O ano de 2001 não acaba sem que o francês Crédit Lyonnais volte a ter um banco em funcionamento no Brasil. A instituição, encolhida mundo afora por uma megacrise provocada pelo acúmulo de créditos ruins na matriz, em meados da década passada, renasceu após um penoso processo de reestruturação e privatização, em 1999, e escolheu o Brasil para iniciar uma nova onda de expansão. A abertura de um banco com sede em São Paulo é o primeiro investimento do Crédit Lyonnais fora da França desde o fim do inferno astral do grupo. Excluída do sistema bancário nacional desde que vendeu o antigo Banco Francês e Brasileiro (BFB) ao Itaú, em 1996, a instituição volta decidida a fazer tudo diferente desta vez. Banco de varejo, agora, só na França. A nova subsidiária brasileira vai ser uma instituição de atacado, assim como demais projetos futuros no exterior, e terá foco somente em negócios com grandes empresas.

Parte da diferença de atitude decorre da agressividade que o banco aprendeu a ter após sua privatização. Controlado há dois anos por um grupo de bancos e seguradoras europeus formado pelos franceses Crédit Agricole e Axa, os alemães Allianz e Commerzbank, o espanhol BBVA e o italiano Intesa, o novo Crédit Lyonnais, privado, quer sobretudo ter rentabilidade alta. Menos que 15% ao ano, se ocorrer, será considerado um fracasso. O diretor presidente indicado para a instituição no Brasil, Alexander Rabinowitz, diz que o objetivo é ficar na casa dos 20% a 30%. Para garantir um desempenho neste nível, o banco se recusa a entrar na briga para comprar instituições e conquistar fatias do mercado a qualquer preço. ?Não vamos comprar market share. O que nos interessa é retorno?, enfatiza. Para isso, o banco vai se concentrar em negócios do tipo que gera receita com comissões. A concessão de crédito, tradicional na prateleira do banco, vai continuar disponível, mas a instituição espera ganhar mais dinheiro com administração de recursos, montagem de projetos de finanças corporativas e prestação de serviços de mercado de capitais.

Estrutura mínima para dar partida no País o Crédit Lyonnais já tem. A placa está instalada desde o fim de março em cinco andares de um novíssimo prédio na região paulistana dos Jardins, próximo à avenida Paulista. Neles trabalham já cerca de 60 pessoas, parte delas remanescente dos antigos tempos do BFB. A administração de recursos está em pleno funcionamento, usando a autorização legal de uma financeira que o BFB controlava, e tem R$ 700 milhões sob gestão. O escritório de representação que o Crédit Lyonnais mantém desde que se tornou um sem-banco, em 1996, carrega uma carteira de 300 das maiores empresas que operam no País. Os créditos repassados por meio do braço do grupo em Nova York somam hoje US$ 800 milhões. Clientes globais do banco continuaram recorrendo ao escritório mesmo após a venda do BFB. É o caso dos grupos franceses Usinor, EDF e Aerospaciale, que foram orientados pelo Crédit Lyonnais em aquisições no País, e da Airbus, que recorreu ao banco para montar um pacote de crédito e fazer sua primeira venda de aviões no Brasil.

A abertura de um banco por aqui servirá sobretudo para que a instituição consiga atender seus clientes em uma variedade maior de serviços. ?Trabalhar um pedaço da operação e ver os outros fazerem o resto é frustrante?, diz Rabinowitz, em referência a negócios que o Crédit teve de repassar nos últimos cinco anos por falta de um veículo legal para oferecer o serviço dentro de casa. As áreas de tesouraria e mercado de capitais, no novo banco, farão pouco investimento próprio e serão voltadas à realização de negócios para clientes.

Criar um banco a partir da estrutura já montada ou comprar uma pequena instituição já existente é uma decisão que o Crédit Lyonnais tomará de acordo com as oportunidades que aparecerem. ?Ficamos surpresos com a quantidade de bancos que nos procuraram se oferecendo para a venda?, conta Rabinowitz. Seja qual for o caminho, o patrimônio inicial será de US$ 40 milhões a US$ 60 milhões, que o banco francês ainda vai trazer para o País. Pelo menos nos primeiros anos, a subsidiária será a única em toda a América Latina ? o banco já chegou a ter filiais espalhadas por Argentina, Chile e Venezuela, entre outros. A crise da década passada obrigou a instituição, então estatal, a se desfazer de todos esses braços. Caíram na época filiais também em economias mais ricas, como a do Canadá, mas o Crédit Lyonnais ainda não voltou para nenhuma delas.