O pesquisador João Paulo Gomes defendeu que a linhagem BA.2 da variante Ômicron do coronavírus SARS-Cov-2, que poderá ser dominante em Portugal, deveria ser classificada como variante de preocupação pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Numa intervenção nas Jornadas de Atualização em Doenças Infecciosas do Hospital Curry Cabral, que decorrem em Lisboa, o pesquisador do Instituto Nacional de Saúde (INSA) explicou que a sua opinião está alinhada com a da comunidade científica em geral.

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Em declarações aos jornalistas, o microbiologista explicou que, desde o início se percebeu, olhando para o ‘cocktail’ de mutações, que “é difícil perceber como se pode considerar a BA.2 como uma irmã da BA.1, porque têm muitas diferenças”.

“Eu diria que a única grande semelhança que tem é um elevadíssimo número de mutações quando comparadas com todas as outras variantes”, disse o coordenador do estudo sobre a diversidade genética do SARS-CoV-2 em Portugal.

“Na proteína Spike, as duas linhagens têm uma dezena de mutações que são compartilhadas, razão que teria levado a OMS a dizer que é tudo Ômicron, definindo várias linhagens (BA.1, BA.2 e BA3), mas uma análise mais minuciosa mostra que têm muitas mutações que não são compartilhadas. A BA.1 tem 11 mutações que não são compartilhadas com a BA.2 e a BA.2 tem sete ou oito que não são compartilhadas com a BA.1. Tudo somado, elas têm mais diferenças do que semelhanças e foi isto que motivou a comunidade científica a torcer o nariz a esta classificação da BA.2 como Ômicron”, revelou João Paulo Gomes.

Na terça-feira (22), a OMS considerou que, com base nos dados disponíveis de transmissão, gravidade, reinfecção, diagnóstico, terapêutica e impacto nas vacinas, a BA.2 deve continuar a ser considerada uma variante de preocupação e deve permanecer classificada como Ômicron.

O pesquisador do INSA disse ainda que os dados epidemiológicos mostram inequivocamente que a linhagem BA.2 está substituindo a BA.1 porque é mais transmissível, estimando que dentro de duas semanas passe “a dominar completamente”.

Em Portugal, disse João Paulo Gomes, “a BA.2 já terá ultrapassado os 50% dos casos esta semana e se a taxa de crescimento se mantiver nos 3%, 4% por dia será uma questão de semanas até atingir os 80, 90%”.

“Portugal, Reino Unido, Noruega, Suécia, Suíça e Alemanha estão seguindo o mesmo caminho e estamos todos com prevalências da BA.2 entre os 30% e os 50%”, sendo “pouco expectável” que alguns destes países sigam um caminho diferente.

João Paulo Gomes destacou ainda dados de um estudo “muito robusto” realizado por pesquisadores japoneses, cujos dados ainda estão em revisão por pares, em ratos e modelos celulares que foram utilizados para caracterizar a Delta e a BA.1.

“Os resultados obtidos tiveram reflexo na realidade humana, ou seja, verificou-se que podiam ser traduzidos na infecção clínica no ser humano”, explicou, adiantando que esses resultados “não são muito animadores porque mostram que além de a BA.2 ser mais transmissível, mostrou uma maior patologia nos ratinhos infectados e que os anticorpos gerados pela infecção com a BA.1 não eram eficazes para evitar a infecção com a BA.2″.

Esta situação, segundo o pesquisador, levanta uma questão em relação à vacina monovalente que está sendo desenvolvida por algumas farmacêuticas contra a BA.1 no sentido de perceber até que ponto pode ser eficaz, tendo em conta que estes estudos apontam que não será.

Nessa perspectiva, a comunidade científica considera que seria prudente considerar a BA.2 não como uma linhagem da Ômicron, mas como uma variante de preocupação eventualmente com uma letra grega associada à mesma, concluiu.