A invasão russa ao território ucraniano na quinta-feira (24) teve impactos em diversos setores da economia mundial. E o mercado financeiro não passou incólume. O segmento de criptomoedas registrou queda acentuada após o início dos ataques, e a situação levantou novamente o questionamento de até que ponto esses ativos, mais especificamente o Bitcoin, podem ser considerados reservas de valor. Criada em 2008 e comercializada a partir de 2010, a moeda ganhou a alcunha de ouro digital, numa comparação ao metal precioso. Porém, bastou o início da guerra para a tese ser colocada em xeque. O Bitcoin despencou 11% no primeiro dia de conflito, enquanto o elemento dourado apresentou alta de 4%.

+ Bolsonaro evita falar de economia e incomoda a Faria Lima. Entenda

Se considerados os últimos 30 dias, quando começou a crescer a tensão entre ucranianos e russos, o Bitcoin apresentou perda de 3,25% do valor. Já o ouro acumulou alta de 4,75%. O especialista Jhonatan Hoff, professor de Contabilidade e Finanças da Fipecafi, evita comparações e diz ser impossível classificar a criptomoeda como reserva de valor, por não atender a alguns pré-requisitos, como proteção ao investidor. Primeiramente da inflação. “Tem que ser uma moeda que mantenha o poder de compra e que proteja o investidor da volatilidade do mercado”, disse, para dar um exemplo em seguida: “quem comprou Bitcoin há seis meses, perdeu mais de 50% do seu patrimônio. Quem comprou ontem (24), hoje (25) já teve ganho de mais de 15% (chegou 16%). Essa volatilidade, principalmente no curto prazo, nos impede de classificar o Bitcoin como uma reserva de valor.”

A principal diferença entre o ouro e a criptomoeda, na visão de Hoff, é o fato de o metal possuir lastro em um ativo, o que não ocorre com o Bitcooin, visto como um “ativo usado basicamente para especulação.” Além disso, o ouro não costuma ter grande variação no preço e quando ocorre, normalmente é acima da inflação. “Temos grande reserva de ouro no mundo. A quantidade disponível é muito maior do que a de Bitcoin.” Apesar disso, o especialista afirmou ser possível que as criptomoedas sem tornem, dentro de cinco a dez anos, uma reserva de valor. “Para isso, no entanto, terá que ser uma moeda regularizada. reconhecida pelos governos, além de ser aceita em escala como forma de pagamento e recebimento, o que é bastante limitado hoje.”

O impacto da volatilidade das criptomoedas ficou evidente diante da perda de capitalização do mercado total no primeiro dia de guerra. Despencou de quase US$ 1,75 trilhão na quarta-feira, antes do início do conflito, para US$ 1,58 trilhão na quinta-feira. Na visão de Diego Velasques, consultor financeiro e criador do Vela Trader, as incertezas no mercado frente a picos de pânico e crises provocam venda de ativos e saída de posições. “Tudo que gera incerteza no mercado acaba influenciando as criptomoedas. As pessoas enxergam como oportunidade de operar vendido e ganhar em eventual queda, dando ainda mais pressão na força vendedora”, disse. Na sexta-feira (25), o mercado já havia apresentado recuperação – o Bitcoin chegou a operar com alta de 16%.

E O FUTURO?
O especialista Jhonatan Hoff afirmou ser difícil mensurar qual será o impacto do conflito nos investimentos, tanto em criptomoedas quanto nos demais. No entanto, destacou que a Rússia e a Ucrânia estão entre os maiores mineradores de criptomoedas no mundo. Devido às sanções financeiras impostas aos russos por causa da invasão, uma das possibilidade é que os investidores recorram ao Bitcoin como uma estratégia de movimentar dinheiro entre países. “E temos também o cenário de aumento da inflação global. Há uma pressão para que a taxa de juros nos países aumente, principalmente nos Estados Unidos. Com isso, há uma chance de as pessoas começarem a migrar os investimentos para àqueles mais tradicionais, mais seguros e que estão oferecendo um retorno maior por causa do aumento da inflação e da taxa de juros. Isso, sim, pode impactar as movimentações das criptomoedas. Mas fica difícil prever algo”