Em uma declaração inédita, o grupo separatista ETA pediu perdão às vítimas pelos “graves danos” provocados por sua luta armada pela independência do País Basco, un último gesto antes do aguardado anúncio de dissolução, quase 60 anos após sua criação.

No texto publicado nesta sexta-feira pelo jornal basco Gara, o ETA reconhece “o dano provocado no decorrer de sua trajetória armada” e afirma o “compromisso com a superação definitiva das consequências do conflito e com a não repetição”.

Consciente de ter provocado “muita dor”, a organização deseja “mostrar respeito aos mortos, aos feridos e às vítimas” das ações do grupo, segundo o comunicado traduzido do euskera ao espanhol pelo jornal.

“Pedimos desculpas de verdade”, afirma a organização, que executou atentados com bomba e assassinatos que deixaram 829 mortos, tanto no País Basco como no resto da Espanha e alguns também na França.

A organização, que também realizou em nome da luta armada sequestros e extorsões, se limitou a lamentar a totalidade das vítimas e pediu perdão especificamente para aquelas “que não tinha uma participação direta no conflito, nem responsabilidade alguma”.

“A estas pessoas e seus parentes pedimos perdão”, afirma o texto com data de 8 de abril, exatamente um ano depois da entrega das armas, quando o grupo apresentou uma lista de depósitos à justiça francesa.

Criado em 1959 durante a ditadura de Francisco Franco, o Euskadi Ta Askatasuna (País Basco e Liberdade) renunciou à luta armada em 2011 e em poucos dias deve anunciar sua dissolução, de acordo com várias fontes.

Associações de vítimas do terrorismo, que exigiam há vários anos um pedido de desculpas do ETA, criticaram o comunicado, que consideraram insuficiente.

– “Vergonhoso” –

“Me parece vergonhoso e imoral que façam esta distinção entre os que mereciam o tiro na nuca, a bomba no carro e os que foram vítimas por acaso, porque não mereciam”, afirmou ao canal público TVE a presidente da Associação das Vítimas do Terrorismo, María del Mar Blanco.

A organização de Blanco, irmã de Miguel Ángel Blanco, um vereador do Partido Popular (PP) sequestrado e assassinado pelo ETA em 1997, um crime que comoveu o país e provocou manifestações gigantescas de repúdio, pediu “responsabilidades individuais” para solucionar os crimes do ETA “pendentes de esclarecimento”.

Para o governo do primeiro-ministro conservador Mariano Rajoy, que desde 2011 rejeita qualquer tipo de negociação com o grupo, a declaração do ETA “não é mais que outra consequência da força do Estado de Direito que venceu o ETA com as armas da democracia”,

“É bom que o grupo terrorista peça perdão às vítimas, porque as vítimas, sua memória e sua dignidade foram determinantes na derrota do ETA”, ressaltou o governo, antes de insistir que “há muito tempo o ETA deveria ter pedido desculpas de forma sincera e incondicional.

Na quinta-feira, o ministro do Interior, Juan Ignacio Zoido, deixou claro que a organização “não vai conseguir nada com sua declaração de dissolução”.

O ETA foi criado durante a ditadura de Franco, acusado de reprimir a cultura basca, mas depois da morte do ditador o grupo intensificou suas ações, gerando uma espiral de ódio que também teve a participação de grupos de extrema-direita e associações parapoliciais como os GAL, criados nos anos 1980.

Após tentativas frustradas de negociação e da condenação cada vez maior da sociedade basca à violência, o ETA anunciou o fim da luta armada em 2011 e deve anunciar sua dissolução no primeiro fim de semana de maio, de acordo com o Grupo Internacional de Contato (GIC), formado por personalidades de diferentes países para trabalhar pela paz no País Basco.

O ETA possui quase 300 membros detidos na Espanha, França e Portugal, entre 85 e 100 foragidos e uma dezena de pessoas expulsas pela França, sem documentos.

O grupo deseja a transferência dos detidos para prisões mais próximas do País Basco e espera obter uma alteração da política penitenciária com sua dissolução.