Termina nesta sexta-feira, 23, o prazo para mudanças no edital da maior licitação de produtos e serviços de Internet já realizada no Brasil ? o do projeto Telecomunidade. Lançado no ano passado pelo Ministério das Comunicações, o projeto pretende conectar à Internet nada menos do que 13 mil escolas, que atendem um universo de 7 milhões de alunos. O custo desse salto ? que praticamente duplicará o número de usuários da Internet no Brasil ? é de cerca de R$ 1 bilhão, a serem gastos em dois anos. Como era de se prever, existe polêmica em torno de como esse dinheiro será gasto e sobre quais as empresas que se beneficiarão das encomendas. O governo, alegando pressa em reduzir o abismo digital brasileiro, não envolveu na discussão do projeto os produtores nacionais de programas e os acadêmicos da área tecnológica, que têm interesses concretos no assunto. Na semana passada, os dois grupos mobilizavam-se para tentar incluir no edital alguma forma de privilégio às empresas e soluções brasileiras.

?Temos medo que os termos técnicos do edital acabem favorecendo empresas multinacionais de software, em prejuízo da indústria brasileira?, afirma Ernesto Haberkorn, fundador da Microsiga e presidente da associação das empresas brasileiras de software e serviços, a Assespro. Existe entre empresários e pesquisadores, por exemplo, a sensação de que a Microsoft pode emplacar o seu Windows como o programa básico das escolas públicas brasileiras, acarretando, de um lado, custos elevados com licenças e, de outro, a formação de uma geração inteira de estudantes em um padrão de tecnologia controlado com mão de ferro pela Microsoft. O professor Silvio Meira, um dos animadores do bem-sucedido projeto pernambucano do Porto Digital, lembra que existem alternativas técnicas ao Windows que são gratuitas ? como o Linux ? e abertas a inovações e alterações técnicas. ?Se o governo chegar à conclusão de que o melhor é usar o Windows, deveria pelo menos condicionar essa decisão ao compromisso da empresa em investir em pesquisa e desenvolvimento no Brasil?, diz Meira.

Na área de equipamentos não há polêmica porque não existem empresas nacionais aptas a concorrer. A Compaq tem esperanças de conseguir um pedaço da encomenda, estimada em 260 mil PCs. Além deles, estão na lista de compras do Telecomunidades 42 mil impressoras, 15 mil scanners e 30 mil hubs (que interligam os computadores). Outra grande porção do edital refere-se à prestação de serviços. As operadores de telefonia fixa irão disputar o tráfego e as 13 mil conexões de Internet. ?Queremos ser os provedores de equipamentos e serviços de suporte para esse projeto?, afirma Carlos Breto, diretor de vendas corporativas da Compaq. A aspiração na área de software é semelhante. Das 5 mil empresas brasileiras, 80% são de pequeno porte – ou seja, dependem de um apoio para crescer. ?Pode chamar de reserva de mercado, mas não há nada de errado em dar algum incentivo à indústria nacional?, afirma Haberkorn, da Assespro. ?Não pense que a gente consegue vender programas para o governo americano.?