A ofensiva da Turquia contra uma milícia curda no nordeste da Síria nesta quinta-feira (10), uma operação que despertou críticas internacionais, causou a fuga de milhares de habitantes da região.

O ataque foi tema de uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU em Nova York, na qual os cinco países membros europeus – França, Alemanha, Bélgica, Reino Unido e Polônia – exigiram o fim imediato dessa “ação militar unilateral”.

Já o secretário-general da ONU, António Guterres, expressou sua “profunda preocupação”.

Na quarta-feira à noite, a Turquia lançou seu ataque terrestre e suas forças cruzaram a fronteira, concentrando suas operações nas áreas fronteiriças de Ras al-Ain e Tal Abyad, controladas pelas forças curdas.

As forças turcas conquistaram 11 povoados próximos a estas duas cidades, de acordo com o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), que informou sobre bombardeios aéreos turcos.

Desde quarta-feira, pelo menos 29 combatentes das forças curdas e 10 civis foram mortos nos ataques aéreos e disparos de artilharia do Exército turco, segundo o OSDH.

Do lado turco, ao menos seis civis, incluindo um bebê e uma menina, morreram e dezenas ficaram feridos nesta quinta por projéteis lançados contra cidades fronteiriças turcas, como Akçakale, informaram as autoridades desse país.

Nesta cidade turca, próxima a Tal Abyad, as ruas ficaram desertas e apenas um grupo de habitantes se arriscou a observar uma nuvem de fumaça negra que surgiu na fronteira.

Do lado sírio, mais de 60 mil pessoas foram deslocadas desde quarta-feira pela violência, fugindo das áreas na fronteira, segundo ol OSDH.

Empoleiradas em caminhonetes, carregando com elas geladeiras, botijões de gás, colchões e sacolas de juta, mulheres e crianças chegaram à cidade de Tall Tamr, mais ao sul e poupada dos combates, constatou um correspondente da AFP no local.

A ONG Save The Children alertou para um “desastre humanitário iminente”. “Com o inverno se aproximando, eles enfrentarão desafios adicionais”, advertiu.

– Terceira operação militar –

Segundo a imprensa turca, Ancara planeja assumir o controle da zona entre Ras al-Ain e Tal Abyad, que tem 120 quilômetros de extensão e 30 quilômetros de profundidade

O objetivo declarado da operação é afastar a principal milícia curda da Síria da fronteira, as Unidades de Proteção do Povo (YPG).

As YPG, aliadas dos ocidentais na luta contra o Estado Islâmico (EI), são consideradas por Ancara como uma organização “terrorista”.

Para o governo da Turquia, a ofensiva deve permitir a criação de uma “zona de segurança”, que poderá receber os 3,6 milhões de refugiados sírios que vivem em seu território.

Diante das críticas europeias, presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou nesta quinta abrir as portas da Europa a milhões de refugiados.

A ofensiva, realizada em cooperação com uma coalizão de ex-rebeldes financiada e treinada por Ancara, é a terceira maior da Turquia na Síria desde 2016, e abre uma nova frente em um conflito que deixou mais de 370.000 mortos e milhões de deslocados desde 2011.

– Ameaças dos EUA –

Sem aviação, parece difícil para as FDS resistirem ao Exército turco.

“As FDS não podem defender toda a fronteira”, disse Nicholas Heras, analista do grupo de reflexão Center for New American Security.

“A verdadeira questão é: até que ponto a Turquia pode avançar antes de uma tomada de decisão por atores regionais ou internacionais”, acrescentou.

Diante do clamor internacional, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que recentemente anunciou a retirada de suas tropas da Síria, disse esperar que seu colega turco atue de maneira “racional e humana”, e ameaçou destruir a economia da Turquia no caso de uma “ofensiva injusta”.

Trump determinou que diplomatas do departamento de Estado atuem para obter um cessar-fogo entre turcos e curdos.

“Recebemos a missão do presidente de tentar estabelecer um campo de entendimento entre os dois lados e se há como obter um cessar-fogo”, informou um funcionário, que pediu para não ser identificado.

– “Ajudar o EI”? –

A ofensiva foi condenada por vários países ocidentais, que temem a incerteza sobre o destino dos milhares de prisioneiros jihadistas das FDS.

“Esse risco de ajudar o Daesh (sigla em árabe para o Estado Islâmico) a reconstruir seu califado é de responsabilidade da Turquia”, declarou nesta quinta Emmanuel Macron.

O chefe da diplomacia francesa, Jean-Yves Le Drian, pediu uma “reunião urgente” da coalizão internacional liderada por Washington na luta contra o EI.

Cerca de 12 mil combatentes do EI, sírios, iraquianos, mas também entre 2.500 e 3.000 estrangeiros de 54 países, estão detidos nas prisões curdas, segundo um chefe da administração semiautônoma, Abdel Karim Omar.

De acordo com a autoridade semiautônoma curda, os bombardeios turcos atingiram na quarta uma prisão onde estão jihadistas estrangeiros do EI.

A Otan, entidade a qual pertence a Turquia, pediu a seus países membros que se “mantenham unidos contra [seu] inimigo comum”, o EI.

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