Nunca foi tão fácil investir no mercado de ações como agora. Desde que a Bolsa de Valores de São Paulo lançou o sistema de Home Broker, em fevereiro do ano passado, o acesso ao pregão ficou possível para qualquer um que tenha disponibilidade financeira, apetite ao risco e um computador plugado à Internet. Que fique claro: facilidade de apostar, não de ganhar dinheiro. Quando o assunto é segurança, o melhor é buscar outro formato de investimento. É justamente neste momento, de adesão às aplicações de risco, que é possível perceber como no Brasil ainda é forte a presença de investidores que abrem mão de qualquer ganho de rentabilidade para dormir sem medo de perder. Eles preferem continuar confiando seus tostões aos mais tradicionais modelos de aplicação, como no tempo dos nossos avós, como imóveis, jóias e poupança. ?Posso até não estar ganhando muito, mas dificilmente vou perder da noite para o dia?, diz o administrador Fernando Esteves Boccmino. Ele tem apenas 24 anos e é um tradicional quando o assunto é finanças pessoais: todos as suas economias estão na poupança. ?Até já pensei no fundo de renda fixa, mas por enquanto não vejo motivos para trocar.?

Pelos cálculos da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), 37 milhões de pessoas pensam e agem como Boccmino. Isso, mesmo considerando que um fundo de renda fixa teve rendimento médio no ano passado de 17,33%, enquanto a poupança, 8,39%. Há quem saia em defesa e garanta que a decisão dos que mesmo assim preferem a velha caderneta é correta. ?É muito comum comparar rentabilidade da poupança com fundos sem considerar taxa de administração e Imposto de Renda?, explica José Pereira, consultor da Abecip. ?Esses custos não incidem sobre a poupança.? Pereira tem razão. Quem estiver disposto a enfrentar as baixas rentabilidades também vai se beneficiar com a isenção do IOF para aplicações com mais de 30 dias. Trata-se de um benefício que existe justamente para incentivar a aplicação mesmo com a variação abaixo das expectativas.

O que dizer então daqueles que até hoje guardam seu dinheiro, como o Tio Patinhas das histórias em quadrinhos, em ouro. O investimento, no ano passado, teve rendimento de 5,94%, um dos piores entre as aplicações. O advogado Antônio Barbosa, de Curitiba, faz isso todos os meses. Uma parte do seu portfólio tem formato de barras de ouro e está bem guardado num banco. Ele investe assim há mais de cinco anos e justifica: ?Não existe burocracia.? Barbosa não precisa abrir conta corrente e o Imposto de Renda só incide na venda e quando o valor for superior a R$ 5.600,00. ?Aprendi em casa a dar valor ao ouro?, diz Barbosa, que aliás representa a terceira geração da família que investe assim.

Muitas vezes, a herança familiar é determinante na postura de um investidor. Veja o exemplo do empresário João Luiz Miele, um dos fundadores da grife M.Officer. Ele e os dois irmãos criaram a confecção em 1985 e foi envolvido com o mercado de moda que Miele aprendeu a investir em imóveis. ?Começamos aplicando a sobra de capital da empresa?, explica. ?Com o tempo, percebi que o negócio imobiliário tinha muito mais a ver comigo do que a moda e mudei de área.? Hoje Miele não é apenas um investidor. Ele fez dos imóveis seu trabalho. Montou a M5 Engenharia, uma empresa especializada em buscar boas oportunidades de negócios no mercado imobiliário. Pessoalmente Miele não aposta na bolsa por total falta de entusiasmo para o risco. ?Realmente, acho que tenho uma postura tradicional que herdei dos meus pais e quero passar para os meus filhos.?

Um estudo da Jones Lang LaSalle, consultoria imobiliária com escritório em São Paulo, mostra que o motivo que leva alguém a investir em imóvel é a aversão ao risco. Mas Rogério Santos, diretor da Abyara Imóveis, pensa diferente. Para ele, mais que medo do risco, pesa o status. ?Você já viu alguém, por exemplo, dizer que tem tantos mil lotes de ação??, pergunta Santos. ?Mas quantos dizem: tenho tantos apartamentos?? No imóvel, o problema não é a rentabilidade (que varia de 0,8% a 1,2% ao mês) e sim a liquidez. Ninguém vende de uma hora para outra e um erro de avaliação pode comprometer o patrimônio. Mas com certeza não vai virar pó em função de uma aposta errada na bolsa de valores.