Após dois anos e meio de espera, dezenas de crianças, reunidas em um pátio com muros crivados de balas, se matriculam na escola de um bairro de Mossul recentemente arrebatado ao grupo extremista Estado Islâmico (EI) pelas forças de segurança iraquianas.

“É um grande dia. Hoje garantimos o direito de nossos filhos a receber educação”, afirma Ghasan Ahmed, ao lado do seu filho de sete anos, que nunca foi à escola.

Ahmed, que é professor da Universidade de Mossul, não quis que seus filhos comparecessem às aulas dadas pelos jihadistas.

“Ficaram em casa e eu mesmo os ensinei as matérias oficiais do governo iraquiano”, explica.

Em frente ao colégio, uma casa incendiada faz lembrar que há apenas algumas semanas o bairro de Muharbin era um campo de batalha.

“Os jihadistas a queimaram para que a fumaça impedisse que fossem vistos pelos aviões”, conta Mohamed, de nove anos.

Assim como outras 250 crianças, Mohamed volta ao colégio pela primeira vez desde que o EI tomou o controle da cidade, em junho de 2014.

Ele diz que está impaciente para ir às aulas, embora por enquanto o colégio não tenha água corrente nem eletricidade, e os livros não tenham chegado.

“Estou supercontente de poder estudar de novo! Quero ser médico”, diz com um sorriso. De repente, escuta-se uma explosão perto dali. Mohamed não se perturba, e vai brincar com seus amigos.

“O ensino não pode esperar. Deve ser uma prioridade”, afirmou à AFP Maulid Warfa, diretor do escritório da Unicef em Erbil, capital do Curdistão, a região autônoma curda no norte do Iraque.

“Construir nosso futuro”

“Muitas crianças de Mossul viram muita destruição e mortos”, disse Warfa. “As escolas podem ser uma ferramenta para curá-los aos poucos dos traumas sofridos”.

Na parte leste da cidade de Mossul, arrebatada ao EI durante uma ofensiva lançada pelas forças iraquianas em 17 de outubro, 30 escolas reabriram nesta semana e mais de 16.000 crianças estão matriculadas, segundo a Unicef. Outras 40 serão reabertas nas próximas semanas.

Mas o grupo extremista continua controlando o oeste da cidade, onde vivem ao menos 300.000 crianças, segundo a ONG Save the Children.

Warfa confia em que haverá “um restabelecimento completo do sistema educativo” nos próximos meses. “É um desafio enorme”, reconhece.

Haider Adnan, de 18 anos, espera na sala do diretor, com a matrícula em mãos. Veio para “continuar vivendo”. Quer terminar seus estudos para ir à universidade. É um dos poucos estudantes desta escola do bairro de Zuhur que assistiu aos cursos dos jihadistas do EI.

Adnan está cansado de ter que estudar a vida de Osama bin Laden, de Abu Musab al Zarqaui (ex-líder da Al-Qaeda), ou do autoproclamado “califa” Abu Bakr al Bagdadi. O que quer é “aprender história, geografia e a verdadeira religião”.

“A história é importante porque é a vida dos meus antepassados. Como viveram, como evoluíram”, explica o jovem. A história “é uma lição para aprender a construir nosso futuro”, acrescenta.