Parece notícia do ano passado, mas é de agora mesmo. O avanço da variante Delta do coronavírus voltou a tirar o sono — e a vida — de pessoas no mundo todo. Considerada a mais transmissível de todas até agora, a cepa tem aumentado os casos de contaminação mesmo em locais em que a pandemia parecia estar sob controle e com vacinação em estágio avançado. A doença está derrubando principalmente pessoas que se recusaram a tomar a vacina ou que, em número muito menor, não geraram imunidade para a nova mutação do Sars-Cov2. E não são nações miseráveis, mas sim países como Estados Unidos, Holanda e Suécia. O próprio presidente do Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos, Jerome Powell, alertou cidadãos e investidores que é muito cedo para afirmar o quanto a economia americana irá sentir o avanço da nova variante. “Ainda não está claro se a tensão da variante Delta terá efeitos importantes sobre a economia”, disse. “Teremos de ficar atentos e cautelosos quanto a isso.”

A cautela e a preocupação têm razão de existir. Em solo americano, o caos da pandemia voltou com força na Flórida, o mais latino e visitado dos 50 estados do país. Em tom de apelo, o prefeito Jerry Demings, de Orange County, onde fica Orlando, afirmou que desde o começo de agosto “o vírus voltou a ser uma ameaça significativa” para a comunidade. Pela segunda semana consecutiva, a Flórida tem sido responsável por um em cada cinco novos casos de Covid-19 nos Estados Unidos. A maioria desses novos casos, segundo Demings, é registrada entre pessoas não vacinadas.

A declaração acabou com a brincadeira da cidade que abriga o maior complexo de parques do mundo, entre eles os da Disney e os da Universal Studios. Sem medo do impacto econômico na indústria do turismo local, Demings compartilhou no portal Disney Food Blog a informação de que o condado vem registrando quase 1 mil novos casos por dia. “Esses são os números que vimos no pico mais alto no ano passado”, disse o prefeito. “O que em 2020 demorava um mês para registrarmos, hoje vemos diariamente. Estamos em modo de crise.”

SONHO AMERICANO Após comemorar o fim do uso de máscaras em locais públicos, Joe Biden, presidente dos EUA, precisou retomar parte dos protocolos de segurança. (Crédito:REUTERS/Kevin Lamarque)

Em termos de números recentes, Demings disse que a taxa de positividade contínua em 14 dias de Orange County permanece em dois dígitos. No sábado (21), chegou a 13,96% (quase 14 casos confirmados a cada 100 testes realizados). Há um mês, a taxa era de 4,28%. De acordo com dados de agências federais dos Estados Unidos, 19.983 pessoas estavam (até a terça-feira, 24) internadas em 258 hospitais da Flórida, e apenas 6,9% dos leitos de UTI estão disponíveis. Além disso, pela segunda semana seguida, o Departamento de Saúde do estado relatou mais de 150 mil novos casos.

O problema não se limita ao crescimento dos números, mas na incapacidade de atender a escalada exponencial da demanda. Na sexta-feira (20), a prefeitura pediu aos moradoras a redução imediata no consumo de água pela escassez de oxigênio líquido necessário para o tratamento de pacientes com Covid-19. O prefeito de Orlando, Buddy Dyer, chegou a pedir à comunidade e às empresas que evitem regar gramados e lavar veículos por pelo menos uma semana. “É outro resultado do que acontece quando os moradores não são vacinados e ficam gravemente doentes e precisam de tratamento e apoio médico urgente”, disse Dyer.

EUROPA Assim como na Flórida, as variantes do coronavírus preocupam países europeus. No Reino Unido, no início de julho, a média móvel era de 16 novos óbitos. Na primeira semana de agosto, esse número chegou a 90. Dados do governo britânico concluíram que a Delta é de 40% a 60% mais contagiosa do que a variante Alfa, originada na Grã Bretanha. Um estudo de julho feito por pesquisadores ligados à OMS e ao Imperial College, de Londres, mostrou que a Delta é 97% mais transmissível do que o coronavírus original, identificado na China.

66% foi a alta no número de casos apurados na Holanda com variante da Covid apenas na primeira semana de agosto

Esse resultado explica o avanço da doença na Suécia. Com 13 mortes por dia (dois por milhão), quase o dobro da média mundial, o país reassumiu a liderança no número de mortes por Covid-19 a cada 100 mil habitantes entre os escandinavos (Dinamarca, Finlândia, Islândia e Noruega), que adotaram medidas mais rígidas desde o início, e apresenta uma taxa de mortalidade que é mais do que o dobro da média mundial.

Na Holanda, o número de infecções diárias disparou 66% na primeira semana deste mês, após o fim das restrições e do uso obrigatório de máscaras em ambientes fechados. A incidência está principalmente em pessoas de até 30 anos, cuja vacinação ainda está em andamento e muitos receberam apenas a primeira dose. São mais de 1,5 mil notificações registradas diariamente, cerca de 566 casos a mais que a média da semana anterior. Em todo o mundo, o temor de uma terceira onda já deixou o plano lúdico das ideias e se tornou um problema real.