A maioria dos mortais nunca ouviu falar da empresa americana Qualcomm. Mas grande parte das pessoas que usa smartphones já teve contato com um produto da companhia. Com sede em San Diego, nos Estados Unidos, a Qualcomm é a maior fabricante de chips para celulares do planeta. Seus processadores equipam os smartphones de quase todas as empresas do mundo, como Samsung, Sony, Motorola e HTC. Sua marca, portanto, fica escondida aos olhos dos consumidores, embora seja vital para o bom desempenho do aparelho.

Na segunda 6, a Qualcomm finalmente chegou aos holofotes. A americana Broadcom, que fabrica desde processadores até modems e placas de rede Wi-Fi e GPS, fez uma oferta hostil que avalia a companhia em US$ 130 bilhões, incluídas suas dívidas. As duas empresas, apesar de atuarem no setor de semicondutores, têm produtos complementares. Se concretizada, a união criará a terceira maior fabricante de processadores do mundo, atrás apenas de Intel e Samsung. Será também o maior negócio da história da tecnologia. A maior compra até então, da empresa de armazenamento de dados EMC pela Dell, representa metade do que a Broadcom quer pagar pela Qualcomm. “Não faríamos essa oferta se não estivéssemos confiantes de que nossos clientes globais vão abraçar essa combinação entre as duas empresas”, afirmou Hock Tan, presidente da Broadcom.

Sem palavras: CEO da Qualcomm, Steven Mollenkopf ainda não se posicionou sobre a oferta da Broadcom (Crédito:AP Photo/Mark Lennihan)

Na visão de seu CEO, a melhor forma de entrar de cabeça no aquecido mercado de celulares inteligentes seria arrematar a Qualcomm, a líder dessa área, com uma fatia de mercado de 39,87%. “A Broadcom sabe da força da Qualcomm no mercado de tecnologias para celulares”, afirma Jon Erensen, analista da consultoria americana Gartner. Além de abocanhar a liderança no segmento que é considerado o cérebro dos celulares inteligentes, a Broadcom reforçaria sua presença no mercado de semicondutores. “Essa fusão pode ser catastrófica para os rivais da Qualcomm no longo prazo”, afirma Rob Enderle, presidente da consultoria americana Enderle Group.

A questão é se a Qualcomm vale essa cifra exorbitante. Os dados mostram que a Broadcom escolheu um momento estratégico para fazer sua oferta pelo controle da rival. Envolvida em diversas batalhas judiciais por brigas de patentes, a companhia não vive seus melhores dias. Seu valor de mercado, que já chegou a US$ 136 bilhões, está na casa dos US$ 95 bilhões. Isso não significa, no entanto, que a negociação seja simples ou que vá resolver todos os problemas das duas empresas. A postura ofensiva de Hock Tan, o CEO da Broadcom, ao fazer uma proposta não-solicitada pela Qualcomm é vista como agressiva no mercado, tornando o acordo mais difícil de ser fechado. Outro ponto é a incompatibilidade de estilos de gestão. “A Qualcomm tem feito um bom trabalho em relação a escutar e se importar com seus consumidores”, diz Roger Kay, analista da consultoria americana Endpoint Technologies. “A Broadcom, por sua vez, é uma marca industrial que não tem muito conhecimento de sua base de consumidores.”

Hock Tan, da Broadcom: “Não faríamos essa oferta se não estivéssemos confiantes de que nossos clientes vão abraçar a combinação”

Nos últimos anos, o mercado de chips está superaquecido, o que tem aumentado o apetite por fusões e aquisições na área. O grupo japonês Softbank, por exemplo, pagou US$ 32,2 bilhões, em 2016, pela britânica Arm, que também desenvolve a processadores para smarpthones. Um ano antes, a Intel pagou US$ 16 bilhões pela rival Altera, que cria dispositivos lógicos programáveis e componentes eletrônicos usados para construir circuitos digitais. A própria Qualcomm está tentando adquirir a NXP, que fabrica processadores para automóveis, e, para isso, ofereceu US$ 39 bilhões. Por trás dessas movimentações está a mudança do setor de tecnologia. Antes, as empresas focavam em chips para computadores pessoais. Foi a época de ouro da Intel. Agora, buscam marcar posição em áreas mais promissoras, como a internet das coisas, carros conectados e smartphones.

Apesar do valor astronômico envolvido, o acordo segue indefinido. Em nota, a Qualcomm afirmou que seu conselho administrativo está “em consulta com seus assessores e avaliará a proposta para prosseguir um curso de ação que seja dos melhores interesses dos acionistas ”. Enquanto isso, seu CEO, Steven Mollenkopf, estava na comitiva do presidente americano Donald Trump, que visita a China, onde assinou contratos de US$ 12 bilhões para vender componentes durante três anos para as fabricantes Xiaomi, OPPO e Vivo.