O Congresso prevê uma temporada de atritos com o Planalto após a esperada aprovação da reforma da Previdência, no segundo semestre, se o presidente Jair Bolsonaro não mudar o jogo com os parlamentares. Alvo de ataques em redes sociais bolsonaristas e em manifestações de rua, como as de domingo, políticos de vários partidos avaliam que o governo não terá votos suficientes para tirar do papel os seus projetos e só não enfrentará um “apagão legislativo” porque há uma agenda pós-Previdência construída pela cúpula da Câmara e do Senado.

Tudo o que tem a digital do Planalto é visto com ceticismo pelo Congresso. Pouco antes dos seis meses de mandato, completados nesta segunda-feira, dia 1º, Bolsonaro mexeu na articulação política do governo, que agora será comandada pelo general Luiz Eduardo Ramos, mas nem mesmo o anúncio da troca serviu para apaziguar os ânimos.

Ao participar no domingo do ato em apoio ao ministro da Justiça, Sérgio Moro, à Lava Jato e à reforma da Previdência, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) disse que “todas as vezes que esse Congresso aprontar” haverá protestos no País. “E, se for preciso, a gente propõe uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para reduzir o número de parlamentares”, discursou o filho “03” do presidente.

Moro prestará depoimento nesta terça-feira, 2, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara sobre troca de mensagens atribuídas a ele, quando era juiz, com procuradores da Lava Jato. O conteúdo das conversas foi publicado pelo site The Intercept Brasil. O pacote anticrime de Moro é hoje uma das medidas que podem enfrentar retaliações no Congresso.

Pelas contas do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o Planalto não terá votos para aprovar projetos relevantes, após mexer nas regras da aposentadoria. “Depois da reforma vai ser muito difícil unificar Câmara e Senado com esse modelo”, disse Alcolumbre, em jantar promovido há oito dias pelo jornal digital Poder 360. “No Senado, o governo tem os quatro votos (da bancada) do PSL. Tem que procurar um método de se aproximar da política. A campanha acabou, não dá para ficar incentivando a divisão.”

Alcolumbre vê “muito mais dificuldades” para pautar propostas do Executivo na volta do recesso parlamentar, em agosto, a não ser que elas sejam de interesse dos parlamentares. “Sou do Amazonas. Lá, por exemplo, o cara precisa de arma”, comentou o senador, em uma referência ao controverso decreto editado por Bolsonaro.

Apesar de admitir tropeços do governo na relação com Câmara e Senado, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) disse acreditar que a pressão popular ajudará Bolsonaro a emplacar projetos, como o pacote de Moro, o decreto que amplia o porte de armas e as privatizações. “Aposto na pressão das ruas nas principais pautas”, afirmou.

Clima

O problema é que, passados seis meses de mandato, Bolsonaro não tem um polo de sustentação no Congresso e o clima, ali, continua de divórcio litigioso. “Até agora, nós não sabemos qual é a agenda do governo além da reforma da Previdência”, constatou o presidente do DEM, ACM Neto. Prefeito de Salvador, Neto destacou, ainda, que, diante desse cenário, fica difícil fazer um “prognóstico” sobre votos favoráveis a outras propostas do Executivo. “Ao que tudo indica, o governo fez uma opção clara por não ter uma base”, resumiu ele.

Na avaliação do senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), nada irá para a frente enquanto o Planalto não arquivar as polêmicas com o Congresso nem apresentar medidas concretas. “O que vejo é só discurso. Qual é a agenda? Privatização por acaso é agenda?” Para Cardoso, Bolsonaro não tem plano B, nem C, nem D. “O governo só tem o plano A, que é a reforma da Previdência, mas não abre a caixa-preta da dívida pública.”

Em nova tentativa de se contrapor à “ofensiva” do Congresso e, principalmente, do Centrão, o ministro da Economia, Paulo Guedes, montou uma estratégia para o “day after” da Previdência. Guedes aposta as fichas na reforma tributária que o governo vai apresentar e quer discutir o tema junto com a proposta enviada pelo líder do MDB na Câmara, Baleia Rossi (SP).

“A reforma tributária não é do governo. É uma agenda dos governadores, dos prefeitos e, principalmente, da sociedade, que paga tantos impostos”, disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Foi Maia que pediu a Rossi para encaminhar o projeto que unifica cinco impostos, com base em estudo do economista Bernard Appy.

Com Alcolumbre, Maia prepara um pacote de medidas s e iniciativas que tratam de temas sociais, como segurança, saúde e educação. Estão no radar, ainda, propostas como autonomia do Banco Central, redução da taxa de juros no cheque especial, contrato de cessão onerosa entre União e Petrobrás e novo marco legal de saneamento básico.

Bolsonaro declarou, recentemente, que o Congresso quer transformá-lo em uma “rainha da Inglaterra”, que reina, mas não governa. Após assegurar na campanha que é contra a reeleição, ele admitiu disputar novo mandato, em 2022, caso não seja aprovada “uma boa reforma política”. A que tramita na Câmara prevê mandato de cinco anos e fim da reeleição. No domingo, Eduardo Bolsonaro defendeu limitar o número de mandatos parlamentares. “O Congresso precisa ser oxigenado”, disse. O presidente, porém, foi reeleito seis vezes quando era deputado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.