Quase 70 mil fãs do rapper Kanye West lotaram o Mercedes-Benz Stadium, em Atlanta, na Geórgia (EUA), na quinta-feira (22) para ouvir pela primeira vez as faixas de seu décimo disco, Donda. O título homenageia a mãe do músico que já venceu 22 prêmios Grammy. Quando ele finalmente entrou, sozinho, com quase duas horas de atraso, vestia calça e jaqueta vermelhas. As peças fazem parte da coleção criada por West para a tradicional marca de roupas americana Gap. Foi a melhor vitrine para o que promete ser uma lucrativa parceria entre música e moda.

A jaqueta é a peça inaugural de uma linha completa que incluirá calças, camisetas e uma variedade de itens para homens, mulheres e crianças. A pré-venda do modelo na cor preta, por US$ 200, já esgotou, indicando que a aposta da Gap foi certeira. A grife fechou contrato de dez anos com a Yeezy, a marca de West, que pode ser renovado após os cinco primeiros anos. A expactativa é gerar receita de US$ 1 bilhão a cada ano somente com a parceria. Trata-se de uma estratégia da Gap para retomar não só o prestígio, mas o valor que teve no passado.

Evan Agostini ÍCONES DO MUNDO FASHION Kanye West e a jaqueta da Gap no lançamento de seu novo disco, em Atlanta (ao lado). Embora divorciada do rapper desde fevereiro, a celebridade Kim Kardashian (acima) foi prestigiá-lo. (Crédito:Evan Agostini)

Fundada em 1969, a empresa cresceu de forma meteórica até se tornar um império com 3,7 mil lojas no mundo e cerca de 135 mil funcionários. É dona de outras marcas populares nos Estados Unidos, como Old Navy e Banana Republic. Mas suas roupas minimalistas, de boa qualidade e preço acessível, deixaram de despertar o interesse, especialmente dos mais jovens. A marca foi fechando as operações em países menos rentáveis, como o Brasil, e abandonou as lojas físicas no Reino Unido e na Irlanda. Como efeito da pandemia, a empresa anunciou que irá fechar 30% de suas lojas físicas nos Estados Unidos até janeiro de 2024. Em compensação, vai investir US$ 140 milhões em um centro logístico no Texas para reforçar sua operação on-line.

Apesar de ter perdido mercado, a Gap vem mostrando sinais de recuperação. Os resultados do primeiro trimestre ficaram 89% acima do mesmo período de 2020 e 8% na comparação com 2019. Foram US$ 4 bilhões em vendas. Com o reforço de West, os números devem subir ainda mais. O nome dele tem prestígio e vende bem. “Seja pela polêmica, pelo talento ou pela música”, disse Márcio Banfi, stylist e professor na Faculdade Santa Marcelina. “Há muito desejo pelas suas peças.”

Fã de moda e da alta costura, West começou sua carreira de designer assinando um tênis para a Nike em 2009. Os Air Yeezys ganharam uma nova versão em 2012, e hoje modelos mais limitados do sneaker, como os Red Octobers, chegam a custar US$ 12 mil no mercado de revenda. A parceria acabou em 2013. No ano seguinte, West fechou contrato com a Adidas, em vigor até hoje. A parceria inclui roupas. No Brasil, um modelo Yeezy custa cerca de R$ 1,3 mil. Em 2020, as vendas geraram US$ 1,7 bilhão, com US$ 191 milhões em royalties para West, que detém controle criativo total. O rapper também já fez trabalhou com grifes de luxo como a Louis Vuitton, além de marcas de streetwear, caso da japonesa Bape, e até com o sapateiro italiano Giuseppe Zanotti, autor de modelos exclusivíssimos. Além disso, acompanha os eventos de alta costura do mundo e é amigo de estilistas como Demna Gvasalia, o diretor criativo da Balenciaga. Há duas semanas, West estava presente no desfile que marcou o retorno da grife à alta costura durante a semana de moda de Paris.

MÚSICA PARA VESTIR A relação entre moda e ícones da música pop tem se fortalecido nos últimos tempos. Em 2016, a cantora Beyoncé lançou a marca própria Ivy Park, com peças vendidas em redes como Topshop e a Selfridges. Desde 2019 ela é também parceira da Adidas, e as peças desenhadas por sua equipe estão à venda inclusive no Brasil. Outros rappers, como Jay-Z, Sean Combs e Pharrell Williams criam linhas de roupas a quatro mãos com marcas famosas, principalmente esportivas. Antes mesmo de Kanye West com a Gap, a cantora Rihanna se destacou pela união criativa com o conglomerado LVMH, que em 2019 lançou a marca Fenty. Ela se tornou a primeira mulher negra à frente de uma grife de luxo, mas as operações da marca foram encerradas este ano. Rhianna segue com cosméticos (Fenty Beauty) e também já assinou peças para a Reebok. É a música na moda.