Um piscar de olhos. Ao ler essas quatro palavras, você provavelmente piscou seus olhos, o que demorou um décimo de segundo, ou 100 milissegundos. Nesse curto intervalo de tempo, um computador de uma corretora instalado a poucos metros do computador central da Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) já fez dez negócios. Essa nova forma de operar exige computadores cada vez mais rápidos e poderosos, que suportem milhões de transações.

 

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No limite, esse sistema poderia ter de fechar  252 milhões de negócios por dia. Parece muito? Na BM&FBovespa, as transações são feitas a cada dez milissegundos. Nesse tempo, na Bolsa de Nova York, um computador de um fundo americano teria processado 100 ordens de compra e de venda, que poderiam movimentar alguns bilhões de dólares em um piscar de olhos.

A demanda por agilidade é tamanha que, para poupar tempo, os computadores dos fundos ficam ao lado dos da bolsa. No caso da BM&FBovespa, cinco corretoras já instalaram seus servidores no centro de São Paulo. “Cerca de 60 podem instalar seus computadores aqui”, diz André Demarco, diretor de operações da BM&FBovespa.

A questão é: será que os computadores suportam tantas operações? Independentemente da chegada dos investidores de alta frequência, a bolsa vem apresentando problemas. O sistema GTS, que suporta as transações dos contratos futuros, parou por mais de uma hora no início de junho, levando à ampliação do horário de negociação por mais de uma hora.

“Falhas acontecem por diversas razões”, afirma Demarco. Ele contesta a informação de que os sistemas da bolsa estariam mostrando sinais de fadiga de material. “As falhas não são recorrentes. São episódios isolados”, diz ele. “Não é possível dizer que a vinda de investidores de alta frequência tenha provocado esses problemas.”

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É verdade. No entanto, mais de um profissional de uma corretora de valores tem se queixado de falhas no sistema da bolsa. Eles avaliam que a vinda dos investidores de alta frequência vai aumentar exponencialmente as necessidades de processamento de dados. “A integração dos sistemas da Bolsa de Valores e da Bolsa de Mercadorias e Futuros está demorando demais”, diz um diretor de uma tradicional corretora paulista.

Mais do que isso, um dos pilares da estratégia da bolsa é a popularização do mercado, elevando o número de investidores pessoa física dos atuais 550 mil para cerca de cinco milhões em cinco anos. Outra demanda que se coloca a médio prazo é o plano estratégico de transformar o Brasil em um polo financeiro regional, competindo por transações de países da América Latina que podem migrar para Nova York ou Chicago. “As corretoras latino-americanas não vão vir para cá atraídas pelo charme da mulher brasileira”, ironiza o diretor de uma corretora. “Elas vão querer preço e agilidade.”

Há mais um problema. Essa estrutura de negócios aumenta exponencialmente a dependência de sistemas e computadores e todos eles são passíveis de falhas. Operando a essa velocidade, pequenos erros podem assumir proporções catastróficas. Um bom exemplo aconteceu no início da semana nos Estados Unidos. Na sexta-feira 25 de junho, as ações da Boeing fecharam a US$ 68,77.

No início dos negócios no pregão eletrônico da segunda-feira 28, o sistema de um fundo colocou ordens de venda a US$ 38,77, uma queda de 44%. O movimento provocou muita confusão no mercado e diversas ordens de compra e venda tiveram de ser anuladas. “É um exagero dizer que esses sistemas de negociação são uma caixa-preta, mas é quase”, diz Rodrigo Menon, sócio da consultoria Beta Advisors. “A dependência da capacidade dos profissionais que programam as ordens é gigantesca.”

Demarco diz que o processo de unificação dos sistemas de negociação está dentro dos prazos e deverá estar concluído em 2012. Segundo ele, quando isso ocorrer, os sistemas permitirão a realização de transações em dois ou três milissegundos, a mesma velocidade dos negócios em Nova York, e a capacidade de processar transações será multiplicada por quatro. “Estaremos prontos para competir em pé de igualdade com os melhores mercados do mundo”, diz ele. Enquanto isso não ocorrer, a BM&FBovespa estará – literalmente – correndo contra o tempo.