O nome é imponente. Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. Editada no dia 30 de abril, a Medida Provisória nº 881 é ambiciosa. Sua meta é tornar o ambiente de negócios do Brasil mais parecido com o dos países desenvolvidos. Essa mudança é bem-vinda. Lá fora, quem decide sair da zona de conforto e empreender é tratado com reverência. Tem linhas de crédito específicas nos bancos. Conta com incentivos fiscais e facilidades burocráticas para não ficar pelo caminho nos primeiros tempos. Além disso, se tiver de recorrer a uma recuperação judicial ou a uma falência, isso não representa uma sentença de banimento do mundo dos negócios. Já no Brasil…

Por aqui, o empreendedor é olhado de esguelha. É visto como um inadimplente em potencial pelos bancos, que são avaros na concessão de crédito e vorazes na cobrança de tarifas. É considerado, pelo Fisco, um sonegador à espera da oportunidade de sonegar, pois não tem nenhuma facilidade na hora de registrar sua empresa nas várias esferas do poder público. E não consegue sorver uma gota de refresco ao lidar com a papelada. Não é possível registrar um contrato social sem recorrer aos serviços de advogados e contadores, os únicos capazes de enfrentar as bizantinices da lei.

A exceção é o micro empreendedor individual. Porém, como ele está impedido de contratar mais de uma pessoa, essa situação faz com que ele seja mais um trabalhador autônomo com CNPJ do que um empresário. Sua condição, inclusive, funciona como um desestímulo ao crescimento da atividade. Fossem as únicas dificuldades, a situação seria suportável. Superados os trâmites iniciais, era só lançar mãos à obra. O problema é que o empreendedor que busca atuar de acordo com as normas tem pela frente um pântano regulatório. “Muitas vezes, o empresário depende da vontade do burocrata, e não há uniformidade nas decisões”, diz a advogada Marina Procknor, sócia do escritório Mattos Filho. Isso provoca insegurança jurídica, torna o ambiente de negócios mais inóspito e faz as empresas morrerem precocemente.

A MP traz várias mudanças, todas bem-vindas. Uma das principais é a desconsideração da personalidade jurídica. Em português: se uma companhia tiver problemas, eles poderão afetar, no máximo, os bens da empresa, não os do empresário — exceto em caso de fraude. Outra mudança é que a vontade das partes vai prevalecer nas relações contratuais. Assim, se duas empresas contratarem algo lícito, esse contrato terá força de lei, ainda que não haja uma regra que defina a atividade. Finalmente, haverá a uniformização das decisões burocráticas e a dispensa de alvarás para atividades consideradas de baixo risco.

O escopo da MP é amplo. Seu texto altera dois artigos da Constituição e muda leis que foram promulgadas entre 1946 e 2016. Ao espanar sete décadas de normas jurídicas, a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica vai provocar um pequeno terremoto, reacomodando várias placas tectônicas de jurisprudência. Apenas no Mattos Filho há um comitê de dez sócios para estudar quais serão as repercussões no dia a dia. E a conversa vai longe.

Em geral, a notícia é positiva. Porém, estamos no Brasil. Por isso, é preciso esperar para ver se a nova regra vai pegar ou se, como muitos empreendedores, vai ficar pelo caminho logo no começo.