O fenômeno inflacionário vivenciado em todo o mundo implica no aumento dos preços de bens e serviços e reduz o poder de compra dos cidadãos. Diversos fatores, entre elas a pandemia causada pela Covid-19 e a guerra na Ucrânia, fazem até as mais sólidas economias passarem um cenário econômico que há tempos não era visto.

Nos Estados Unidos, a inflação atingiu 8,5% em março no acumulado em 12 meses, a maior taxa em 41 anos, segundo o Departamento de Trabalho. No Reino Unido, a inflação anual chegou a 7% em março, máxima desde março de 1992.

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No Brasil, a inflação subiu menos que nos EUA e na Zona do Euro no último ano. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) avançou 5,2 pontos percentuais no acumulado de 12 meses até março. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, classificou como “bastante alta” a aceleração de 1,62% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em março.

Veja a análise de economistas e especialistas sobre a inflação global

André Braz, coordenador do IPC do FGV IBRE

A economia é globalizada. A escalada dos preços dos grãos (soja, milho e trigo) e petróleo afetam todas as principais economias. Além disso, ainda temos gargalos em cadeias produtivas, herdadas da fase mais aguda da pandemia. Tudo isso afeta a disponibilidade e os preços de itens utilizados pela grande indústria favorecendo o aumento dos preços.

Rodrigo De Losso, professor da FEA-USP

Em grande parte, a alta de inflação é resultado das medidas mitigatórias empreendidas durante a pandemia. Mesmo os países com disciplina fiscal forte, caso de países europeus como Inglaterra e Alemanha, o aumento da inflação está ocorrendo. O Brasil é mais vulnerável do ponto de vista fiscal, tem uma população mais vulnerável. Por isso, é necessário enfrentar com as ferramentas que temos: não só aumentar os juros, o que necessário mas insuficiente, mas adotar medidas de contenção de gastos que podem mitigar os efeitos inflacionários imediatamente e ao longo do tempo.

Mauro Rochlin, professor de Economia da FGV

A inflação que aflige a economia brasileira guarda forte relação com o que acontece no mundo todo. A gente vê uma alta muito forte nos preços das commodities, sejam energéticas (petróleo e gás) ou agrícolas (trigo, milho, soja). Tudo isso produz efeito em cascata sobre várias cadeias produtivas. As commodities citadas são estratégicas, com relação com várias cadeias produtivas. Portanto, disseminam o processo inflacionário e, claro, tem reflexos no Brasil. Não é muito diferente do que ocorre nos Estados Unidos, onde a inflação se aproxima dos 9%, com motivos muito parecidos.

Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset

Brasil sentiu a inflação já em 2021 de maneira mais rápida que outros países, mas há um processo global de alta de preços afetando as economias. Boa parte disso deve-se aos estímulos monetários e fiscais para enfrentar a pandemia. Ao mesmo tempo, há um ciclo de oferta comprometido pelas cadeias globais. Há descontinuidade de oferta com uma demanda extremamente aquecida. Soma-se a isso a questão energética, com redução da oferta de petróleo, exacerbada pela guerra. No Brasil, é uma mensagem de que a normalização das cadeias e os choques de vistas no último ano e meio podem demorar mais.

Vinícius Machado, economista e gestor de investimentos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)

A alta de preços no mundo é puxada por commodities depois da retomada da pandemia. A economia do mundo teve uma retomada mais rápida e mais intensa do que muitas empresas e agentes econômicas esperavam. Isso fez com que, de alguma forma, a demanda crescesse mais do que estavam preparados para ofertar. Além disso, as tensões climáticas impactaram fortemente na questão agrícola. Isso fez os preços das commodities e de alimentos subirem antes mesmo da guerra na Ucrânia. Tanto Rússia como Ucrânia são produtores de grãos, em especial trigo.

No caso do Brasil, uma inflação maior teria como lado positivo uma exportação de commodities por um valor maior. Mas, internamente, há peso negativo porque a alta dos preços em uma economia fragilizada faz com que a renda das pessoas diminua porque o salário não cresce na mesma velocidade que a alta de preços. No balanço geral, é um impacto negativo.

Marcos Moraes, Vice-Presidente e CFO da Associação Brasileira de Agentes Digitais

Sendo um fenômeno global, as soluções caseiras têm fraco efeito e passam a depender muito do que acontece mundo. O Brasil precisa ficar atento aos movimentos e espelhar, no que for possível, ações obvias e técnicas como aumentar taxas de juros e neutralizar ações mais políticas que aumentam a especulação. Evitar evasão de grandes fluxos de capital para outros países é um desafio, mas que temos condições de enfrentar.

Renato Santos, sócio da Hand

O atual nível inflacionário dos países desenvolvidos é fruto do desbalanceamento das cadeias produtivas globalizadas causado pela pandemia. O tempo necessário para a normalização varia conforme a cadeia produtiva. Para nós, brasileiros, deve ficar claro que o que passamos não é fruto somente de desajustes internos, mas reflexos da nossa participação na cadeia global de comércio.