Naturalmente voláteis, as criptomoedas têm apresentado oscilações acima do habitual nas últimas semanas, e iniciaram o segundo trimestre de 2022 em uma franca tendência de baixa. Na quarta-feira (6) o bitcoin rompeu um suporte importante e foi negociado abaixo de US$ 44 mil, indicando haver espaço para novas quedas. Diversos indicadores técnicos do mercado confirmam que a paisagem do bitcoin e de outros criptoativos está sendo dominada pelos “ursos” — investidores que esperam e ganham com a baixa dos preços.

Um desses indicadores é o Índice de Medo e Ganância (Fear & Greed Index) calculado pela plataforma americana de distribuição de soft- ware e análise de mercado Alternative.me. Esse índice calcula sete indicadores, que vão desde o volume de negócios das criptomoedas até as menções a elas nas redes sociais, para medir o ‘sentimento’ do mercado. Nada de emoções aqui: ‘sentimento’, neste caso, é apenas a probabilidade estatística de os investidores venderem (por preverem quedas e terem medo) ou comprarem (por anteciparem altas e estarem gananciosos).

Nos primeiros dias de abril o índice revelou que o sentimento era Medo Extremo, indicando uma propensão forte a vender. O índice vai de 0 a 100. Quanto menor o número, mais profundo o medo, e o índice inaugurou abril a 23 pontos.Outro indicador foi o prêmio pago nas operações com derivativos de bitcoin.

De novo, parece complicado, mas é muito simples. Um investidor pode comprar um bitcoin hoje e enfrentar as quedas ou comemorar as altas. Ou pode, por meio de um derivativo, assumir o compromisso de comprar esse mesmo bitcoin no futuro. A diferença entre os preços no mercado a vista e no mercado futuro é chamada, informalmente, de prêmio do bitcoin.

Segundo o analista e operador de criptomoedas Marcel Pechman, esse prêmio tem oscilado entre 5% e 12%. Quanto mais elevado, mais forte o movimento comprador. Em fevereiro o prêmio recuou abaixo de 5%. Recuperou-se parcialmente em março, mas iniciou abril ao redor de 6%, o que também mostra um mercado vendedor. Ou ‘bearish’, para permanecermos nas imagens de touros e ursos.

JUROS O que vem justificando essa mudança de humor é o endurecimento da política monetária americana. Na quarta-feira (6), o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, divulgou as Minutas de sua reunião de meados de março, em que elevou os juros nos Estados Unidos pela primeira vez desde 2019. Além de confirmar as expectativas de que o Fed pretende elevar os juros mais depressa do que os especialistas vinham esperando, o texto — equivalente à Ata das reuniões do Copom — trouxe outra preocupação ao mercado.

Rememorando, brevemente. Há cerca de dois anos, em março de 2020, o Fed começou a comprar, todos os meses, US$ 120 bilhões em títulos públicos e hipotecários no mercado. A intenção era colocar dinheiro vivo nas mãos dos bancos para estimular empréstimos e manter a economia em funcionamento. Esse programa durou até o fim de 2021, e fez com que a carteira de títulos do Fed inflasse de US$ 4,1 trilhões no começo da pandemia para US$ 9 trilhões atualmente. A diferença é dinheiro em circulação na economia mundial.

A injeção de recursos manteve girando as rodas dos negócios, mas fez os preços dispararem. A inflação americana está em seus níveis mais elevados em 40 anos. Para atacá-la, o Fed vai passar a tirar dinheiro do mercado, enxugando US$ 95 bilhões por mês. A liquidez mais estreita tornará os investidores mais seletivos. Assim, ativos mais arriscados e alternativos como as criptomoedas terão menos combustível para subir.

Além da esperada escassez de dinheiro, outro fator para a baixa é a pressão das autoridades para disciplinar esse mercado. Criptomoedas são disruptivas para a economia, pois seus usuários são capazes de fazer transações à revelia das autoridade e dos bancos centrais. O incômodo é crescente, assim como a severidade governamental e regulatória. Há casos extremos, como o da China, onde as autoridades proibiram a mineração e as negociações com criptomoedas, para estimular o uso do renminbi digital, emitido pelo Banco do Povo, o BC chinês. Nos Estados Unidos e nos países da União Europeia as medidas são mais brandas, mas suficientes para desestimular os investidores em busca de algo alternativo. Ou seja, menos demanda — e mais peso do lado dos ursos.