Praticamente no centro de Genebra, vizinho do hotel New Midi, na esquina da Place de Chevelu com a Rua Rousseau, estaria um dos cofres que abrigariam o suposto patrimônio em diamantes e barras de ouro acumulado clandestinamente pelo ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB). O esconderijo suíço da fortuna que pertenceria a Cabral fez parte dos dados fornecidos pelos operadores financeiros Renato e Marcelo Chebar, em delações ao Ministério Público Federal. No total, eles envolveriam US$ 3,5 milhões.

O Estado apurou que as peças continuariam guardadas em pelo menos dois locais de Genebra e que parte da suposta fortuna acumulada de forma clandestina pelo ex-governador chegou a viajar em malas nos trens pelos Alpes. As informações já estão sendo alvo de uma apuração pela Procuradoria suíça.

A reportagem esteve em um endereço informado pelos delatores, localizado à beira do Rio Ródano, que coincide com o de uma empresa que aluga cofres. Os funcionários, de trás de um vidro blindado, se recusaram a falar sobre o assunto. O aluguel de um cofre nesse local pode chegar a custar US$ 10 mil por ano, dependendo do tamanho e de sua segurança. Os funcionários do estabelecimento, que entre si falavam em árabe, confirmaram que, no endereço indicado, eram os únicos que atuavam nesta atividade.

Nos serviços de aluguel de cofre visitados pelo Estado na Suíça, nenhum deles exige saber a procedência do ouro ou das pedras. Já nos bancos, qualquer movimentação por brasileiros tem sido suscetível de um exame por parte de gerentes, cada vez mais pressionados a saber a origem do dinheiro.

A própria empresa garante: “seja qual for sua nacionalidade, você apenas precisa providenciar um documento de identidade para alugar um cofre”. Mas há uma condição. Para não residentes da Suíça, exige-se o pagamento antecipado de dois anos do aluguel.

Segundo a empresa, todo tipo de bens pode ser colocado no cofre, tais como “joias, documentos, dinheiro, metais preciosos”. E o serviço ainda completa explicando que “apenas itens ilegais ou perigosos são proibidos, como armas, munição e explosivos”.

Trem. Renato afirmou ter se encontrado com o emissário em um hotel em Zurique, também na Suíça, onde recebeu o valor. O hotel era o Schweizerhoff, a poucos passos da estação central de trem de Zurique. Após a entrega, Renato se deslocou de trem com a quantia em espécie para Genebra.

A viagem, de três horas, liga duas das cidades mais seguras do mundo. Para embarcar num trem, não há qualquer tipo de controle policial, como em aeroportos. Dependendo do horário, vagões inteiros viajam praticamente vazios.

No dia 23 de novembro de 2011, Renato então comprou o ouro no banco BNP Paribas. Ele afirmou que em julho do mesmo ano adquiriu mais US$ 1,5 milhão em diamantes, que foram depositados no mesmo cofre, onde os ativos chegam a US$ 2 milhões.

Em 2016, Renato repetiu a operação, no mesmo valor. Desta vez, ele escolheu a Zona Franca, perto do aeroporto de Genebra. Ele confessou que a conversão dos dólares em pedras preciosas foi sugerida por ele, “pois vislumbrava dificuldade em depositar o montante em espécie”. Segundo a delação, o operador de Cabral, Carlos Miranda, preso na Operação Calicute, desdobramento da Lava Jato no Rio, afirmou a Renato que um emissário (cujo nome diz não recordar) lhe entregaria US$ 250 mil, em espécie.

Confisco. Agora, o MP de Genebra quer saber onde estão exatamente os diamantes e o ouro, para um eventual confisco. Uma devolução ao Brasil, porém, dependeria de duas condições: a primeira seria a condenação dos suspeitos. A outra possibilidade seria um acordo de delação no qual os envolvidos se comprometeriam a entregar todos seus ativos.

Até agora, o MP brasileiro recuperou R$ 270 milhões. Segundo o procurador Sérgio Pinel, as apurações sobre o dinheiro proveniente da corrupção ainda estão “bem no início”. “Nós puxamos um fio, vai saindo um novelo. A gente tem certeza de que o dinheiro que foi descoberto até agora ainda não foi mapeado completamente. Iniciamos uma cooperação internacional para arrecadar esses valores.”