Como em todas as comunicações de banqueiros centrais, a mensagem foi sutil. Em uma conferência em Chicago na terça-feira 4, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) disse que as disputas comerciais dos Estados Unidos estão longe de ser resolvidas. “Estamos observando de perto esses assuntos e, como sempre, vamos agir adequadamente para sustentar essa expansão”, disse Powell. Os investidores esqueceram tudo que ouviram, exceto a palavra “expansão”. O resultado foi uma onda de euforia ao redor do globo. Nos Estados Unidos, tanto o índice Dow Jones quanto o S&P 500 fecharam em alta de 2,1%. O Nasdaq, com maior participação de empresas de tecnologia, subiu 2,7%, no que foi o segundo melhor pregão deste ano.

Apesar da euforia momentânea, o cenário geral não dá tanto espaço assim para o otimismo. No longo prazo, as expectativas são de que a temperatura da economia está esfriando ao redor do mundo. Segundo Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da corretora Nova Futura, a inclinação da curva de juros futura nos Estados Unidos está negativa. Em português, isso indica que a expectativa do mercado é que, nos próximos meses, os juros americanos estarão abaixo da faixa entre 2,25% e 2,5% ao ano, estabelecida pelo Fed em setembro do ano passado. “A inclinação da curva futura de juros é um indicador antecedente importante dos ciclos econômicos”, diz ele. “Isso eleva a probabilidade de uma recessão, em um horizonte de um a cinco trimestres.”

As justificativas são muito bem conhecidas. A guerra comercial que Donald Trump iniciou com chineses e, mais recentemente, mexicanos, terá um impacto negativo forte sobre esses dois países. Além disso, a interminável agonia do Brexit piora expectativas, investimentos e desempenho dos países europeus.

Jerome Powell, presidente do BC Americano: menção a corte de juros deixou o mercado eufórico, mas mostra que economia está desaquecida (Crédito:Mandel Ngan / Afp)

A onda de frio na economia americana deve se espalhar. Também na terça-feira 4, o Banco Mundial divulgou a atualização dos prognósticos econômicos para este ano. Na ponta do lápis, a expectativa de crescimento de 2019 caiu para 2,6%, uma queda de 0,3 ponto percentual em relação aos 2,9% esperados no início deste ano. Para 2020, a estimativa permanece inalterada em 2,7%. Isso vale tanto para os países desenvolvidos quanto para os nem tanto (leia mais na entrevista de Julien Marcilly, economista-chefe da Coface, aqui).

EMERGENTES Segundo o relatório, o crescimento nos países emergentes e menos desenvolvidos deve se estabilizar só no ano que vem, à medida que alguns países superarem as dificuldades financeiras que vêm enfrentando neste ano. Porém, o potencial da economia permanece fraco. A situação do Brasil também piorou, segundo o Banco Mundial. A estimativa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro foi reduzida em 0,7 ponto percentual para 1,5%, ante os 2,2% divulgados anteriormemte no relatório de janeiro. A questão, agora, é por quanto tempo os fatores de desaceleração vão influenciar a economia. Até agora, os emergentes vêm sendo afetados por uma retração nos investimentos e pela possibilidade de elevação das barreiras comerciais. “Esses problemas desencorajam investimentos, e podem afetar ainda mais as perspectivas”, segundo o Banco Mundial.

Para os especialistas, não há dúvida de que o longo ciclo de expansão econômica que se iniciou após a crise de 2008 está chegando ao fim. “A pergunta segue a mesma: quais serão os impactos da guerra comercial e eventual fim do mais longo ciclo econômico para as economias globais?”, diz Rafael Bevilacqua, principal executivo da empresa independente de análise financeira Levante. “O importante agora é medir o pulso para saber qual será o nível e ritmo de desaceleração das principais economias.” Qualquer que seja a estratégia, ela terá de enfrentar um clima muito mais frio do que há poucos meses.