Quem foi ao posto de gasolina nos últimos dias levou um susto com o preço dos combustíveis, que já vinha em escalada desde o ano passado. O último aumento, no entanto, trouxe à tona a discussão sobre a composição do preço da gasolina e diesel no País.

De um lado está o governo federal, liderado pelo presidente Jair Bolsonaro, considera que a culpa pelo alto valor pago pelos consumidores é da Petrobras. Por outro lado, a companhia tenta seguir a política de preços adotada em 2016 e manter os interesses dos seus acionistas.

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Vale lembrar que a mudança de 2016 veio em um cenário de muita crítica do governo anterior, que tentava controlar artificialmente o preço. Diante deste cenário, foi adotada a política de preços que segue a cotação internacional do petróleo e as oscilações são repassadas aos consumidores, ainda que não em sua totalidade.

“Vários fatores devem ser considerados para a definição do preço final que o consumidor vai pagar. Entre esses elementos estão a cotação do dólar, o preço do petróleo no mercado internacional, o lucro das empresas e os impostos”, explica Samuel Durso, professor e pesquisador da Faculdade Fipecafi Projetos e economista-chefe do Denarius. “O governo cria um discurso para tentar isentá-lo de possível culpa ou responsabilidade ao jogar para os Estados, com o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), e para a Petrobras, por fazer esses ajustes de forma mais constante, o papel de vilões.”

“A culpa está longe (de ser) da Petrobras. Apesar de ser estatal, a companhia tem capital privado e tem que pagar dividendos aos seus acionistas. O valor do petróleo subiu no mercado internacional e vai subir pela Petrobras para vender aqui ou no mercado externo”, alerta Daniel Toledo, especialista em tributação no mercado financeiro. “A culpa é do mercado internacional e da forma como a Petrobras  é conduzida, recebendo capital privado”, complementa.

Rafael Bevilacqua, estrategista chefe da Levante, comenta que o valor pago aqui considera o preço e a cotação do petróleo no mercado internacional, que é dolarizado. No entanto, não há regra clara sobre as datas. Antes era diário, mas devido à alta volatilidade, passou a ser periódico, mas no último aumento demorou cerca de 50 dias para acontecer, mesmo com todas as altas na cotação do petróleo. Para ele, deveria ter algo perto da média e ir ajustando para não ter essa volatilidade. O aumento do preço, destaca o especialista, tem que ser repassado para os clientes para não destruir a empresa, que está ali para gerar valor aos acionistas. E também para evitar problema de abastecimento no futuro. “Precisava ter uma regra, agora cai uma baita pressão do governo para reduzir. Precisava ter algo mais claro, mas não tem”, diz.

Sidney Lima, analista da Top Gain, explica que na precificação final do combustível temos dois principais fatores para a definição do preço: o petróleo, ou seja, a matéria-prima (principal) e os impostos federais e estaduais.

“No Brasil os combustíveis são precificados principalmente pelas refinarias, que, por sua vez, consideram o mercado internacional de derivados do petróleo. Nessa equação entram o preço do barril de petróleo e a variação do dólar. Vale lembrar que parte das despesas pagas pela Petrobras também levam em conta estes dois pontos, principalmente no que tange a compra de alguns insumos e refino do petróleo extraído no país. Daí surge uma grande importância para o caixa da empresa acompanhar a cotação do petróleo para que não ocorra um descasamento entre a receita e despesa da empresa”, explica.

Para Samuel Durso, a guerra é mais um fator para elevar o preço no mercado internacional, mas esse cenário desafiador vem desde o ano passado com uma menor produção pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) do que a demanda. “O governo já tinha que agir porque combustível tem papel fundamental na economia e causa um efeito cascata”, diz o professor ao destacar que os combustíveis tiveram papel importante na alta da inflação do ano passado.

A redução no preço passa por uma série de mudanças estruturais. O primeiro passo foi dado com o aumento da taxa de juros, que ficou mais atrativa para o capital internacional e tende a melhorar o câmbio. Além disso, a venda de reservas em dólar também pode ser mais uma estratégia de curto prazo. “Mas precisamos de mudanças mais estruturais. Na semana passada, foram feitos ajustes na tributação dos combustíveis. A redução do ICMS ajuda, mas não é só ele que causa impacto”, diz Samuel Durso. “Mudanças feitas agora poderiam ter sido feitas antes para que essas políticas fossem reformuladas. Pensar na cadeia para achar soluções, para dar um alívio para consumidor”, avalia.

Outra discussão, conforme afirma o professor, é como pretendemos enxergar a Petrobras: como uma empresa que deve gerar dividendos aos seus acionistas ou uma companhia com papel social porque utiliza recursos naturais e teria que dar uma contrapartida.

Essa contrapartida poderia ser, por exemplo, por meio da política de preços ou ainda pela distribuição de dividendos e a parte destinada ao governo, maior acionista da estatal, poderia ser reinvestida neste processo para tentar minimizar essa exposição que temos na economia. “Além disso, deveríamos ter políticas mais parrudas para reduzir nossa exposição a esses combustíveis até por uma questão de sustentabilidade ambiental”, finaliza o professor.