A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de rever as indenizações pagas a anistiados políticos foi classificada hoje, pelo presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, de “grave retrocesso na agenda da transição política”. Abrão defende que o Ministério da Justiça recorra da decisão, que alcança 9.371 processos e cerca de R$ 4 bilhões em benefícios já aprovados em quase oito anos.

“É um grave retrocesso histórico nos preocuparmos com a pauta da retirada de direitos em vez de debruçarmos os olhos para identificar violadores dos direitos humanos”, afirmou Abrão, há pouco mais de três anos à frente da comissão que analisa os pedidos de reparação econômica a perseguidos da ditadura militar.

“Não desejamos que o processo de reparação seja diminuído a uma dimensão contábil; isso seria uma dupla violação às vítimas do regime militar”, completou. A entrevista de Abrão, em sala próxima ao gabinete do ministro da Justiça, foi acompanhada por anistiados. Um deles, Ivan Seixas, vice-presidente do fórum de ex-presos políticos de São Paulo, ganhou o microfone e chamou a decisão do TCU de “manifestação de fascismo”.

Até ontem, a União já havia desembolsado mais de R$ 3 bilhões no pagamento das prestações mensais e parte das indenizações retroativas a 1988 aprovadas. Esse valor não será devolvido, mesmo que parte dos benefícios seja considerada irregular, avalia o procurador do Ministério Público junto ao TCU, Marinus Marsico, autor do pedido de revisão dos benefícios aos anistiados. O tribunal poderá determinar, no entanto, o cancelamento das prestações mensais e dos pagamentos remanescentes da indenização retroativa, explicou.

De acordo com o Ministério do Planejamento, a maior indenização retroativa aprovada foi de quase R$ 3 milhões. Muitas prestações mensais ultrapassam os salários pagos a ministros de Estado e ao presidente da República. A maior se equivale ao teto salarial do funcionalismo, pago aos ministros do Supremo Tribunal Federal: R$ 26.723. Os nomes dos beneficiários não foram divulgados. O ministério alegou sigilo fiscal. Em resposta a Abrão, o procurador Marsico disse que haveria retrocesso histórico caso as indenizações a anistiados não se submetessem às regras do Estado democrático por que lutaram: “Não há motivo para alarme, os benefícios que não contiverem irregularidades serão confirmados”.

Abrão reconheceu que pode ter havido erro na definição de valores da reparação econômica, sobretudo antes da revisão das regras de cálculo, em 2007. A mudança se seguiu a uma primeira auditoria do TCU. “Se houve erro, não precisa o TCU mandar fazer a revisão”, alegou o presidente da Comissão de Anistia. Sobre o caso Carlos Lamarca, apontado como objeto de provável revisão no TCU, Abrão disse que a comissão poderia tê-lo promovido a general. “A comissão fez a progressão a coronel somente nos limites do tempo de serviço”. A viúva teve aprovada indenização retroativa de R$ 902,7 mil mais pagamento de R$ 11,4 mil por mês.

Copyright © 2010 Agência Estado. Todos os direitos reservados.