Na avaliação do executivo, a velocidade da recuperação vai variar muito de país para país, mas o Brasil e a América Latina mantêm grande potencial de crescimento.

Como presidente da DHL Supply Chain no Brasil, subsidiária da alemã DHL, maior empresa logística do mundo, com faturamento de € 63,3 bilhões no ano passado, o executivo Maurício Barros acompanha de perto — e em tempo real — os impactos da pandemia da Covid-19 sobre a economia e o setor de logística. Para ele, a expansão do e-commerce e a digitalização da vida das pessoas pós-pandemia colocarão a indústria das entregas em um novo patamar de importância para as empresas. “A demanda de distribuição e armazenagem cresceu exponencialmente, em ritmo superior a dois dígitos, o que nos leva a crer que o mercado de e-commerce no Brasil irá superar e muito a projeção inicial de crescimento de 17% para 2020”, afirma. Atualmente, com 6,1% de participação, a DHL é líder global de um setor bastante fragmentado. A companhia mantém 160 mil funcionários em 55 países, com 2 mil unidades de operação em todo o mundo. No Brasil, a empresa tem 12 mil funcionários e 56 centros de distribuição e operações de transportes.

DINHEIRO – Qual o impacto da pandemia nas operações da DHL no Brasil e no mundo?
MAURÍCIO BARROS — Desde início da crise, definimos duas grandes prioridades. Primeira: a segurança e a saúde de nossos colaboradores. Segunda: manter as operações e os negócios funcionando da melhor maneira possível. Nesse sentido, estamos operando muito bem no suporte aos nossos clientes durante a crise. Fomos capazes de garantir a segurança dos colaboradores e, ao mesmo tempo, fornecemos serviços essenciais de logística para manter o comércio e as cadeias de suprimentos em movimento, no Brasil e internacionalmente. O Grupo Deutsche Post DHL possui um planejamento de risco holístico que previa os cenários de epidemia e pandemia, o que nos auxiliou em uma rápida resposta. Decisões baseadas em dados e fatos por meio da digitalização e de data analytics também nos ajudaram a saber o que fazer, não apenas supor. De muitas maneiras, essa crise mostrou o quão robusto é o nosso modelo de negócios, a importância da logística para a economia de forma geral e para a vida das pessoas. A companhia possui um modelo de negócios muito resiliente, com contratos de longo prazo, base de clientes diversificada e presença global em 55 mercados, o que nos ajudou a manter uma posição sólida, em tempos difíceis.

O crescimento do e-commerce, impulsionado pelo isolamento social, aumentou em quanto a demanda por entregas?
A demanda de distribuição e armazenagem cresceu exponencialmente, em ritmo superior a dois dígitos, o que nos leva a crer que o mercado de e-commerce no Brasil irá superar e muito a projeção inicial de crescimento de 17% para 2020 prevista no estudo “E-commerce na América Latina”, desenvolvido pela DHL. Tanto que atualmente, do ponto de vista global, 12% de nossa equipe e 33% dos novos negócios em varejo e consumo são de e-commerce. Neste cenário, os principais desafios são fornecer os produtos certos, usando os canais certos. Mas, com relação à logística, o desafio é entregar rapidamente, no dia seguinte, ser transparente ao longo da cadeia de suprimentos, ser flexível com cancelamento e devolução, ser capaz de lidar com tamanhos de lotes pequenos, mas grandes quantidades e com o gerenciamento de entrada e saída de produtos no armazém.

Quais são os principais gargalos para a logística atualmente?
A pandemia do novo coronavírus trouxe desafios adicionais como restrições a circulação de pessoas e veículos em alguns países e a diminuição da malha aérea de passageiros, que impacta também o setor de cargas. A súbita demanda por entregas ao consumidor final e de materiais médicos e hospitalares, que requerem controle de temperatura e cuidados maiores, também são outras questões importantes, mas que temos conseguido equacionar com planejamento e uso intensivo de data analytics.

“Essa crise mostrou a importância da logística para a economia, de forma geral, e para a vida das pessoas. A presença global em 55 mercados nos ajudou a manter uma posição sólida em tempos difíceis” (Crédito:Divulgação)

A redução de voos, gerada pelo fechamento de fronteiras em vários países do mundo, causou alguma turbulência nas operações?
De fato, este é um aspecto que tem que ser levado em consideração no planejamento logístico, mas é sempre bom lembrar que não houve uma paralisação total e que algumas companhias adaptaram aviões de passageiros para levar mais carga. Contamos ainda com boas opções terrestres e marítimas que podem nos ajudar neste momento. Além disso, internacionalmente, o Grupo DHL tem trabalhado duro com nossas companhias aéreas parceiras e implementado soluções sólidas, incluindo uma rede de fretamento.

Qual era a projeção de crescimento da DHL no País antes de pandemia e qual a nova previsão para 2020?
A expectativa de crescimento na casa de dois dígitos projetada para este ano ainda não tem uma atualização diante desse novo cenário, mas esperamos manter uma posição forte devido às adaptações em nossos negócios e nas operações de nossos clientes, principalmente nos mercados de saúde, bens de consumo essenciais e e-commerce. Apoiamos clientes que precisavam mudar para um modelo de comércio eletrônico ou incorporar uma oferta omnichannel para continuar atendendo seus clientes. Essa era uma atividade que já era um foco para nós. Também consolidamos nossas soluções “end to end” de transportes com uma rede de 14 filiais locais, nos permitindo capilaridade nacional, e uma nova frota de caminhões e outros investimentos para garantir mais agilidade, qualidade e flexibilidade das operações.

