O governo anunciou na semana passada mais um choque nas combalidas empresas de distribuição de energia. Acenou com um empréstimo de R$ 3 bilhões, desde que as companhias renegociem seus débitos de curto prazo com os bancos privados. Outra condição é específica para as multinacionais: para ganhar o direito a sacar os recursos no BNDES, as matrizes teriam de cancelar dívidas das filiais. A medida animou os investidores, as ações das distribuidoras subiram na Bolsa. Mas todo esse entusiasmo tem fôlego curto. Entre os executivos de empresas do setor, há um consenso: o pacote elétrico, que está sendo chamado de Proel, alivia algumas companhias a curto prazo, mas só adia o problema.

As dívidas das 20 principais distribuidoras de energia batem em R$ 30 bilhões. Boa parte dos débitos se deve aos prejuízos com o racionamento de 2001. Mas o principal problema, dizem os especialistas, está num contrato de venda de energia da usina de Itaipu. Construída pelo Brasil com o Paraguai, o contrato prevê a cotação da eletricidade em dólar. As distribuidoras compram 30% de seu fornecimento de Itaipu e, toda vez que o dólar sobe, as contas estouram. ?O pacote é um sinal positivo, mas os problemas estruturais permanecem?, diz Sérgio Tamashiro, analista do Unibanco.

O resultado é que, sem desatar o nó de Itaipu, o governo cai, invariavelmente, em duas alternativas: subir as tarifas de
energia ou injetar capital para equilibrar as contas das distribuidoras. As tarifas têm subido mais do que a inflação nos últimos três anos. E, mesmo assim, os pacotes de socorro financeiro se sucedem. Há dois anos, Brasília liberou outros R$ 7 bilhões para as companhias, a título de compensação pelas perdas com o racionamento. Agora, o presidente do BNDES, Carlos Lessa, acena com mais R$ 3 bilhões.
?O acordo é de interesse de todo mundo e todos devem se esforçar para isso?, disse Lessa.

Um dia depois de anunciar a ajuda às distribuidoras, Lessa esteve na Comissão de Minas e Energia do Congresso Nacional para dar explicações sobre o acordo com a AES, dona da Eletropaulo. Lessa admitiu que pode ter havido vazamento de informações antes do anúncio do acordo. ?Percebo, pela valorização das ações, que, sim, é bastante provável que tenha havido vazamento?, disse Lessa.

Pelo acordo, o BNDES cancelou US$ 600 milhões em dívidas da AES e, em troca, levou metade dos ativos da empresa no País. O memorando de entendimentos foi anunciado no dia 8 de agosto. Na semana anterior ao anúncio, as ações da empresa subiram 59,55%, contra 22,24% do índice Bovespa (que mede o desempenho do mercado) e 30,10%, das empresas do setor elétrico. ?A conclusão, ainda preliminar, é que possa ter havido vazamento de informações?, disse, também em depoimento, Leonardo Cantidiano, presidente da CVM, responsável pela fiscalização do mercado.

Além do acordo com o BNDES, a AES também deve ser beneficiada pelo novo pacote. Pelas contas de bancos privados, poderá ter acesso a R$ 500 milhões. Outra empresa que também deve aproveitar o pacote elétrico é a Light, controlada pelo grupo francês EDF. A empresa poder pleitear R$ 600 milhões, num novo empréstimo junto ao BNDES. Suas ações já começaram a subir na Bolsa de Valores.