O anúncio do projeto do arcabouço fiscal pelo ministro Fernando Haddad, netsa quinta (30), tem gerado dúvidas sobre a equação que o governo federal deve usar para garantir o limite de crescimento de despesas dentro da receita. “A principal questão sobre a nova regra fiscal é a que o seu sucesso depende em grande parte do aquecimento da economia”, diz Caio Ferrari, professor de economia do Ibmec RJ.

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Com a nova regra fiscal, a ideia do governo é zerar o déficit fiscal já em 2024, passar a ter superávit de 0,5% em 2025 e chegar a 2026 com superávit de 1%. Assim, pode tornar real a promessa de Luiz Inácio Lula da Silva (PT): incluir os mais pobres no Orçamento e os mais ricos no Imposto de Renda. Mas o Brasil – entre mercado financeiro, analistas, curiosos e a população como um todo – ainda não sabe como as metas são executáveis.

“São medidas interessantes, mas são ideias: o ministro [Haddad] não apresentou nenhuma medida efetiva, não apresentou cálculo e não apresentou o projeto de lei. As ideias são boas mas precisamos saber se são exequíveis”, afirma Gabriel Quintanilha, professor convidado da FGV Direito Rio.

REFORMA TRIBUTÁRIA – De acordo com Haddad, o caminho proposto anda de forma paralela à Reforma Tributária. Ele não prevê criação de novos tributos ou aumentar os já existentes, mas criar um modelo mais justo e eficiente e corrigir distorções que deixam de fora do sistema tributário muitos que deveriam estar.

“O ponto negativo da proposta de regra fiscal é a necessidade de alta de receitas no cumprimento das metas: se não houver lata de receitas, o governo federal não vai conseguir dar eficácia a esse arcabouço fiscal. E, para isso, certamente ele tem instrumentos para aumentar a arrecadação. Sem sombra de dúvida, o caminho mais fácil é o aumento da carga tributária. É provável que nesse caminho volte ao debate o fim da isenção da distribuição de lucros e dividendos, o que geraria um aumento de receita automático, e é possível que alguns outros tributos possam ser mexidos para que a meta seja alcançada”, avalia o professor da FGV Rio.

Conforme explicou Ferrari, a regra é dependente do bom desempenho econômico, ou seja, a economia cresce, a arrecadação tende a crescer, e os gastos crescem a ritmo mais baixo.

“Se não há aumento previsto na carga tributária, o incremento da receita depende do crescimento da economia. A ideia de ter como objetivo ‘taxar quem não paga impostos’ é uma cruzada contra a sonegação fiscal, mas isso até o momento não está claro como deve ser feito. Além disso, outra possibilidade é regulamentar setores que não pagam impostos, como casas de apostas ou rever incentivos fiscais e subsídios concedidos para diversos setores da economia”, defende.

Quanto deverá ser gerado de receita para que o governo atinja as metas?

O novo arcabouço fiscal prevê mecanismos de ajustes para o governo lidar com as situações adversas e permitir redução da dívida pública. O fato de o aumento da despesa estar limitado a 70% do aumento da receita já, teoricamente, garante uma economia de receita para reduzir o déficit até zerá-lo em 2024.

“O governo federal precisa arrecadar entre R$100 a R$150 bi até o fim do ano para conseguir zerar o déficit em 2 anos. Hoje o déficit está na casa de R$ 230bi. Mas há um fato relevante: a pandemia gerou despesas públicas que não existem hoje. Talvez um aumento de arrecadação simples frente a uma redução de despesas natural que vai acontecer com a retomada da economia e fim da pandemia, teremos chance de resultado fiscal mais eficiente”, explica Quintanilha. 

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