecom) que ele está mais vivo que nunca. A tacada vem no momento em que o consórcio tenta fechar a aquisição da CRT, empresa de telefonia fixa da região de Porto Alegre. E depois do anúncio de um investimento de US$ 100 milhões, com a canadense TIW, numa empresa de Internet para celular. Para triunfar, porém, Dantas tem de superar uma guerra aberta com os sócios da Telecom Itália e até uma investigação da Anatel sobre uma suspeita de participação irregular na Telemar, do Rio de Janeiro.

O mercado fala há semanas sobre as investidas do Opportunity fora do País. As apostas dos especialistas se concentram em algumas companhias sabidamente à venda. A primeira é a Movicom, que opera a telefonia celular do Uruguai. Hoje ela é controlada pela BellSouth, que está louca para ir embora e chegou a oferecer a companhia ao grupo gaúcho RBS. Outra é a colombiana ETB, que controla a telefonia fixa na região de Bogotá e nas 14 maiores cidades do país. Ela deveria ter sido privatizada em maio, mas o processo, como de costume, atrasou. Em Buenos Aires, a France Telecom dá sinais claros de que está disposta a vender sua participação na Telecom Argentina. Mas ali há um obstáculo: o outro sócio é a Telecom Itália, com quem o Opportunity vem vivendo às turras em seus negócios brasileiros.

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O confronto com os italianos pode ser a batalha decisiva no jogo de War do Opportunity. As duas empresas, sócias na Brasil Telecom, começaram a se estranhar no ano passado. Os pequenos desentendimentos em reuniões de diretoria logo se transformaram em guerra aberta. No início do ano, o consórcio tinha um contrato de preferência para a compra da Vicom, uma empresa especializada em redes corporativas e Internet em alta velocidade, setores fundamentais para a estratégia de Dantas. Os italianos, porém, vetaram a operação ? e a Vicom foi vendida à Globocabo. A confusão do momento envolve a compra da gaúcha CRT, em poder dos espanhóis da Telefónica. O Opportunity fez um estudo e concluiu que o negócio valia US$ 730 milhões. Alguns dias depois dessa avaliação, a CRT divulgou números de desempenho que poderiam até puxar esse preço para baixo. Os italianos, porém, atropelaram os sócios e fecharam um acordo prévio no valor de US$ 850 milhões. O presidente da Brasil Telecom, Henrique Neves (indicado pelo Opportunity), tentou reverter a situação. Enviou uma carta à holding da Telecom Itália para negócios no Exterior, pedindo que desse uma garantia, ?responsabilizando-se financeiramente? pelo preço recomendado. Recebeu uma carta de uma diretora, Giulia Nobili, que não topou. Imagine-se qual será o clima na assembléia geral da BR Telecom, convocada para a próxima sexta-feira para discutir a proposta de compra.

Quebra de pratos à parte, os envolvidos na negociação têm certeza que a compra da CRT vai sair. É que, apesar do clima belicoso, não interessa a Dantas romper com os italianos. Tanto que, para fazer as pazes, ele acionou dois amigos influentes ? o publicitário Mauro Salles, especialista em fazer o meio de campo em negociações espinhosas, e o embaixador do Brasil em Roma, Paulo de Tarso Flecha de Lima. Se a operação panos quentes der certo, ele poderá continuar contando com a Telecom como aliada para a ?segunda onda? de novidades na telefonia. Em 2003 será encerrada a quarentena estabelecida durante o processo de privatização. Não haverá mais restrições para compra e venda de empresas de acordo com a região, e companhias estrangeiras que estavam fora do País poderão entrar livremente. Os analistas acreditam que, a partir daí, espanhóis, italianos e brasileiros poderão fazer ótimos negócios ? vendendo suas operações ou associando-se a americanos, ingleses ou alemães.

O avanço sobre o flanco da telefonia é apenas uma das manobras da legião de Dantas. A outra é o ataque à Internet, por enquanto feito através do iG, um portal com 700 mil usuários, e da criação de uma empresa de Internet para celular. O banqueiro montou um escritório no Silicon Valley, na Califórnia, com 20 funcionários, para fazer acordos tecnológicos ? há mais de vinte em negociação, da área de Internet em banda larga até a de sistemas de segurança para transações pela rede. Os próximos passos do iG incluem a criação de portais no Exterior ? um em Portugal, outro para brasileiros que moram nos Estados Unidos. No caminho, porém, ainda há uma série de obstáculos. A Anatel, agência federal que regula as telecomunicações, abriu um procedimento administrativo para investigar a suspeita de que o Opportunity teria comprado da Inepar, do Paraná, uma participação no consórcio Telemar. Se a operação existir e for considerada ilegal, o banco terá de desfazê-la. Seria a primeira batalha perdida por Dantas nessa campanha.