Das características típicas de garoto ela só tem o nome. Uma das últimas grandes empresas nacionais do setor de alimentos do País, a Chocolates Garoto é uma senhora companhia. Principalmente agora. Dois anos depois de atravessar uma grave disputa familiar e reestruturar toda a sua gestão, encontra doces motivos para comemorações. Em 2000, inaugurou a era de parcerias com fabricantes como a Grain Mills e a Leites Paulista para ingressar em novos segmentos, volta a exibir números azuis ? o lucro previsto para este ano é de R$ 14 milhões, contra o prejuízo do ano passado, de R$ 5 milhões ?, está ampliando as suas fronteiras com a expansão das exportações e prevê saltar de um faturamento de R$ 460 milhões, em 1999, para R$ 600 milhões em 2000. Portanto, graças à combinação de uma marca forte, saúde financeira e um parque industrial moderno, a empresa é cotada entre investidores e consultores internacionais como uma das mais cobiçadas do mercado brasileiro. Todas essas qualidades enchem os olhos de americanas como a Mars e a Hershey, por exemplo, que já colocaram na mesa as suas propostas. ?Faz parte da rotina dos executivos da Garoto receber visitantes internacionais interessados em adquiri-la?, conta um empresário que preferiu não se identificar. ?Somos a única no mercado de chocolates 100% brasileira, mas não estamos à venda?, garante o diretor comercial Ubiracy Fonseca.

Apesar da recusa, o assédio pode ainda se intensificar. Depois de ter sido chacoalhada em 1998 por uma inesperada mudança nos rumos de sua gestão, a Garoto ganhou força. ?A marca foi reposicionada e se valorizou?, avalia o consultor Carlos Pelicer. Mas, o que mudou na administração da companhia que nasceu de uma fabriqueta de balas fundada pelo imigrante alemão Henrique Meyerfreund? O filho do fundador, Helmut Meyerfreund, 65 anos, que durante 26 anos comandou a empresa, foi substituído, há cerca de dois anos, pelo sobrinho, o jovem Paulo Meyerfreund, 30 anos. Embora ocupando a posição de membro do Conselho de Administração, Helmut já não faz parte do dia-a-dia dos negócios. Participa, com certa regularidade, das reuniões que ocorrem a cada dois meses para definir as linhas mestras da estratégia da companhia, mas não lembra nem de longe o senhor louro de olhos azuis que trabalhava vigorosamente das sete da manhã até tarde da noite e costumava ser visto em conversas informais com consumidores. Introvertido, o atual presidente é conhecido como um homem discreto e pouco afeito a movimentações sociais.

Para tocar os negócios nessa nova fase, Paulo cercou-se de profissionais experientes. Contratou Alais Valentini, ex-Lacta, como gerente de marketing; buscou também na Lacta Ricardo Martinez, para assumir a gerência de produtos sazonais; trouxe o ex-Arcor Carlos Verçoso para a área de desenvolvimento de produtos e importou Guilherme Buarque Goulart, com passagens pela Arisco, Phillip Morris e Coca-Cola, para a gerência de produtos. A partir do final de 1998, diversas mudanças foram implementadas. A começar pela distribuição. A Garoto criou uma rede própria, com 37 filiais, que se comunicam com mais de 200 mil varejistas via satélite ou por meio de visitas pessoais. ?Assim, podemos atender ao pequeno varejo, hoje responsável pela considerável fatia de 35% de nossas vendas?, lembra Fonseca. Além disso, a Garoto caminha em direção à Internet. Tem um portal institucional, mas já alimenta planos para desenvolver um programa de business to business. ?Ainda não sabemos quando, mas temos consciência de que isso é irreversível?, comenta o gerente Goulart. A velocidade no lançamento de produtos aumentou. Até 1998, o mercado conhecia, por ano, de uma a duas novidades com a marca. ?Hoje, estamos lançando cerca de oito produtos anuais?, diz Fonseca.

Para agilizar os lançamentos, a Garoto partiu para alianças estratégicas. Como no caso dos achocolatados (pó e líquido). Fechou contrato com a Cinalp, que fabrica há 11 anos as marcas próprias do produto em pó para redes como o Carrefour, Pão de Açúcar, Extra e Makro. Na área de achocolatado líquido, escolheu a Leites Paulista. Batizados de Garotada, os dois novos itens chegam às gôndolas em novembro, batendo de frente com nomes tradicionais como o Nescau, da Nestlé; o Toddy, da Quaker, e o Mágico, da Arisco. Também formalizou acordo com a Grain Mills para produzir os confeitos da Garoto.

Toda a estratégia parece estar dando certo. As vendas para o mercado externo cresceram tanto que a Garoto abriu escritórios nos Estados Unidos e na Argentina. Até o final do ano, os produtos da marca deverão atingir 42 países, contra os atuais 35. Hoje, as exportações representam 13% do faturamento, mas a empresa quer mais: até 2005 deverão responder por 30%. No front interno, a companhia também saboreia o gostinho da vitória. Vem conquistando ? mesmo que lentamente ? participação de mercado. No início da década de 90, a companhia alternou a liderança no setor com Nestlé e Lacta, mas, entre 1996 e 1997, perdeu espaço, passando de 30% para 20% do total de chocolates vendidos no Brasil. Na última medição da AC Nielsen, instituto de pesquisa, veio a boa notícia: seu pedaço se ampliou para 22,5%. Lacta ainda é líder, com folga, com 33,8%, e a Nestlé responde por 30,4%. Mas, a Garoto avança, com a vitalidade de um menino e a experiência de uma senhora de 71 anos.