Os 401 roubos, sendo 46 casos de roubo de veículo e dez de carga, os 28 registros de estupro e os sete assassinatos, sendo um latrocínio, colocaram a cidade de Itanhaém, com 101 mil habitantes, como a mais exposta à criminalidade violenta no primeiro semestre deste ano, de acordo com o índice elaborado pelo Instituto Sou da Paz. O que ajuda a explicar a liderança é que nenhuma outra localidade vai tão mal no Estado em tantos indicadores diferentes quanto Itanhaém.

“É tipo uma Osasco de antigamente”, define a advogada Regina Márcia Cabral Neves, presidente em exercício do Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) da cidade.

Ela divide os bairros da cidade de acordo com características de insegurança. Em um “há muitos assaltos”. Outro é “esconderijo de bandido” e um terceiro tem “estupro de noite e de dia”, diz. “É muita coisa para uma cidade desse tamanho”, acrescenta. Sobre uma quarta região, a advogada diz que é onde estão instalados membros do Primeiro Comando da Capital (PCC).

Não se trata de um exagero retórico. No início do mês passado, a Polícia Civil em Itanhaém deflagrou a Operação Coche, que resultou na prisão de oito pessoas; um nono suspeito é considerado foragido.

Na decisão judicial que iniciou o processo contra os que agora são réus, o juiz Paulo Alexandre Rodrigues Coutinho disse que a investigação teve como foco a desarticulação do crime organizado pelo PCC, que atuava no tráfico de drogas e com transporte clandestino no município.

A investigação, relatou o juiz, mostrou indícios do interesse do crime organizado em apoiar a candidatura de políticos ao cargo de prefeito, “mediante a promessa de arrefecimento da fiscalização ao transporte clandestino na cidade”. Um dos investigados é ex-vereador do município e ex-presidente da Câmara local. A atuação do PCC de Itanhaém no ramo do transporte clandestino repete o que a facção já executa há 20 anos em outras cidades do Estado, incluindo a capital.

“O vínculo entre o segmento empresarial da cidade e o crime organizado é perigoso e nocivo socialmente, pois acaba facilitando de forma exitosa a ocultação de valores auferidos no tráfico de drogas e até mesmo no transporte clandestino”, escreveu à Justiça o delegado da seção de investigação sobre entorpecentes (Dise) da Polícia Civil.

Uma outra dimensão da atuação do PCC em Itanhaém diz respeito ao emprego dos “disciplinas” – criminosos a quem a facção incube a tarefa de solucionar ao seu modo impasses dentro dos bairros. Para a polícia, trata-se de um “poder paralelo ao Estado”.

O motorista Waldomiro Silvério Almeida, de 49 anos, chegava a um supermercado da cidade para realizar uma entrega de uma carga de leite antes das 7h da manhã do dia 8 de maio. Na porta, já o esperavam três bandidos armados. “Um botou a arma na minha costela com força e disse que se eu reagisse ia tomar um tiro. ‘Semana passada já matamos um, vai querer também?'”, contou Almeida ao jornal O Estado de S. Paulo.

Dali, ele foi levado a um cativeiro na cidade, onde permaneceu até o início da tarde. “Depois, me levaram para um matagal e me mandaram ir andando na frente. Achei que eles iam me matar, era muito assustador. Me deixaram junto a uma árvore e disseram que só queriam a carga e que iam devolver o caminhão”, descreve o motorista, que nunca mais viu o veículo.

O caminhão adquirido quatro meses antes ainda estava sendo pago e não tinha cobertura de seguro. Agora, com dificuldade para trabalhar, Almeida vê as prestações serem atrasadas e sujarem seu nome. “Ainda devo R$ 25 mil e estou fazendo bico, mas está difícil arrumar trabalho”, lamenta.

Com ou sem ligação com o PCC, os crimes têm amedrontado os moradores. “Todos estão buscando mudar para apartamento por causa da insegurança. As pessoas têm medo”, conta Regina, cobrando uma melhor interlocução com a polícia local, sobre quem diz não ter a abertura devida mesmo com o cargo no Conseg, cuja premissa é aproximar as demanda dos moradores da atividade policial. “O capitão não me atende. Chama a polícia, dizem que não tem viatura.”

Outro lado

Em nota, a prefeitura de Itanhaém disse desenvolver parcerias com os órgãos de segurança pública, por meio da Guarda Civil Municipal e com o programa Cidade Segura, que possui câmeras de monitoramento distribuídas em pontos de maior movimento.

Os guardas armados atuam em ações de força-tarefa, diz o município, para inibir casos de violência e irregularidades na cidade. “Outro trabalho que também ajuda nas questões de segurança é a eliminação de pontos escuros com a ampliação da rede de iluminação pública nos bairros, que melhoram as condições de visualização e inibem a ação de marginais no período noturno”, declarou.

Sobre o índice, a prefeitura destacou que a região sofre com uma variação sazonal da população, que no verão chega a quadruplicar, o que poderia influenciar o aumento dos dados. A justificativa já tinha sido dada no ano passado, quando a cidade já havia liderado o Índice de Exposição à Criminalidade Violenta (IECV). A nota disse ainda que levantamento da Secretaria da Segurança aponta queda de indicadores no primeiro semestre. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.