Pela experiência que a DHL tem em vários países, é possível prever em quanto tempo a economia brasileira e mundial vai se recuperar dessa crise?
A velocidade da recuperação vai variar muito de país para país, e dependerá de vários fatores. As projeções apontam para tempos desafiadores, com uma queda da economia global em 2020, mas a instituição também prevê um segundo semestre melhor e uma recuperação considerável em 2021. Esse cenário é semelhante no mercado de logística, exceto pelos serviços de comércio eletrônico e produtos de saúde, que provavelmente terão um crescimento já em 2020.

Há planos de mais investimentos no Brasil?
Até agora estamos mantendo nosso planejamento original. Temos planos de investimento nas áreas de transporte, nas filiais, carretas DHL, tecnologia e equipe, no reforço de capacidade do e-commerce, na saúde, com as empresas de transporte Polar e Rio Lopes adquiridas pela DHL em 2017.

Como a matriz enxerga o potencial da DHL no Brasil?
A América Latina e o Brasil são áreas foco de crescimento nos próximos anos, tendo sido realizadas aquisições de empresas importantes na Colômbia e no Brasil. Além disso, temos enorme potencial de avançar com o comércio eletrônico, a baixa concentração de serviços no mercado logístico brasileiro e a intensa digitalização das cadeias de suprimentos.

Como o senhor avalia o aumento da concorrência no setor de entregas?
Com a consolidação do e-commerce e a digitalização da vida, a logística ganhou um papel central nos negócios. Essa demanda, unida ao surgimento de novos modelos logísticos, aumentou a concorrência no setor, porém a necessidade é muito vasta e diferenciada. Os níveis de serviço cresceram também em termos de qualidade, agilidade, controle e eficiência. Logo, equacionar todas essas questões é um desafio enorme que exige equipe qualificada, tecnologias e grandes investimentos em inovação. O uso intensivo do big data, de análises preditivas e inteligência artificial são as novas fronteiras da logística que apenas empresas muito preparadas poderão fazer em escala.

Quais são os mercados em que a DHL mais cresce no mundo?
Em termos de setor, e-commerce é um dos principais focos de crescimento. Em termos de serviço, temos investido bastante na área de transportes, digitalização de serviços logísticos e inovação. Considerando o último balanço do grupo, houve uma distribuição homogênea dos resultados entre as regiões geográficas. A DHL Supply Chain globalmente chegou a concluir no primeiro trimestre contratos adicionais no valor de € 135 milhões com clientes novos e existentes, apesar da crise.

“A pandemia do novo coronavírus trouxe desafios adicionais como restrições a circulação de pessoas e veículos em alguns países e a diminuição da malha aérea” (Crédito:Edward Shaw)

A recessão brasileira e mundial neste ano pode comprometer ou adiar os necessários investimentos em infraestrutura?
É difícil prever, dado os grandes desafios que o mundo está vivendo neste momento, mas esperamos que eles possam ser mantidos, pelo menos em parte, até como forma de dar mais vigor para a economia e para a geração de empregos.

Como a DHL lida com o processo de digitalização na logística?
A DHL Supply Chain possui uma abordagem estruturada para impulsionar a implantação em massa de novas tecnologias, um diferencial importante em relação à concorrência. Temos uma agenda de digitalização dedicada, concentrada em mais de dez tendências de foco: drones, robótica, veículos autônomos, impressão 3D, intenet das coisas (IoT) e wearables, realidade virtual e aumentada, visibilidade da cadeia de suprimentos, otimização de transporte, otimização de armazém, blockchain, além de tecnologias que nos permitirão transformar os negócios de maneira estruturada.

Quais tecnologias têm maior potencial?
Como operador logístico, vemos o maior benefício no campo da robótica colaborativa, veículos e equipamentos autônomos, wearables inteligentes e realidade aumentada, mas também em objetos conectados através de tecnologias IoT. Há também grande potencial em todo o campo de coleta, análise de dados e automação, incluindo machine learning.

No Brasil, a DHL se envolveu em alguma iniciativa social na pandemia?
Sabemos que a pandemia teve um impacto direto na vida de toda a população. O apoio a iniciativas sociais reforça nosso propósito de conectar pessoas e melhorar vidas e nos permite minimizar essas dificuldades no momento em que a logística tem um papel fundamental para entregas ágeis àqueles que mais precisam. Por exemplo, a DHL Supply Chain apoiou a L’Oréal no fornecimento de álcool em gel e produtos de higiene para comunidades pobres do Rio de Janeiro e fez o manuseio e transporte de itens básicos em algumas regiões do Brasil. Como fornecedora de logística hospitalar, a DHL Supply Chain está trabalhando duro em instalações envolvidas no tratamento do Covid-19 em São Paulo. Também criamos várias iniciativas para ajudar famílias e comunidades em áreas próximas a nossas instalações.