O economista Bernard Appy já se reuniu com representantes de todas as candidaturas à Presidência – quando não com o próprio candidato, com o assessor econômico mais próximo. Seu objetivo: apresentar sua proposta para unificar ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI em um único imposto, simplificando o sistema tributário brasileiro. Dos principais candidatos, apenas Jair Bolsonaro (PSL) não incorporou alguma das ideias de Appy.

O programa tributário de Bolsonaro, diz Appy, é superficial e não permite uma análise profunda. O do PT, apesar de menos genérico, tampouco traz grandes explicações. Após ter sido secretário de política econômica do Ministério Fazenda nos governos petistas, o economista diz que seria “pouco provável” voltar ao governo e destaca que qualquer candidato terá de controlar os gastos e reformar a Previdência para evitar um calote da dívida interna ou a explosão da inflação.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Os candidatos nas primeiras colocações nas pesquisas, Bolsonaro e Fernando Haddad (PT), desautorizaram seus economistas – Paulo Guedes e Marcio Pochmann, respectivamente – nas últimas semanas. É possível traçar um paralelo entre as campanhas sob esse ponto de vista, de falta de entendimento em relação aos programas?

Durante a campanha, a tendência é que os candidatos sejam genéricos em suas propostas. É o que estamos vendo. Não tenho como comentar questões internas das campanhas.

Esse não é um momento em que os projetos econômicos deveriam estar mais definidos?

O que tem acontecido é que alguns assessores têm falado questões que não estão nos programas de governo. Isso tem gerado ruído.

Apesar dos programas genéricos, é possível imaginar como seria economicamente o governo desses candidatos?

Não consigo saber, mas acho que há um consenso sobre o que deve ser feito. Não tem nenhum economista que faça contas que ache que não precisa de uma reforma da Previdência. A trajetória fiscal é insustentável se não se reverter o crescimento da despesa obrigatória. Qualquer candidato que queira ter governabilidade vai tomar uma medida em relação a isso. A agenda fiscal é para o Brasil não entrar em crise. Se tiver uma crise, será de explosão da dívida pública, que tem duas consequências possíveis: um calote da dívida interna ou uma explosão da inflação.

O sr. disse que os programas são superficiais. O debate eleitoral em relação à economia também é?

A compreensão do que precisa ser feito está muito mais clara do que alguns anos atrás. Ainda há posições que são estritamente ideológicas, mas, no agregado, há uma percepção melhor do que deve ser feito. Estive no governo de 2003 a 2009 e hoje tenho mais clareza do que precisa ser feito. O tempo passa e a gente aprende.

O que o sr. não achava que tinha de ser feito, mas agora acha necessário?

Por exemplo, claramente acho que tem de ter controle de expansão de gasto público.

Um teto dos gastos?

Não necessariamente esse que está aí, mas precisa ter um teto. Naquela época, isso era menos claro. Eu gostaria de algum modelo (de teto) que protegesse um pouco mais os espaços para investimentos e o custeio mínimo do governo.

O sr. tem apresentado seu projeto tributário a todos os candidatos. Houve um alinhamento maior com algum deles?

Quem tem feito menção explícita ao nosso trabalho é o Geraldo Alckmin (PSDB) e a Marina Silva (Rede). Embora, o Ciro Gomes (PDT) e o Haddad também tenham incorporado propostas semelhantes a nossa.

As propostas dos candidatos na área tributária, principalmente de Bolsonaro e Haddad, são exequíveis?

No caso do Bolsonaro, o programa é absolutamente genérico. Não tem como comentar. Tem a ideia do imposto de renda negativo, que é, via imposto de renda, fazer transferências para as populações de baixa renda. É interessante, mas incompatível com a proposta dele de elevar a isenção de imposto de renda. São propostas inconsistentes. No caso do Haddad, o programa é muito mais detalhado, mas não se explica como tudo vai ser feito. E, em tributação, muitas vezes, o diabo mora nos detalhes.

O discurso do PT mudou após Haddad assumir a candidatura? Há um tom mais favorável ao mercado?

Só acho que a experiência do Haddad na prefeitura foi positiva do ponto de vista fiscal. Existem, no PT, linhas mais intervencionistas, e acredito que o Haddad seja menos intervencionista, sem perder foco na distribuição de renda.

O sr. já fez parte do governo do PT e tem um perfil mais reformista. Seu nome tem sido citado como o de alguém que poderia fazer parte de um governo Haddad. Aceitaria?

Não fui procurado por ninguém. Neste momento, seria pouco provável que aceitasse por razões pessoais e do trabalho que estou desenvolvendo. O que não significa que não pudesse ajudar, não necessariamente de dentro do governo. Na área tributária, as propostas do CCiF se dispõem a ajudar todo mundo, quem quer que seja eleito. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.