Na lista de rombos estruturais da economia, o déficit na infraestrutura só perde para o da Previdência em importância. Pelas contas do mercado, seria preciso investir R$ 280 bilhões por ano para sanar as deficiências que atravancam o crescimento, uma cifra que sugere a enorme necessidade por financiamentos. Enquanto o BNDES, tradicional financiador da área, está aos poucos reduzindo sua participação, os instrumentos disponíveis no mercado de capitais ainda se mostram insuficientes para suprir essa lacuna. Os números mais recentes reforçam a tendência. No primeiro trimestre, os empréstimos de longo prazo do banco somavam R$ 248,7 bilhões, volume 6,7% menor do que em igual período do ano passado, quando a cifra chegava a R$ 266,6 bilhões. “O BNDES vem se retirando do mercado, tanto pela mudança nos juros quanto por sua reorientação estratégica”, diz o advogado Alberto Faro, sócio do escritório Machado Meyer, especializado em infraestrutura.

Até 2017, o BNDES concedia empréstimos cobrados pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), ao redor de 6,5% ao ano, ante uma média de 10% ao ano na taxa básica de juros (Selic). Agora, o indexador será a Taxa de Longo Prazo (TLP), que vai ficar em linha com os juros de mercado. “Um empréstimo que custava inflação mais 2% ao ano vai passar a custar inflação mais 6%”, afirma Edson Ogawa, superintendente de project finance do banco Santander.

Outros instrumentos de mercado, como o project finance, um empréstimo cujo pagamento está ligado à geração de recursos do investimento, e as debêntures incentivadas, que são isentas de imposto, ainda não foram capazes de cobrir o espaço deixado pelo BNDES. Segundo a Anbima, associação que representa o setor, o total de project finance foi de R$ 27,2 bilhões em 2015, e caiu 29,8% em 2016, para R$ 19,1 bilhões. Os dados de 2017 ainda não foram divulgados, mas a estimativa de quem trabalha na área é de R$ 15,6 bilhões, uma queda adicional de 18,3%. “A recessão de 2015 e 2016 reduziu o número de projetos apresentados, o que acentuou a queda nos financiamentos”, afirma Rui Gomes, diretor de project finance do Bradesco.

O cenário para as debêntures incentivadas é diferente. Em 2017, segundo a Anbima, foram captados R$ 9 bilhões com esses papéis, um crescimento de 103% ante 2016. Nos quatro primeiros meses deste ano, o total emitido foi de R$ 8 bilhões, quase quatro vezes mais que a cifra do mesmo período de 2017. “O valor ainda é insuficiente para atender a demanda”, diz Faro. Segundo ele, a saída do BNDES está abrindo espaço para outros financiadores, como as agências multilaterais internacionais. “Mas esses financiadores são exigentes quanto à solidez dos marcos legais, o que restringe a participação deles.”


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